Amish e homossexualidade: como eles lidam com a diversidade sexual

Amish e Homossexualidade: Como uma Comunidade Tradicional Lida com o Amor Entre Pessoas do Mesmo Gênero


Assim são os homens amish no dia a dia



Por Sergio Viula

Quando pensamos nos Amish, a imagem mais comum é a de uma comunidade tradicional, rural, profundamente religiosa e avessa às modernidades. Mas o que quase nunca se discute é: como vivem os Amish que se descobrem LGBTQ+?

Como eles lidam com seus desejos, afetos e identidades em um grupo social onde a homossexualidade é vista como pecado?

O Básico Sobre a Cultura Amish

Para compreender a cultura Amish nos Estados Unidos, é essencial conhecer seus elementos históricos, religiosos e sociais. Os Amish são considerados por alguns historiadores como um grupo etnorreligioso, já que sua identidade combina religião, cultura comum e ancestralidade compartilhada. Eles descendem de tradições anabatistas — um ramo específico do cristianismo — com raízes alemãs, suíças, holandesas e de outras regiões da Europa.

Origens e migração

As crenças que moldam a vida Amish surgiram na Suíça, durante a Reforma Protestante no século XVI, período marcado por grandes mudanças nas práticas religiosas cristãs. No início do século XVIII, famílias Amish começaram a emigrar para os Estados Unidos, estabelecendo-se principalmente na Pensilvânia, antes de se expandirem para estados vizinhos e partes do sudeste do Canadá.

Diversidade interna

Embora compartilhem valores e princípios gerais, as práticas Amish variam muito de acordo com a região, o nível de conservadorismo religioso e cultural e a herança específica de cada comunidade. O Condado de Lancaster, na Pensilvânia, abriga a maior população Amish do país — cerca de 30 mil pessoas. Dentro dessa população, existem aproximadamente 229 distritos Amish, cada um com suas próprias particularidades e subculturas.

Estilo de vida e valores

O estilo de vida Amish é marcado pela simplicidade, inspirada em uma interpretação bíblica que rejeita excessos materiais e conforto mundano. Suas comunidades são estruturadas em torno de atividades rurais, como agricultura, criação de animais e artesanato, e a família ocupa um papel central. É comum encontrar famílias numerosas vivendo próximas umas das outras e compartilhando responsabilidades comunitárias.

Os Amish valorizam profundamente a obediência, a humildade e o pacifismo. Suas roupas são simples e sem adornos — não usam joias nem ornamentações. Outro aspecto bastante conhecido é a relação restrita com a tecnologia moderna. Algumas comunidades evitam totalmente itens como carros, computadores e telefones, enquanto outras, mais flexíveis, permitem o uso de rádios a bateria ou telefones destinados exclusivamente ao trabalho.

Uma Igreja Baseada na Tradição e no Controle Social

A Igreja Amish — especialmente os Amish de Velha Ordem — segue regras religiosas rígidas, o Ordnung, revisado duas vezes por ano. Ele define tudo: roupas, uso de tecnologias, comportamento, casamento, trabalho e moralidade.

Nessa visão:

  • A identidade pessoal deve se submeter totalmente ao grupo.
  • A heterossexualidade é tratada como padrão absoluto.
  • Qualquer forma de diversidade sexual é considerada desvio.

Não existe, portanto, um subgrupo Amish assumidamente gay. Não por ausência de pessoas LGBTQ+, mas porque expressar isso é proibido e invisibilizado pela cultura religiosa.

Entre o Amor e a Fé: O Dilema dos Amish LGBTQ+

Um Amish gay geralmente enfrenta duas escolhas dolorosas:

1. Permanecer na comunidade e esconder quem é

Manter uma persona heterossexual, casar, ter filhos e “cumprir o papel”.

Isso significa viver uma vida dupla, reprimida e solitária.

2. Deixar a comunidade

Sair significa perder tudo: família, casa, apoio social, identidade cultural.

Para muitos Amish LGBTQ+, é um exílio emocional e literal.

Pessoas que se assumem ou são descobertas podem ser pressionadas a:

  • Buscar aconselhamento religioso
  • Reprimir sua sexualidade
  • Esconder seus relacionamentos
  • E, em casos extremos, fazer as malas e ir embora

Não há violência física como em épocas medievais, mas há uma forma poderosa de violência emocional: a expulsão.

Apesar de Tudo, Há Mudanças Lentas

Registros e relatos recentes mostram que algumas comunidades Amish têm adotado uma postura um pouco menos rígida.

Há Amish LGBTQ+ que relatam:

  • familiares que preferem “não tocar no assunto”, mas não rompem laços
  • comunidades que toleram discretamente, desde que a pessoa não se assuma
  • amigos que oferecem apoio silencioso
  • uma compreensão mínima de que “pecadores também merecem amor”

É pouco, mas é um começo.

Religião, Tradição e o Peso da Moral Sexual

A história dos Amish não é isolada.

Diversas tradições religiosas — incluindo a Igreja Católica e várias denominações protestantes — historicamente rejeitaram a homossexualidade. Mas o mundo está mudando, e parte dessas comunidades tem revisto sua postura.

Exemplos:

A Igreja Católica afirma que a homossexualidade “não é crime”, segundo o Papa Francisco.

Algumas igrejas metodistas e protestantes defendem acolhimento e igualdade de direitos.

Mesmo assim, o conflito entre religião e diversidade sexual continua sendo um terreno sensível e cheio de obstáculos.

O Que Nos Diz a História de Gays Amish?

Um testemunho citado pelo pesquisador Jim Cates mostra que:

  • há Amish LGBTQ+ que encontraram apoio inesperado dentro da própria comunidade
  • a dor causada por discursos religiosos pode durar anos
  • a cura emocional é um processo lento
  • e que a esperança existe — mesmo em contextos conservadores extremos

É um lembrete de que nenhuma comunidade é totalmente homogênea, e que a empatia pode surgir onde menos se espera.

O Amor Sempre Encontra uma Brecha

Ser Amish e gay continua sendo uma das condições mais difíceis para pessoas LGBTQ+ no mundo ocidental contemporâneo.

Mas histórias de aceitação — mesmo tímidas — mostram que é possível haver mudança onde antes só havia silêncio e repressão.

Talvez um dia os Amish percebam que amor é amor e não ameaça ninguém.

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