Conversa entre Forrest, Jovon e Sérgio
Forrest:
Temos o Sérgio na linha. Certo. Eu o vejo ligando do Brasil. Ele quer falar sobre o fechamento de igrejas.
Sérgio, você está ao vivo com Forrest e Jovon. Como você está hoje?
Sérgio:
Olá, pessoal! Estou ótimo agora. Estou muito feliz em falar com vocês.
Adoro seus programas e os acompanho há anos — desde antes do The Line existir.
E agora basicamente assisto só ao The Line, porque amo esse... esse centro de sabedoria, inteligência e crítica — no melhor sentido.
Parabéns pelo trabalho de vocês!
Ah, se eu disser algo que vocês não entenderem bem, por favor perguntem, porque o inglês não é minha primeira língua.
Forrest:
Seu inglês é melhor que o meu português!
Sérgio:
(risos) Muito obrigado! Tenho certeza de que muitos cariocas também gostam de vocês.
Eu sou do Rio. E, Jovon, é um prazer te ouvir em tantos programas — não só hoje.
Forrest:
(risos) Pois é! O Jovon está com o microfone no mudo, mas acho que ele gostou disso.
Jovon:
Não, não gostei! (risos)
Forrest:
Ah, eu vi você mexer a boca, mas não ouvi nada.
Pensei: “O que foi isso?”
Jovon:
Eu disse “obrigado”!
Seus fones de ouvido estão ruins, Forrest.
Forrest:
(rindo) Não, não disse, não!
Sérgio:
(rindo) Vocês são incríveis! E eu fico me perguntando como conseguem ter tanta resiliência, tanta paciência, pra ouvir certas coisas...
Como o cara que estava falando sobre escravidão e discriminação — meu Deus!
Vocês fazem isso há anos, praticamente todos os dias.
Eu não teria metade da paciência de vocês.
E acreditem, eu venho desse meio.
Eu fui pastor batista.
Eu era um fanático, acreditava em cura gay, em terapia de conversão.
Mas há 20 anos eu me desconverti, virei ateu.
Nos meus dois últimos anos na igreja, eu ainda tentava acreditar — mas não dava mais.
A razão gritava tão alto que eu não conseguia mais “fingir surdez”.
Desculpem se isso soa um pouco... capacitista — existe essa palavra em inglês? “Capacitist”? (NOTA deste blogueira: Nao. A palavra certa é "ableist", mas não me vinha à mente no calor do momento)
Forrest:
(risos) Algo parecido, sim.
Sérgio:
(risos) Pois é. Mas eu realmente não conseguia mais ignorar a razão gritando que tudo aquilo era uma grande besteira.
E aí tive que desfazer toda a minha vida.
Eu era casado com uma mulher, tínhamos dois filhos.
Precisei sair de dois armários ao mesmo tempo — o de ser gay e o de ser ateu.
Fui casado por 14 anos, e quando saí, nunca abandonei minha ex-esposa nem meus filhos.
Fiz o possível pra sustentá-los até ela se casar novamente e recomeçar a vida.
Mas sempre permaneci presente para meus filhos.
Hoje sou casado com um homem há 10 anos e não me arrependo um segundo sequer do meu ateísmo.
E é importante dizer:
Eu não virei ateu para aceitar minha sexualidade.
As duas coisas aconteceram ao mesmo tempo, lado a lado — mas foram processos diferentes.
Foram anos muito difíceis. Sofri muito.
Nunca pensei em tirar minha vida, mas vi muitas pessoas fazerem isso — às vezes por motivos menores.
Cada pessoa tem um limite diferente pra dor.
Felizmente, já sou ateu há 20 anos.
E a minha pergunta pra vocês é a seguinte:
Li recentemente algumas estatísticas dizendo que cerca de 15 mil igrejas devem fechar até o fim de 2025.
Com tantas igrejas fechando e menos gente frequentando cultos,
vocês acham que os EUA estão caminhando para um futuro mais secular?
Ou uma nova forma de “espiritualidade” pode surgir e ocupar esse espaço?
Acham que racionalismo, secularismo, humanismo vão substituir essas “espiritualidades” que as pessoas estão deixando?
Ou algo novo pode aparecer — talvez o mesmo conteúdo, só que com uma roupagem diferente?
Estou muito curioso com a opinião de vocês.
Jovon:
Eu acho que os EUA estão correndo de cabeça em direção ao nacionalismo cristão branco,
e não vejo sinais de que isso vá desacelerar.
Forrest:
(risos) Primeiro: parabéns pela sua história incrível, Sérgio — de verdade.
Segundo: sim, há de fato um crescimento do secularismo.
As pessoas que se identificam como “sem religião” são o grupo religioso que mais cresce nos EUA.
Então há motivo pra esperança, sim.
Mas o Jovon está certo:
o nacionalismo cristão está em ascensão aqui, e eles têm muito poder político.
Isso não representa a maioria do povo,
mas representa boa parte da política americana.
Então, se você me dissesse apenas “as igrejas estão fechando”,
eu ficaria feliz, pensando: “ótimo, as pessoas estão saindo das igrejas”.
Mas, nesse momento da história americana,
eu temo que isso aconteça mais porque a economia está ruim —
e as igrejas não conseguem se sustentar.
E o governo de direita vai usar esse fato como “prova” de que o cristianismo está sendo atacado,
para justificar colocar mais Bíblias nas escolas.
Então, não tenho muita esperança no governo,
mas tenho esperança nas pessoas.
Há muita gente como você — disposta a pensar criticamente e se libertar da religião.
Mas o governo vai continuar tentando doutrinar as crianças.
Sérgio:
Nossa, isso é algo em que eu nunca tinha pensado, mas faz todo sentido.
É impressionante como a religião sempre consegue se transformar um pouco,
o suficiente para enganar as pessoas,
como se fosse algo novo — mas ainda enraizado nas velhas crenças e práticas.
E é incrível como ela pode fazer pessoas boas fazerem coisas ruins.
Essa foi minha experiência também.
Fui criado numa família católica, depois me tornei evangélico, missionário, pastor,
estudei teologia e fiz pós-graduação.
Mas é incrível como tudo isso me tornou pior do que eu era antes.
Porque, antes de ser cristão, eu já era uma pessoa bondosa,
me importava com os outros, tinha empatia.
Mesmo com os dogmas, eu ainda era compassivo.
Por exemplo, nunca concordei que se deva discriminar pessoas LGBTQ+.
Aqui no Brasil temos leis fortes contra isso:
nenhum estabelecimento comercial pode recusar atendimento a alguém.
Se fizer isso, pode até ser fechado.
E, mesmo que não seja, as pessoas se manifestam contra,
e o dono acaba se arrependendo.
Mesmo quem não faz parte do grupo discriminado participa da mobilização.
Jovon:
É assim que deveria ser em todo lugar.
Sérgio:
Exatamente!
Mas o que me deixa triste é pensar que, quando eu era cristão,
eu não apoiaria esse tipo de lei.
Eu realmente fiquei pior por causa da religião.
Se eu não tivesse me convertido,
nunca teria pregado as coisas que preguei.
Jovon:
Deixa eu te contar uma coisa sobre os EUA —
e talvez algumas pessoas discordem, mas acho que estou certo nisso.
A maioria dos nacionalistas cristãos americanos não é realmente cristã.
Eles são racistas.
Usam o “nacionalismo cristão” como disfarce pra promover o supremacismo branco.
Por isso falam de “teoria da substituição branca” e outras besteiras do tipo.
Não é sobre cristianismo — é sobre manter o poder branco.
Quando pessoas cristãs de outros países, como o Brasil, veem isso, elas pensam:
“Mas isso não tem nada a ver com o cristianismo!”
E é verdade — mas eles não ligam.
O que querem é preservar o domínio branco nos EUA.
Forrest:
Exato.
Você ouve muito as expressões “cultura ocidental”, “valores do Ocidente” —
esse é o código para isso.
Enfim, Sérgio, agradeço demais sua ligação e sua história.
Desejo tudo de melhor pra você.
Precisamos passar pra próxima chamada, mas volte quando quiser.
Sérgio:
Muito obrigado! Entendo perfeitamente.
Continuem com esse trabalho maravilhoso — estarei sempre torcendo por vocês.
Forrest:
Valeu demais! Vamos fazer o nosso melhor.
Cuide-se, cara. Tchau!
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