Brasileiro homossexual e autista fala ao Blog Fora do Armário - homem fascinante!
O Blog Fora do Armário entrevistou neste domingo um jovem brasileiro que se identifica como homossexual e autista. Pessoa fascinante, foi ele quem traduziu o texto de um outro jovem gay e autista chamado Derek, escrito originalmente em inglês. Foi a partir da leitura desse texto e de um comentário que deixei na versão portuguesa e na versão inglesa que nos aproximamos. Washington Ferreira, esse jovem brasileiro que se coloca com tanta clareza, inteligência e orgulho é quem fala ao Blog Fora do Armário na entrevista exclusiva que você lerá a seguir. Simplesmente imperdível!
1. Você se
identifica como gay e autista. O que é ser autista? Qual é o seu tipo de autismo?
Quando digo que sou autista, isso significa que eu fui
diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista ou TEA. O autismo, de forma
bem simplificada, é um distúrbio do desenvolvimento neural caracterizado pelo
prejuízo na comunicação e na interação social e pelo comportamento restrito e
repetitivo. O meu tipo de autismo é chamado de autismo de alto funcionamento e
algumas pessoas chamam de autismo leve. Eu não apresento déficit cognitivo, mas
tive algum atraso no desenvolvimento da linguagem. Apresento dificuldades de
interação social, dificuldades comportamentais, convulsões, crises nervosas e
movimentos repetitivos ou estereotipias. Atualmente, comunico muito bem, embora
ainda tenha dificuldade para falar com clareza em determinadas circunstâncias e
momentos.
2. Sair do
armário pode ser um processo difícil para a maioria das pessoas. Como foi a sua
experiência de auto reconhecimento e de emancipação? Em outras palavras, como
foi que você foi entendendo que era gay e como foi que você saiu do armário?
Eu tive consciência da minha homossexualidade aos vinte e
três anos. Na adolescência, eu não tive interesses sexuais ou afetivos. Quando
comecei a conhecer outros homens homossexuais, eu tinha aquilo que chamam de
“inveja do bem”. Eu gostaria de ter dado meu primeiro beijo na adolescência
ainda. Acreditava que eu era reprimido. Os outros jovens passavam a ideia de
que eles eram determinados e fortes. Só anos mais tarde, com muita terapia e leituras
de textos sobre autismo, é que eu descobri que pessoas autistas têm um
desenvolvimento emocional mais lento e que algumas permanecerão inclusive
assexuadas para o resto de suas vidas. A partir daí comecei a aceitar-me mais e
saber que tudo tem seu tempo.
3. Quantos
anos você tem hoje e como é sua rotina diária? Você estuda? Trabalha? O que faz
no seu tempo livre?

4.
Geralmente, os pais e amigos de pessoas autistas esquecem que a pessoa
autista também tem necessidades e potencialidades afetivas e sexuais. Você já teve namorado? Está em algum
relacionamento no momento?

5. O que
diria para os pais e amigos de pessoas autistas LGBT ou heterossexuais em
relação à vida afetiva e sexual de seus queridos autistas?

6. Você
considera que as pessoas autistas heterossexuais e LGBT estejam cientes das
práticas de prevenção às DST (doenças sexualmente transmissíveis), inclusive o
HIV e o HPV? E da sempre possível gravidez no caso das relações heterossexuais?
As campanhas de prevenção atingem as pessoas autistas da mesma maneira que as
pessoas não-autistas?

7. Você
mantém um blog chamado Autismo e Diversidade. Como surgiu a ideia? Está filiado
a algum grupo especificamente voltado para esse segmento populacional?

Quanto ao meu segundo grande objetivo, eu pretendo alcançar
a comunidade LGBT neurotípica (ou não-autista, se preferir). É uma forma de
dizer: “nós existimos”. Não podemos estar em casas noturnas ou nos bares, mas
estamos aqui. Aliás, estamos em todos os lugares. Existe portador da Síndrome
de Down que é gay, existe lésbica que é cadeirante... Citei esses dois exemplos,
pois eles são reais e eu os conheço. Muitas vezes, nos sentimos negligenciados
por nossas famílias e comunidade. É como se não tivéssemos direito à existência
plena.
8. O que você
acha que o governo precisa urgentemente fazer para viabilizar a realização
pessoal dos cidadãos autistas, seja no nível acadêmico, profissional, legal,
médico, cultural, esportivo, de lazer, etc?
São muitas coisas. A primeira, preparar os profissionais
para o diagnóstico de autismo. Eu recebia diferentes diagnósticos. Já recebi
até um falso diagnóstico de esquizofrenia. Quanto mais cedo o autismo for
diagnosticado – e hoje temos técnicas que permitem diagnosticá-lo já nos dois
primeiros anos de vida – mais tempo a família e os profissionais poderão
trabalhar a síndrome. Preparar as
escolas e capacitar as professoras e
professores que recebem o aluno com autismo no espaço escolar. Trabalhar o tema
da inclusão com as crianças e adolescentes. Falta um projeto que vise inserir o
autista adulto no mercado de trabalho. Há empresas no exterior que possuem funcionários
autistas e sabem que eles são produtivos e independentes. Muitos autistas
adultos são medicados excessivamente e há uma cultura ainda persistente de
internações desnecessárias. A família, os amigos, a escola e a comunidade devem
buscar oportunidades para o crescimento das pessoas autistas. Se esses
problemas forem trabalhados já na infância e na adolescência, podemos inferir
que a qualidade de vida dos adultos autistas será melhor.
9. Como
pessoa autista, você já foi vítima de preconceito? E como homossexual? Como
você lidou/lida com isso? Que conselho você daria a outros autistas LGBT?

10. Qual é o seu
maior sonho na vida?
Vou falar de dois: um sonho enquanto indivíduo e outro sonho
enquanto portador de TEA. Meu maior sonho pessoal é aprender a dirigir e tirar
minha carteira de habilitação. Eu tenho que aprender muito ainda, preciso desenvolver
minha coordenação motora e terei que fazer uma autoescola especializada, mas
pretendo realizar esse sonho. Minha realização enquanto autista é que todas as
crianças e adolescentes autistas possam ter uma vida melhor.
11. Se outras
pessoas autistas lésbicas, gays, bissexuais ou transgêneras precisarem de apoio
para lidar com conflitos externos ou internos relacionados à sua sexualidade ou
identidade de gênero, onde elas poderão obter apoio?
Creio que os mesmos lugares que são procurados por LGBT
típicos. Os diversos escritórios da AMA (Associação de Amigos do Autista)
possuem atendimento psicológico especializado e voltado a autistas e podem
ajudar muito. Caso isso não seja possível, a última alternativa é procurar
algum apoio psicológico na rede pública ou na rede privada.
12. Há alguma
outra coisa que você queira dizer ao público do Blog Fora do Armário?
Eu agradeço o espaço que me foi oferecido pelo Sergio Viula.
Falo muito pouco sobre mim e vi com muito proveito. Peço aos leitores e
leitoras do Blog Fora do Armário que procurem se informar sobre autismo e
visitem o meu blog também. Posso estar antecipado, mas desejo um 2015 de muitas
realizações a vocês. Muito obrigado.
Eu é que me senti honrado, Washington Ferreira, com o privilégio de ouvi-lo. Tenho certeza que o público do Blog Fora do Armário também. Espero que nossa amizade cresça a cada dia. Um abraço para você e para seu namorado.
Amigas e Amigos do Blog Fora do Armário, visitem o site do Washington e vejam que trabalho fantástico ele faz: autismoediversidade.blogspot.com.br
Sou professor de Língua Portuguesa e não me sinto capaz de lidar com um aluno autista. Nunca tive um, mas fatalmente um dia isso acontecerá. A Universidade não nos prepara para lidarmos com pessoas que tenham necessidades especiais.
ResponderExcluirUma entrevista como a sua, em que lemos um depoimento sobre autismo em primeira pessoa, é inestimável.
Desejo sucesso a você e ao seu blog.
Edson Amaro de Souza, você e os demais interessados podem baixar documentos de interesse no link a seguir: https://mega.co.nz/#F!mhx3WKga!tQc6-apecIC6ffoUBIbxMA
ExcluirTom é um cara fantástico, muito bem exposto. Creio que este conteúdo seria muito proveitoso a todos para conhecer mais sobre o autismo.
ResponderExcluirParabéns ao Tom e ao Sergio por abrir espaço para um assunto tão pouco divulgado.
Grande abraço!
Obrigado, Bruno.
ExcluirAbração.
Bruno, obrigado.
ExcluirObrigado, Edson.
ResponderExcluirSuper abraço.