Postagem em destaque

Linguagem neutra não-binária (trecho de uma live)

Imagem
 Por Sergio Viula Esse é um trecho de uma live feita com @Sviula a convite de @carolina_carolino no perfil das @carolinas_da_borborema no Instagram em 07/04/24. Esse é apenas um trecho da nossa conversa e se refere ao uso da linguagem neutra não-binária. A live completa pode ser vista aqui: https://www.instagram.com/reel/C5en-hhvjuq . Nessa live, além de linguagem não binária, discutimos a falsamente chamada "cura gay", o Movimento LGBT+ no Brasil, temas relacionados à orientação sexual e identidades de gênero.  O trecho abaixo é apenas um recorte da live, mas considero que seja muito interessante e relevante para as diversas discussões sobre linguagem neutra na atualidade. Confira e siga o perfil dos participantes no Instagram. Carolina Carolino e Sergio Viula 07/04/24 Instagram: @carolinas_da_borborema

Cuba e sua teimosa repressão aos LGBT

Raul Castro, líder de Cuba.




Por Sergio Viula


Antes de tudo, deixo claro que parto do princípio de que todo ditador que se recusa a sair merece e deve ser derrubado. E toda demonstração de inclinação para o autoritarismo deve ser imediatamente identificada e neutralizada.

São especialmente perigosas aquelas ditaduras que se disfarçam de democracias. Estas costumam realizar eleições aparentemente ilibadas, sem, contudo, renovar o comando dos países onde se instalaram por décadas a fio. 

Nesse pacote, incluo países da Ásia, Oriente Médio (considerado sub-região da África Eurásia), Europa, África e América Latina. E tais nações são tão distintas quanto a China, o Irã, a Rússia, o Egito, a Venezuela e Cuba. Infelizmente, estes estão longe de ser os únicos regimes autoritários no mundo atualmente. Muitos outros poderiam ser citados com mais ou com menos virulência. 

De acordo com o site Politize!, pode-se conceituar ditadura da seguinte maneira:

"Segundo Maurice Duverger, a ditadura pode ser definida como um regime político autoritário, mantido pela violência, de caráter excepcional e ilegítimo. Ela pode ser conduzida por uma pessoa ou um grupo que impõe seu projeto de governo à sociedade com o auxílio da força. Normalmente, ditadores chegam ao poder por meio de um golpe de Estado. Já o filósofo político Norberto Bobbio afirma que a ditadura moderna é um regime caracterizado pela concentração absoluta do poder e pela subversão da ordem política anterior."

Apesar da frase, "Normalmente, ditadores chegam ao poder por meio de um golpe de Estado", depois da consagração da democracia como o melhor sistema político já criado, ou seja, aquele em que os cidadãos elegem os seus dirigentes por meio de eleições periódicas, vários Estados ditatoriais passaram a manter uma aparência de democracia. E em alguns deles o ditador foi eleito antes que se percebessem suas intenções autoritárias, ou seja, não foi nem preciso um golpe de Estado.

Até mesmo em alguns países onde se mantém a figura do monarca, existem eleições para a formação ou renovação do parlamento. Em alguns desses sistemas, o primeiro ministro é o verdadeiro chefe de governo, Esse é o caso da Inglaterra, da Espanha, da Holanda, etc. Tais países são geralmente chamados monarquias constitucionais, pois não é o rei que decide o que é legal ou ilegal, mas a Constituição, construída por parlamentares e vigiada por juízes sob as vistas da sociedade, de suas organizações civis e da mídia, inclusive.

Isso leva muitas pessoas à conclusão equivocada de que a mera realização de eleições já garante que o sistema democrático de exercício de poder esteja em funcionamento. Poucas coisas poderiam ser mais nocivas do que esse engano.

Falemos de Cuba

Cuba é um desses casos paradoxais que inflamam paixões entre os que reprovam e os que aprovam seu sistema de governo. Isso se dá porque a Revolução Cubana, encabeçada por Fidel Castro, fez o que se deve fazer com qualquer ditadura, ou seja, subverteu-a. Entretanto, o próprio Fidel tornou-se um ditador agarrado ao poder por muito mais tempo que seu antecessor - Fulgêncio Batista. 

O que aconteceu em Cuba no final da década de 50 e início da década de 60 foi um duelo travado entre uma ditadura de direita e uma ditadura de esquerda. Em 1959, a guerrilha liderada por Fidel (esquerda) derrubou a ditadura de Fulgêncio Batista (direita), instalada no país desde 1952 por meio de um golpe militar. 

Os americanos, que antes ignoravam os abusos de Fulgêncio, uma vez que o ditador não criava obstáculos aos interesses americanos na região, passaram a ser ferozes oponentes de Fidel Castro por causa de uma série de mudanças que implementadas por este no país após a deposição do anterior. 

Em 1961, os americanos finalmente romperam relações com Cuba e tentaram derrubar o governo castrista. Foi essa quebra de relações com os EUA, em especial, que resultou na aliança dos cubanos com a União Soviética, com quem os ideólogos da revolução cubana tinham muito mais pontos em comum. Não o coincidentemente, o embargo político-econômico praticado pelos Estados Unidos contra Cuba foi imposto em 1960, ou seja, um ano antes da aliança de desta com a União Soviética. A partir de então, o regime castrista passou a ser a maior pedra no sapato de Washington dentro da América Latina.

O amor e o ódio contra Cuba andam lado a lado desde a polarização entre americanos e soviéticos durante a Guerra Fria. A rejeição do mundo capitalista ao sistema planificado de economia praticado por Cuba - conceito e prática típicos do pensamento socialista - e sua insistência em fazer aquele pequeno país se dobrar diante dos gigantes do capital levaram a ilha a enfrentar muitos problemas. Os cubanos, todavia, sobreviveram ao embargo, especialmente durante o tempo em que a Rússia (e a antiga União Soviética) a apoiava maciçamente. 

Amigos meus que já estiveram em Cuba ficaram muito bem impressionados com a segurança, a universalização da educação e ausência de grandes disparidades econômicas, além da preservação quase impecável de sua fauna e flora. 

Por outro lado, a população vive sob vigilância e só começou a ter acesso ao serviço de telefonia celular conectada à Internet em 2018 (pasmem!). E mesmo assim sob o comando de uma empresa estatal. 

Tudo é controlado pelo Estado e o autoritarismo não tenta sequer disfarçar sua extensão e profundidade.

Entre as razões para se condenar o regime, estão principalmente as violações contra os Direitos Humanos praticadas. Se levarmos em conta apenas o período em que Fidel já estava instalado no centro de comando daquele Estado, podemos dizer que Cuba violou cruel e repetidamente os mais básicos direitos individuais de sua população - algumas vezes, de modo ostensivo; outras vezes, com sutileza.

A perseguição aos gays no regime

Logo depois de conquistar o poder em Cuba, Fidel Castro passou a cercear os homens gays. Na década de 1960 e 1970, muitas pessoas LGBT foram presas e enviadas para "campos de re-educação", onde sofriam horrivelmente e sem poderem denunciar os abusos a que eram submetidos a quem quer que fosse. A homossexualidade era vista como contrária ao ideal de hipermasculinidade defendido pelos revolucionários. Por isso, o novo governo considerava a homossexualidade incompatível com o regime. Os castristas eram definitivamente castradores.

Fidel reconhece a perseguição

De acordo com o The Independent, em 1965, o próprio Fidel Castro dissera: “Nós nunca chegamos a acreditar que o homossexual pudesse incorporar as condições e exigências de conduta que nos permitiriam considerá-lo como um verdadeiro revolucionário, um verdadeiro militante comunista."

Mais tarde, já na década de 1980, quando surgiu a crise da AIDS, os cubanos que eram portadores do vírus HIV passaram a ser forçados à quarentena, ou seja, condenados ao completo isolamento em unidades do governo, as quais os críticos chamam de prisões, literalmente. 

Esses indivíduos pessoas foram encarcerados por causa de uma doença que não infectava ninguém por meio da mera convivência social. Enquanto isso, a tuberculose e outras doenças altamente contagiosas não recebiam esse tipo de "tratamento". Por que será que estas estavam soltas enquanto aqueles estavam presos? Talvez, você já saiba a resposta.

Somente no ano de 2010, quarenta anos depois de começar a governar Cuba (40 anos de governo!!!!), foi que Fidel Castro ADMITIU responsabilidade pelas injustiças impostas contra pessoas LGBT em sua administração. A declaração foi dada ao jornal mexicano La Jornada. Ele disse claramente: "Se alguém é responsável, sou eu."


**********


La Jornada: – Quem foi, portanto, o responsável direto ou indireto por não se impedir o que estava acontecendo na sociedade cubana? O Partido? Porque esta é a hora em que o Partido Comunista de Cuba não explicita em seus estatutos a proibição contra a discriminação por orientação sexual.

Fidel: – Não. Se alguém é responsável, sou eu...

**********


Começam as mudanças

Em 2017, o panorama para os direitos LGBT em Cuba pareciam ter se transformado. A Constituição do país proíbe "qualquer forma de discriminação que fira a dignidade humana", e a assistência de saúde e a visibilidade desse segmento populacional melhoram.



Fidel Castro (esquerda) e seu irmão Raul Castro, atual líder de Cuba



Esse avanço deve-se, em grande parte, a uma campanha encabeçada por Mariela Castro, filha do atual presidente Raul Castro e sobrinha de Fidel, que é diretora do Centro Nacional para Educação Sexual  (CENESEX), instituição estatal.

Desde 2008, as cirurgias de redesignação genital e tratamento hormonal passaram a ser disponibilizadas de graça pelo sistema nacional de saúde cubano. 

Quanto ao HIV, a assistência de saúde melhorou muito e o país distribui preservativos gratuita e sistematicamente. A educação sexual melhorou consideravelmente e o acesso aos medicamentos antirretrovirais aumentou.

Em maio de 2018, aconteceu uma cerimônia religiosa para casamento de pessoas trans em Matanzas. Em 2013, a lei cubana proibiu a discriminação baseada em orientação sexual e passou a haver uma visível movimentação a favor da legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Contudo, de acordo com Robin Guittard, um ativista da Anistia Internacional, "o estigma contra pessoas LGBTI ainda continua presente na machista sociedade cubana."


O preconceito resiste e a comunidade LGBT, idem

É um fato inegável que o único ativismo LGBT permitido no país é aquele controlado pelo Estado. Sim, porque ditaduras podem permitir pequenas brechas em suas muralhas de repressão, mas sempre e somente sob os olhos vigilantes do ditador e de seus fiéis asseclas. E isso mesmo apenas enquanto ele considerar interessante ou útil para a sua permanência no poder.


Robin Guittard, Anistia Internacional


Robin Guittard pontua o seguinte:

“No contexto cubano, onde a liberdade de expressão e associação continua sob o rígido controle do Estado e onde a sociedade civil independente ainda não é oficialmente reconhecida pelas autoridades, o CENESEX é visto como que tentando assumir o monopólio na promoção dos direitos LGBT."

“Ativistas dos direitos LGBTI que são críticos ao Estado, ao CENESEX, ou a Mariela Castro, tornam-se,  frequentemente, alvos de repressão do mesmo modo que ocorre com qualquer um que tente trabalhar por direitos humanos fora do controle do Estado cubano."

Guittard fez essas declarações ao The Independent em janeiro de 2018. Pouco mais de um ano se passou até que pudéssemos ver nitidamente quão certo ele estava em sua análise-denúncia. 

De acordo com agência Reuters em 11 de maio de 2019, portanto apenas quatro dias antes dessa postagem, os ativistas pelos direitos LGBT de Cuba decidiram realizar uma Parada do Orgulho LGBT independente e sem autorização do poder central. A parada ocorreu sábado passado.

Apesar do caráter pacífico e festivo da parada, o governo de Cuba havia advertido o grupo contra a realização do evento, chamando-o de subversivo. Em Cuba, apenas um partido (Partido Comunista de Cuba) é permitido. São os chefes do partido que dão as cartas.


Ativistas LGBT cubanos participam de uma marcha contra a homofobia e transfobia em Havana, 11 de maio de 2019. Foto: REUTERS/Stringer


Apesar da negativa do partido, mais de cem cubanos cantando "vida loga à Cuba diversa" e carregando bandeiras do arco-íris marcharam alegremente por cerca de um quilômetro. O grupo partiu do Parque Central de Havana em direção à avenida que margeia a praia, mas foi impedido por dezenas de policiais logo em seguida.

Pelo menos, três ativistas foram presos por policiais à paisana, ou seja, não fardados, enquanto outros eram obrigados a se dispersarem sob o pretexto de que a atividade não tinha permissão oficial.


Cubanos reprimidos em Parada LGBT em Havana, 
11 de maio de 2019. Foto: Ernesto Mastracusa - EFE



Por que marchar sem autorização?

Os ativistas convocaram sua própria parada depois que um congresso dirigido pela estatal CENESEX mais cedo esse mês cancelou abruptamente seu 12º congresso anual contra a homofobia - o equivalente cubano ao Orgulho LGBT. 

A desculpa de Mariela Castro, filha do líder do Partido Comunista, que governa Cuba, foi que certos grupos estariam planejando usar o evento para minar o governo diante da escalada de agressões ao país pelo direitista Donald Trump e por causa da crise instalada em sua aliada esquerdista, a Venezuela.

Contudo, muitos ativistas LGBT disseram acreditar que o governo estava cedendo à pressão por parte das igrejas evangélicas, que estão crescendo em Cuba, e que têm promovido campanhas contra o reconhecimento dos direitos LGBT no país.

“Esta não é uma marcha política, esta é uma celebração para dar visibilidade à comunidade LGBT", disse uma das organizadoras, Myrna Rosa Padron Dickson.

Myrna Rosa Padron Dickson, promotora cultural e ativista.



Fundamentalistas homofóbicos

Muitos Cubanos expressaram sua oposição a mudanças no texto constitucional, que, segundo eles, abririam as portas para o casamento igualitário.

Igrejas evangélicas têm promovido campanhas sem precedentes contra qualquer abertura para os direitos conjugais homoafetivos. Por causa dessas pressões, o todo-poderoso Partido Comunista Cubano, recuou e permitiu que os rascunhos da nova constituição fossem esvaziados no tocante à não-discriminação dentro dos direitos conjugais. 

Em outras palavras, por causa da pressão fundamentalista influenciando as massas, o governo cubano recuou de qualquer possibilidade de legalizar casamento igualitário.

A democracia não é exclusivamente exercida com base na vontade da maioria. Ela tem por base e limites os Direitos Humanos, consagrados como o parâmetro áureo e inegociável de qualquer política ou legislação. Trata-se de perigoso equívoco pensar que grupos hegemônicos possam impedir direitos fundamentais sem estarem, por isso mesmo, sabotando o Estado Democrático de Direito.


Cubanos reprimidos em Parada LGBT em Havana, 
11 de maio de 2019. Foto: Ernesto Mastracusa - EFE

Ao que parece, o fascismo das igrejas fundamentalistas se dá muito bem com ditaduras, sejam elas de esquerda ou de direita. Já a mera existência da diversidade sexual parece representar uma ameaça ao autoritarismo sanguinário de todas essas aves de rapina.

Volto a dizer: Todo autoritarismo tem que ser subvertido, venha de onde vier. E ninguém tem demonstrado mais apreço pelo controle total da vida do cidadão do que duas instituições extremamente autoritárias - a religião e o militarismo. Essas duas instituições, pulverizadas de muitas maneiras no tecido social, constituem-se em duas imensas reservas de poder que ditadores de qualquer tendência são capazes de mobilizar para se instalarem e se perpetuarem no poder. Claro que sempre a um custo ($$$) elevadíssimo para os cofres públicos e para as liberdades civis.

Por tudo isso, DIGA NÃO a todos eles! DIGA SIM à liberdade e ao reconhecimento dos direitos fundamentais de TODOS os seres humanos, com suas particularidades nomeadas e respeitadas. NADA MENOS que isso deveria nos interessar. E NINGUÉM deveria ser considerado um ícone para qualquer um de nós se não está disposto a esse nível de respeito aos nossos direitos, individualidades e felicidade. 

Por isso, ninguém vai me ver colocando uma camisa de Che Guevara, de Fidel Castro, de Donald Trump, de Bolsonaro, de Maduro, de Kim Jong-un, de Putin, ou de qualquer outro desses minotauros em seus labirintos de repressão praticamente inescapáveis. Praticamente, mas não realmente inescapáveis. Para cada minotauro devorador de homens, existem muitos Teseu(s) que podem por fim à sua dinastia - nem sempre por meio da espada, mas dificilmente sem resistência por parte desses tiranos.

Quem derrama ou derramou o sangue dos meus irmãos e irmãs LGBT, qualquer que tenha sido o pretexto, e/ou aqueles que os mantém no cativeiro da repressão, não merecem meu apreço, apenas meu repúdio. 

FORA, OPRESSORES DE TODAS AS LINHAS IDEOLÓGICAS!

Teseu derrotando e destruindo o Minotauro para libertar seus companheiros.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

A homossexualidade no Egito antigo

Zeus e Ganimedes: A paixão entre um deus e um príncipe de Tróia

Humorista 'Picolina' é encontrada morta dentro de casa em Fortaleza