Two-Spirit: identidade, resistência e espiritualidade entre povos indígenas norte-americanos

Two-Spirit: identidade, resistência e espiritualidade entre povos indígenas norte-americanos


Por Sergio Viula


Indígena da América do Norte


Muito antes da colonização europeia, povos originários da América do Norte reconheciam e celebravam identidades de gênero e sexualidades diversas. Entre os Zuni, Ojibwe e Navajo, indivíduos conhecidos hoje como Two-Spirit desempenhavam papéis sociais, espirituais e culturais fundamentais, mostrando que a diversidade de gênero sempre foi respeitada e valorizada.


Two-Spirit: A transgeneridade entre os indígenas norte-americanos



We’wha (c. 1849–1896) – Povo Zuni (atual Novo México, EUA)


We’wha (c. 1849–1896) – Povo Zuni 


Uma das pessoas Two-Spirit mais conhecidas da história, We’wha nasceu com sexo masculino, mas viveu como mulher. Foi xamã, tecelã e embaixadora cultural de seu povo, conhecida como uma lhamana — termo zuni para indivíduos que desempenham papéis de gênero mistos. Em 1886, visitou Washington, D.C., como parte de uma delegação Zuni, sendo recebida como “dama indígena”.


Ozaawindib – Povo Ojibwe (região dos Grandes Lagos)



Ozaawindib – Povo Ojibwe

Guerreiro, curandeiro e indivíduo Two-Spirit (muito provavelmente trans ou não binário), Ozaawindib era assumidamente envolvido com homens e reconhecido por sua coragem em batalha. Participou de caçadas e guerras, sendo respeitado por suas habilidades e sabedoria, mostrando que a expressão de gênero e sexualidade não diminuía sua autoridade ou valor social.


Hasteen Klah (c. 1867–1937) – Nação Navajo (Dinéh)


Hasteen Klah (c. 1867–1937)


Artista, tecelão e xamã, Hasteen Klah combinava papéis masculinos e femininos em suas práticas espirituais, danças e tradições rituais. Mesmo sob forte repressão colonial e missionária, foi respeitado como uma figura sagrada, simbolizando a resistência cultural e espiritual de seu povo.


Indígena norte-americano pintado com as cores da bandeira do arco-íris
Manifestação do Orgulho Two-Spirit


Atualmente, as pessoas Two-Spirit e LGBTQIA+ entre os povos indígenas norte-americanos estão em um processo de resgate e resistência cultural. Historicamente, esses indivíduos desempenhavam papéis essenciais como líderes, curandeiros e mediadores em suas comunidades, mas a colonização e a imposição de normas heteronormativas silenciaram muitas dessas tradições. Hoje, jovens indígenas estão se reconectando com suas raízes, afirmando sua identidade Two-Spirit e criando espaços seguros, como powwows inclusivos e círculos de cura, para fortalecer a comunidade. Apesar dos desafios e do estigma que ainda enfrentam, a resiliência e o orgulho Two-Spirit florescem, reafirmando a importância de celebrar a diversidade de gênero e sexualidade nas culturas indígenas norte-americanas.


O amor venceu!


Os exemplos de We’wha, Ozaawindib e Hasteen Klah nos lembram que a diversidade de gênero e sexualidade sempre existiu e teve valor social e espiritual entre os povos indígenas norte-americanos. Celebrar essas histórias é afirmar que ser quem somos é legítimo, ancestral e uma forma de resistência, mostrando que a liberdade de identidade não é uma conquista recente, mas um legado profundo que merece ser reconhecido e honrado.

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