Silvio de Abreu defende o "armário" para atores

Foto: Rio News

O Novelista Silvio de Abreu

🎭 Quinta-feira, 27 de Maio de 2010

Silvio de Abreu diz que galã gay não pode sair do armário — e reforça o armário da hipocrisia

Na contramão de qualquer avanço civilizatório, Silvio de Abreu, autor da novela Passione, declarou em entrevista à coluna de Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, que galã homossexual não pode "sair do armário". E mais: afirmou que não colocaria um beijo gay em suas novelas.

Segundo Silvio:

“Se o cara sai de balada, toma droga e está lá com o texto na ponta da língua, eu não tenho nada com isso. Se é gay, se não é gay, se é macho ou não, para mim, tanto faz. Se na hora em que estiver assistindo eu acreditar que ele é machão, acabou. O problema é pa-re-cer. Atrapalha o personagem”.

E ele ainda completa:

“Se ficarem falando por trás, não tem importância. Se ele falar abertamente, vai prejudicar. Ator que fizer isso é bobo”.

Sim, você leu certo. Na visão de Silvio de Abreu, o ator que se assume publicamente é “bobo”. Porque, segundo ele, o que importa é parecer “machão” na tela — mesmo que na vida real o artista tenha que viver escondido, disfarçado, sufocado.

Sobre cenas com beijo entre pessoas do mesmo sexo, Silvio declara:

“Homossexualismo não é mais tabu. Beijo gay é outra história. É uma exposição que grande parte do público que não é gay pode se chocar”.

E ainda diz que, mesmo que ele escrevesse, a Globo vetaria. “Não adianta eu colocar, não vai passar”, afirmou o autor.

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✒️ Comentário deste blogueiro

Vamos deixar uma coisa muito clara: ninguém é obrigado a sair do armário. Mas ser obrigado a ficar no armário, sob ameaça de perder contratos, papéis e oportunidades, é uma das formas mais cruéis de violência moral e profissional que se pode praticar.

Esse tipo de pensamento não apenas sustenta o armário — ele o reforça com cadeado e corrente.

Silvio de Abreu deveria ter vergonha de dar esse tipo de conselho. Um autor de televisão, influente dentro da Rede Globo — emissora que abriga inúmeros profissionais LGBTQIA+ —, deveria estar na linha de frente da luta por mais visibilidade, mais inclusão, mais representatividade, e não naturalizando a homofobia estrutural da indústria.

A arte sempre foi uma das áreas mais habitadas por talentos LGBTQIA+. São essas pessoas que, muitas vezes, colocam emoção, estética e humanidade nas produções que o Brasil inteiro assiste. Exigir que esses artistas vivam no escuro, enquanto entregam luz e verdade no palco ou na tela, é de uma hipocrisia revoltante.

Além disso, a ideia de que “o público vai se chocar” com um beijo gay é só o eco de uma homofobia mal disfarçada. Porque o mesmo público assiste cenas de violência, adultério, tráfico, assassinato — e isso não “choca” tanto quanto o afeto entre dois homens ou duas mulheres?

Sinceramente? Chega disso. A gente não precisa de mais um autor validando o preconceito. A gente precisa de roteiristas e diretores com coragem de abrir portas, e não de trancar gente talentosa no porão da vergonha.

Beijo gay não choca. O que choca é o silêncio. O que choca é o medo. O que choca é essa cultura covarde que ainda obriga tanta gente a viver atrás de uma máscara.

E o mais bobo, no fim das contas, não é o ator que se assume.

Bobo é quem ainda pensa como Silvio de Abreu.