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Linguagem neutra não-binária (trecho de uma live)

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 Por Sergio Viula Esse é um trecho de uma live feita com @Sviula a convite de @carolina_carolino no perfil das @carolinas_da_borborema no Instagram em 07/04/24. Esse é apenas um trecho da nossa conversa e se refere ao uso da linguagem neutra não-binária. A live completa pode ser vista aqui: https://www.instagram.com/reel/C5en-hhvjuq . Nessa live, além de linguagem não binária, discutimos a falsamente chamada "cura gay", o Movimento LGBT+ no Brasil, temas relacionados à orientação sexual e identidades de gênero.  O trecho abaixo é apenas um recorte da live, mas considero que seja muito interessante e relevante para as diversas discussões sobre linguagem neutra na atualidade. Confira e siga o perfil dos participantes no Instagram. Carolina Carolino e Sergio Viula 07/04/24 Instagram: @carolinas_da_borborema

WICCA E SEXODIVERSIDADE





WICCA E SEXODIVERSIDADE

Por Sergio Viula
Originalmente publicado no AASA pelo próprio autor.



Essencialmente falando, a Wicca é uma religião que concentra sua fé e rituais no que se refere à Terra.

Fundada por Gerald Gardner, um funcionário público britânico, na década de 1940, a Wicca inclui divindades celtas (povo original da Inglaterra e seu entorno), bem como símbolos e dias especiais, geralmente ligados às estações do ano. A magia e outros componentes ocultistas/pagãos são parte integrante da Wicca, que também é conhecida como neopaganismo.

Em geral, os wiccanos acreditam numa divindade chamada “O Todo” ou “The One”. A divindade wiccana apresenta tanto aspectos masculinos como femininos. Por isso, é chamada de Deus de Deusa alternadamente. Como Deusa, a divindade é muitas vezes associada às Deusas Athena, Brigit, Ceridwen, Diana, Hécate, Ishtar, Isis, Vênus, etc. Como Deus, a divindade wiccana é associada aos Deuses Adonis, Apollo, Dionísio, Odin, Osíris, Pan, Thor, Zeus, etc.

Para os wiccanos, adoração do Deus ou Deusa é um ato de comunhão, mas eles acreditam que precisam do Deus/Deusa tanto que ele/ela precisa deles, numa curiosa forma de interdependência.

Uma vantagem da Wicca sobre religiões monoteístas de origem abraâmica é que, apesar dos wiccanos observarem uma cerimônia chamada Wiccaning para recém-nascidos, eles não obrigam a criança a seguir a Wicca de modo algum. O rito é mais uma forma de dar as boas-vindas à criança no seio da comunidade. Mais tarde, se o indivíduo quiser ser iniciado, ele pode se tornar um wiccano de fato. Esses rituais são geralmente chamados de Coven e não é o único. Wiccanos costumam ter rituais para diversas ocasiões, desde a passagem para a puberdade até a compra de uma casa, casamento e divórcio, menopausa, etc.

Os wiccanos fazem rituais em treze luas (Esbat) e têm oito Sabbats (quatro nos solstícios e equinócios e outros quatro principais a cada ano). Os solstícios e equinócios marcam posições do movimento aparente do sol e a incidência de raios solares na superfície terrestre, além de inaugurarem as estações do ano.

Veja mais aqui:http://www.brasilescola.com/geografia/solsticios-equinocios.htm

Os rituais wiccanos geralmente incluem: A escalação de um círculo – a consagração de um espaço sagrado. A invocação de uma divindade / divindades. O corpo do ritual, que pode envolver magia, feitiços, uma refeição comunitária, dança, leitura, canto, etc Fechamento ou banimento do círculo – restauração do espaço para uso comum. Uma coisa interessante é que nem sempre os wiccanos veem a Deusa ou seu consorte, o Deus chifrudo, como existências reais, alguns os veem como símbolos.

Outro ponto interessante é a ética wiccana, que é bem mais interessante do que a moralidade das religiões abraâmicas e seus derivados. Ela pode ser resumida em “faz o que desejas, desde que não prejudiques a ninguém”.

Sexualidade e gênero

A Wicca geralmente aceita a igualdade entre homens e mulheres, diferentemente de religiões centradas no homem, tais como o judaísmo, o cristianismo e o islamismo.

Quanto aos relacionamentos sexuais, a Wicca os vê como um presente da Deusa. Por isso, seus rituais podem incluir experiências corporais intensas, justamente por acreditarem que está tudo integrado e que o sexo pode andar pari passu com a devoção.

A Wicca geralmente aceita todas as orientações sexuais como normais e naturais, sejam heterossexuais, homossexuais ou bissexuais. Isso não quer dizer que todo wiccano iniciado chegue à comunidade neopagã com essas noções bem desenvolvidas em seu acervo mental/emocional. Por isso, é possível que ainda se encontrem nos círculos wiccanos gente que não se livrou do moralismo semítico e que ainda vive agrilhoada a preconceitos que não se sustentam diante da noção de natureza e liberdade.

Mas a própria Wicca já teve seus momentos de controvérsia sobre a homossexualidade. Alguns autores travaram discussões bastante discordantes no início da Wicca, tais como Gardner (considerado homofóbico) e Sanders (considerado não homofóbico). Essa disputa levou à primeira grande divisão dentro da Wicca. Contudo, para a maioria, a homossexualidade é tolerada e aceita, o que não elimina a ideia de macho + fêmea = criação que subjaz nos ritos wiccanos e que pode se caracterizar como uma hostilidade inerente contra a homossexualidade, sendo passível de eventuais manifestações.

A Wicca Gardneriana (Gardnerian Wicca) e outros grupos mais tradicionais formam seus covens em pares de macho e fêmea. Coven é o nome dado a um grupo de bruxos, que se unem num laço mágico, físico e emocional, sob o objetivo de louvar a Deusa e o Deus, tendo em comum um juramento de fidelidade à Wicca e ao grupo. Essa prática parece de formar covens baseados em pares heterossexuais parece ter surgido por influência de Gerald Gardner que escreveu que “a lei sempre foi a de que o poder tem que ser passado do homem para a mulher e da mulher para o homem, sendo a única exceção quando uma mãe inicia sua filha ou um pai inicia seu filho, porque eles são partes deles mesmos (a razão é que amor pode ocorrer entre pessoas que passam pelos ritos juntas)”.

Gardner foi acusado de ser homofóbico por Lois Bourne, um dos Sumo Sacerdotes do coven de Bricket Wood: “Gerald era homofóbico. Ele tinha um profundo ódio e desprezo pela homossexualidade que ele considerava como uma perversão repugnante e uma flagrante transgressão da lei natural…“Não existem bruxos homossexuais, e não é possível ser homossexual e bruxo”, Gerald quase gritava. Ninguém discutiu com ele. (Bourne, Lois Dancing with Witches. 2006. London: Robert Hale, p.38. edição capa dura publicada pela primeira vez em 1998).

Na maior parte dos ramos da Wicca, todas as orientações sexuais são consideradas positivas e saudáveis, desde que sejam realizadas em amor. A orientação sexual, portanto, não é considerada como um problema. Por isso, muitas pessoas neopagãs LGBT sentiram-se atraídas pela Wicca. Afinal, ter seu relacionamento visto como igual ao de qualquer outra pessoa não é um luxo, é direito básico.

Quanto às questões de gênero, a mesclagem do feminino com o masculino na divindade wiccana não é suficiente para tornar tudo mais simples para as pessoas transexuais. E isso se dá pelo fato de ser a Wicca uma religião de fertilidade, cuja premissa é que a mesclagem do masculino com o feminino através do sexo cria a vida.

Por isso, a posição da mulher trans ou do homem trans pode ser delicada na perspectiva procriativa da religião. A mulher trans não tem útero e o homem trans não produz esperma. Assim, o imaginário da Wicca pode alienar a pessoa num espectro de estranheza, mesmo que não haja qualquer intenção ou tentativa de fazê-lo. Isso pode se tornar ainda mais difícil para aquelas pessoas que existem fora do binarismo de gênero, uma vez que muito da prática wiccana reforça o binarismo de gênero, pelo menos na superfície.

A Deusa diz em Charge of the Goddess: “Todos os atos de amor e de Prazer são Meus rituais” (Gardner, Gerald. Witchcraft and the Book of Shadows, 2004, Edited by A.R.Naylor. Thame, Oxfordshire: I-H-O Books, p.70.)

Portanto, todas as formas e expressões da sexualidade, desde que seja benéficas e consensuais, são aceitas. E é interessante que os wiccanos sintam-se tão integrados à natureza que se preocupem mais que a média com sua preservação.

Além disso, não são proselitistas no sentido em que atribuímos aos cristãos, por exemplo. Um wicanno nunca vai bater à porta de um não iniciado para lhe apresentar a Deusa/o Deus, e eles preferem que as pessoas sejam iniciadas depois dos 18 anos. Pessoalmente, como humanista, gosto de ver cada vez mais aceitação e celebração da diversidade humana e toda parte, inclusive nos círculos religiosos.

Como ateu, não vejo motivo para acreditar na Deusa ou no Deus da Wicca, assim como não vejo razão para crer em qualquer outra figura mítica, incluindo o Deus judaico-cristão e seus derivados. Não sinto a menor necessidade pessoal de fazer parte de qualquer comunidade de fé ou participar de qualquer rito.

No entanto, penso que incontáveis indivíduos não conseguem ou não pretendem viver sem algum vínculo com a religiosidade ou a espiritualidade dos que têm algum tipo de fé. A maioria não quer viver por sua própria conta e risco, e por isso sempre recorre a algo ou alguém para além de si mesma, ainda que não haja a menor evidência de que esse algo ou alguém esteja lá onde essa mesma maioria imagina que esteja, independentemente de onde seja esse lá.

Considero importante entender um pouco do que move as pessoas a fim de dialogar com elas da maneira mais clara e produtiva possível. Por isso, saber como pensam e se comportam os wiccanos e outros religiosos tem alguma relevância. Uma coisa é certa: o conhecimento não faz mal. Ateus resolvidos são refratários à magia. Afinal de contas, como poderia a combinação de elementos da natureza, dispostos de certa maneira, acompanhada de palavras ditas por um ser humano afetar sua própria vida, senão naquilo em que o auto sugestionamento poderia? Como poderia afetar outros, exceto quando esse outro acredita de tal maneira nisso que começa a agir como se isso fosse real e inevitável?

Isso é o máximo que a magia pode realizar e não é por algum poder inerente à mesma, senão por essa fraqueza humana que uns chamam de fé e outros de superstição, ambas nada mais do que imaginação revestida de intensas emoções. A imaginação humana faz o serviço, mas quem leva o crédito é a fé, sendo esta simplesmente mais um produto da imaginação humana.


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Leia Em Busca de Mim Mesmo - a jornada de um homem rumo a sua emancipação sexual.

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