Fantástico e G1 mostram a vida clandestina dos gays de Uganda

Uganda à beira do abismo: 
quando o preconceito vira política de Estado


"Vou até o fim. Só saio se as coisas ficarem realmente insustentáveis."

– Warry Senfuka, ativista lésbica em Uganda

 

"Vou continuar batalhando pelo que acredito. Só vou deixar Uganda se for impossível permanecer aqui."

– Frank Mugisha, ativista gay em Uganda

 



Warry Senfuka, que integra ONG que defende os direitos dos gays em Uganda
(Foto: Rafael Pirrho/G1)


Frank Mugisha, um dos líderes do movimento gay de Uganda
(Foto: Rafael Pirrho/G1)


Enquanto no Brasil alguns se dizem “perseguidos” por não poderem destilar livremente seu ódio contra pessoas LGBTQIA+, do outro lado do mundo, em Uganda, homossexuais estão prestes a ser legalmente perseguidos – com prisão perpétua ou mesmo pena de morte.

Sim, você leu certo.

Um projeto de lei extremamente severo, proposto pelo deputado David Bahati, deve ser votado ainda este mês no Parlamento de Uganda. Se aprovado, o texto transformará em crime o simples ato de se declarar gay. Estão previstos: prisão perpétua para quem assumir sua homossexualidade e pena de morte para quem “influenciar crianças” ou “reincidir” na homossexualidade. Termos vagos, perigosamente subjetivos, prontos para serem usados como instrumentos de opressão.

A ativista Warry Senfuka, lésbica e integrante de uma ONG que atua na defesa dos direitos da população LGBTQIA+ e na prevenção à AIDS, descreve o clima de pânico: “Esse ambiente de terror interfere nas nossas vidas, não podemos ir a qualquer lugar. Eu só ando perto de casa e do escritório. Há muito tempo que não vinha à cidade.”

Com roupas consideradas "masculinas", Warry vira alvo de olhares tortos, xingamentos e ameaças. A simples escolha de uma calça jeans e camisa já é suficiente para identificar sua orientação e colocá-la em risco. “Uma vez passei em um bar e um bêbado gritou: ‘Vou te ensinar a ser mulher’. Sigo em frente.”

Frank Mugisha, outro nome importante da resistência LGBTQIA+ no país, também vive às escondidas, mudando constantemente de casa e local de reunião. Ele não consegue emprego por causa do preconceito, apesar de ter formação superior. A entrevista ao G1 só foi concedida após muitos cuidados: local combinado de última hora, sigilo total e medo constante.

A ONG em que Warry atua, assim como todas as que defendem os direitos LGBTQIA+, cairá na ilegalidade se a nova lei for aprovada. Isso porque o governo trata a homossexualidade como crime comparável ao roubo ou à agressão. James Obuturo, Ministro da Ética e Integridade, chegou a dizer: “Você permitiria uma organização de ladrões?”.

Mas Uganda já tem uma lei contra gays, de 1949, herança da colonização britânica. O novo projeto apenas intensifica o terror.

Apesar da pressão internacional – inclusive do ex-presidente dos EUA, Barack Obama, que chamou o projeto de “odioso e inaceitável” – o clima interno no país é amplamente favorável à aprovação. Uma manifestação com 25 mil pessoas em Jinja mostrou o tamanho do apoio popular ao preconceito institucionalizado.

Uganda pode se tornar o quinto país africano com pena de morte para homossexuais, ao lado de Sudão, Mauritânia e partes da Nigéria e da Somália.

E mesmo diante disso, Warry e Frank não pensam em fugir. Ainda não. Eles resistem. Porque ser quem se é não deveria ser um crime. E porque há coisas pelas quais vale a pena lutar até o fim.


💬 Comentário deste blogueiro

Venho acompanhando esse horror em Uganda há algum tempo e já publiquei outros textos sobre o assunto (basta procurar pela tag Uganda aqui no blog).

É um exemplo escancarado do que acontece quando o ódio vira política pública. Uganda mostra a face mais cruel e nua da homofobia: a perseguição, a exclusão, a violência. Uma sociedade inteira afundando em ignorância, guiada por líderes religiosos fundamentalistas – muitos dos quais foram “importados” dos Estados Unidos para incitar esse pânico moral.

Sim, pastores norte-americanos estiveram em Uganda incentivando autoridades e igrejas a promover esse tipo de cruzada medieval contra a comunidade LGBTQIA+. O projeto que está prestes a ser aprovado é um fruto direto dessa exportação de ódio. Enquanto isso, aqui no Brasil, há quem chore porque não pode “expressar sua opinião” chamando gays de abominações. O mesmo discurso que lá mata, aqui se disfarça de "liberdade de expressão".

Uganda é tudo o que o Brasil NÃO PODE SER.

E para isso, precisamos:

  • de educação para a diversidade;

  • de políticas públicas de inclusão;

  • e de uma legislação anti-homofobia eficaz e ativa.

A pobreza adora a companhia da ignorância. Uma alimenta a outra e juntas devoram a dignidade humana. Uganda, infelizmente, mostra isso com clareza assustadora.

Que os gritos de Warry e Frank ecoem além das fronteiras. E que nunca nos esqueçamos: o amor precisa de coragem, mas a dignidade precisa de justiça.

🖤
#ForaDoArmário #DireitosHumanos #LGBTQIA #Uganda #ResistênciaQueer

Comentários

  1. Concordo com o que vc escreveu, Sérgio.
    Mas vamos lá: aff é muito desestimulante ver que o mundo continua¹ a mesma m* de sempre! É impressionante! Estava indo pra faculdade e fiquei pensado: "Nossa todas aquelas atrocidades cometidas em nome de 'deus' foram a tanto tempo atrás...
    ...mas infelizmente vivo numa época em que as mesmas coisas acontecem, só mudou de lugar!"
    Sinceramente? é broxante. Mas sei que devemos buscar forças pra seguir até o fim, lutando pra provar que neste mundo SOMOS TODOS IGUAIS.
    Enquanto Uganda segue com diretrizes políticas totalmente viciadas e equivocadas, acho que resta-nos torcer para que uma energia em algum lugar deste Universo, (lado agnóstico falou agora) trabalhe em favor daquelas pessoas...Eu espero que vida nenhuma alí, precise de ser ceifada pelo egoísmo humano, justificado em doutrinas tidas como "divinas".
    Anyway, a situação lá acaba servindo como um paradigma que deve ser combatido a todo custo no Brasil. Já que aqui ainda há liberdade de expressão e certo respeito pelos direitos universais da pessoa humana, vamos ficar de olho nas decisões emanadas do nosso Legislativo - onde grassa evangélicos (tsc tsc).
    ¹ = claro que muita coisa já mudou, né hehe.

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  2. É isso aí, Tiago! Adorei a atitude resolvida e com aquele orgulho de si mesmo que todo gay deveria ter (não só os gays, mas todo ser humano que ame a vida e respeite o outro).

    Também adorei sua consciência política!!!

    Deixo um grande abraço, lindo!

    Continue visitando.

    Beijo grande,
    Sergio Viula

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