Falemos de flores: Um dia dedicado à diversidade
Por Sergio Viula
Fomos votar cedo. Já havíamos deixado na geladeira refrigerantes, cervejas, ingredientes para o almoço (pernil assado, tabule, arroz, feijão e salada), além de bolo com sorvete para a sobremesa.
O motivo?
Estávamos aguardando Aubrey Wade, um cidadão do Reino Unido que vive na Alemanha, e que veio ao Brasil realizar um projeto envolvendo filmagem, fotografia, pesquisa, depoimentos, etc. Não se deve falar muito sobre coisas assim antes que sejam publicadas, mas basta dizer que foi uma experiência extremamente humanizadora.
Depois de conversar com a equipe dele há duas sextas-feiras, momento em que só pude falar rapidamente com meus amigos Edson Amaro, Meire Finelon, Paulo Camargo e Ângela Moysés, os produtores ficaram interessados nessa curiosa história de um ex-pastor que virou ateu e de um ex-militante da falsamente "cura gay" que saiu do armário e que há 15 anos vive de acordo com sua afetividade e racionalidade, ambas livres de dogmas e fanatismo religioso.
Esse cara sou eu - como diz Robertão (risos).
De carona, sobrou para Andre, meu marido, e para minha irmã (Katia) com a esposa dela (Ismênia).
Dois gays e duas lésbicas passaram parte da manhã e toda a tarde deste domingo conversando com esse gentil britânico cuja namorada fazia aniversário hoje e que é pai de um lindo bebê de um ano de idade. Seus olhos treinados para produzir e captar lindas imagens através de seu equipamento de primeira linha estudavam cada possibilidade.
Aubrey ficou nitidamente tocado com nossas respectivas biografias e com a cumplicidade e o amor demonstrados por cada casal.
Minha irmã e cunhada foram entrevistadas por um bom tempo. Andre e eu, além de entrevistados, fomos fotografados em situações de profunda ternura.
O ambiente foi dominado por muito amor, gentileza e celebração da diversidade.
Imaginem a cena: Duas pessoas que nutrem fé em alguma forma de espiritualidade e duas outras que não têm o menor receio de assumir tranquilamente seu ateísmo. Duas mulheres que se amam e dois homens que se amam. Ambos os casais já passaram pela perda dos pais. Tanto eu como Kátia, minha irmã, acompanhamos essa dor vivenciada por nossos parceiros e ambos nos envolvemos integralmente no processo de luto. Não pude reter as lágrimas quando comentei a perda do Sr. Walter, pai do Andre. Ele chorou logo em seguida. Aubrey também. Era um choro silencioso... de dor compartilhada por sabermos que somos mortais que choramos nossos mortos e que poderemos ser chorados ou não quando morrermos, mas morremos de qualquer modo.
Mas nem tudo é dor. O tom de triunfo, ainda que temporário sobre a morte, veio do amor que acompanhou cada uma das palavras produzidas em meio à saudade desses entes queridos. Não somos apenas mortais que choram seus mortos, mas principalmente humanos que amam alguns dos que se foram e muitos que ainda estão por aqui também. Não somos só amor, todavia. Não somos mesmo, mas uma coisa fazemos - seguimos o lema "viva e deixe viver".
Conversamos, comemos, bebemos, aprendemos uns com os outros ao longo de todo o dia e colaboramos para a produção de peças jornalísticas/documentais que levarão nossas vozes marcadas pela diversidade (ir)religiosa e pela diversidade sexual para além das fronteiras brasileiras.
Quanto tempo vai levar isso? Talvez um ano. Parece muito, mas quer vivamos, quer morramos, nossas vozes ainda ecoarão. Esperamos que despertem outras consciências para modos lindos de viver. E que outro modo de viver poderia ser mais lindo e saudável do que aquele que é baseado na cumplicidade de corações que batem como quem toca mutuamente lindas canções de amor?
Enquanto fascistas e fundamentalistas avançavam por um lado, Aubrey nos dava a possibilidade de potencializar nossas vozes em tons de arco-íris para muito além de nosso modesto círculo.
Que lindo o texto. O dia com Aubrey foi muito legal .
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