đ Rei James, famoso pela BĂblia que leva seu nome (King James), e seu amor por George Villiers đ
đđ„ Entre a BĂblia, o Fogo e o Desejo:
O Rei James I e Suas ContradiçÔes HistĂłricas đ„đ

O rei James I da Inglaterra (1566–1625) nĂŁo foi apenas um monarca. Foi autor, polĂtico, teĂłlogo e... uma figura marcada por intensas contradiçÔes. Por um lado, seu nome estĂĄ eternamente ligado Ă King James Version (KJV) da BĂblia, publicada em 1611 — uma das traduçÔes mais influentes da histĂłria do cristianismo. Por outro, foi tambĂ©m o autor de Demonology (1597), um tratado que contribuiu ativamente para a caça Ă s bruxas na Europa.
Mas hĂĄ ainda mais por trĂĄs do vĂ©u rĂ©gio: James era tambĂ©m um homem cujos desejos afetivos e sexuais por outros homens se manifestavam em sua vida pessoal — especialmente em sua intensa relação com George Villiers, o Duque de Buckingham.
đ A BĂblia que virou sĂmbolo
A King James Version nĂŁo foi apenas uma obra de fĂ© — foi uma manobra polĂtica. James I buscava consolidar sua autoridade sobre a Igreja da Inglaterra e oferecer uma alternativa Ă s traduçÔes bĂblicas puritanas e catĂłlicas. A KJV teve impacto cultural gigantesco, moldando o inglĂȘs moderno e reforçando o poder da monarquia sob um verniz sagrado.
đ Fonte: Nicolson, Adam. God’s Secretaries: The Making of the King James Bible. HarperCollins, 2003.
đ„ Demonologia: a teologia do terror
Poucos anos antes da KJV, James escreveu Demonology, inspirado por sua obsessĂŁo com o ocultismo e pelas confissĂ”es de bruxaria arrancadas sob tortura. No livro, ele defende abertamente a existĂȘncia de bruxas, demĂŽnios e a necessidade de puni-las.
Essa obra deu legitimidade Ă perseguição de mulheres — especialmente curandeiras, parteiras, camponesas e mulheres racializadas — que detinham saberes ancestrais. O livro alimentou o clima de medo e violĂȘncia que assolou a EscĂłcia e outras regiĂ”es britĂąnicas.
đ Fonte: James I. Daemonologie, in forme of a dialogue. Edinburgh, 1597.
đ Fonte: Barstow, Anne Llewellyn. Witchcraze: A New History of the European Witch Hunts. HarperOne, 1995.
đ Amor nos bastidores da coroa
Ao mesmo tempo em que sustentava um discurso cristĂŁo ortodoxo e perseguia mulheres rotuladas como "imorais", James vivia relacionamentos Ăntimos com outros homens. O mais conhecido deles foi George Villiers, com quem manteve uma relação afetuosa e, ao que tudo indica, sexual.
Cartas entre eles revelam um amor apaixonado. James chamava Villiers de “meu marido” e se dizia “seu marido e esposa, seu amor e senhor, seu coração e alma” (Croft, 2003). Os dois mantinham quartos conectados no PalĂĄcio de Apethorpe, fato registrado inclusive pelo English Heritage em 2010, que confirmou a existĂȘncia de uma passagem secreta entre os aposentos reais.
đ Fonte: Croft, Pauline. King James. Palgrave Macmillan, 2003.
đ Fonte: "Apethorpe Hall: Gateway linking bedrooms of King James I and his male lover discovered", The Independent, 19/07/2010.
⚖️ O rei e suas sombras
A histĂłria de James I Ă© um lembrete brutal de como o poder pode ser contraditĂłrio: um homem que amava outro homem, mas que escreveu uma BĂblia usada para oprimir. Um rei que perseguia "bruxas", enquanto vivia seus prĂłprios desejos fora das normas sexuais da Ă©poca. Um sĂmbolo da hipocrisia histĂłrica do patriarcado cristĂŁo, onde o desejo masculino branco e nobre podia ser silenciado e protegido, mas o saber e o corpo feminino eram condenados Ă fogueira.
No Fora do ArmĂĄrio, resgatar essas histĂłrias nĂŁo Ă© expor apenas contradiçÔes — Ă© trazer Ă luz as mĂșltiplas camadas da experiĂȘncia humana. James I era complexo, como todos nĂłs. Mas sua complexidade nĂŁo pode ser usada para apagar as violĂȘncias que sua pena e sua coroa ajudaram a perpetuar.
Diga nĂŁo Ă hipocrisia, Ă homofobia e Ă vida condenada ao armĂĄrio! Emancipe-se de tudo isso!
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