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É por isso que não somos respeitados: A triste sina da bicha moralista - texto de Fabrício Longo



LEIA O TEXTO NA ÍNTEGRA ABAIXO:



É por isso que não somos respeitados: a triste sina da bicha moralista

A homofobia sempre faz esse caminho. Ela apaga a individualidade e transforma “os gays” em uma coisa só, uma espécie de monstro – ou ditadura – onisciente, pronto para o ataque.




Por Fabrício Longo, d'Os Entendidos
(site indisponível em 05/01/2025)

Sempre me perguntei se uma das razões da homofobia não seria a inveja. Um tipo de recalque hétero, em relação às cores fabulosas de nossa liberdade de ser e de desejar, mas principalmente do nosso sexo. Um sexo que é safado, sujo, dos becos e saunas e boates, com toda a dor e a delícia que só o profano proporciona. Um sexo maldito e underground, tão diferente do “papai-e-mamãe” institucional que chega a causar repulsa, quase na mesma proporção em que gera fascínio. É, faz sentido. Ou pelo menos fazia…

Durante anos, o preconceito contra homossexuais foi alimentado por uma imagem de promiscuidade e libertinagem que criou o mito do “gay predador”, que estaria sempre disposto ao sexo e à espreita para devorar criancinhas converter um hétero. Mais que isso, atrelou essa imagem – e todo o horror dela – à identidade gay em geral, como um tipo de “marca da espécie”.

A homofobia sempre faz esse caminho. Ela apaga a individualidade e transforma “os gays” em uma coisa só, uma espécie de monstro – ou ditadura – onisciente, pronto para o ataque. É um tipo particularmente cruel de exclusão, que transforma a sexualidade em identidade e dita qual delas deve ser considerada normal e qual é a desviada, fazendo com que a diferença afete a visão de mundo de todos. Às vezes, quem detém o poder nem percebe isso, mas certamente não deseja perdê-lo. E quem é excluído passa a vida como um pedinte, de mãos estendidas por uma esmola de aceitação.

Ora, a homossexualidade só é invejável se for aproveitada! Envelhecer com o mesmo parceiro, criando gatos numa casinha com cercas brancas é uma opção maravilhosa, pois felicidade não tem receita. Entretanto, é só mais uma opção. A beleza da diversidade é a liberdade de escolha, e adequar-se a um padrão considerado “respeitável” não significa ser superior a quem pensa diferente. Ser um “gay limpinho” é bom, mas ser “bicha destruidora” também.

Não é curioso que o estereótipo aceitável seja masculino-branco-educado-rico, e que a definição do que é execrado seja afeminado-negro-sem estudo-pobre? É muito fácil julgar quando se está em posição superior, mas a triste sina da bicha moralista é justamente essa: gritar por inclusão em um sistema que nunca a aceitará.

Teoricamente, além de uma sexualidade mais liberal, a vivência da homossexualidade deveria nos fazer pessoas mais generosas. É compreensível que o privilegiado não tenha ciência de seu privilégio, mas é absurdo que o excluído não perceba sua posição. Mais bizarro ainda é quando esse excluído não tem capacidade de empatia para com outros “desviados” e pior, reproduz a discriminação para se colocar acima de alguém. Pisa para ser menos pisado, para sair melhor em comparação. Essa é a nossa vergonha. Isso sim é um desrespeito. E de quebra, ainda mostra o quão danosa é a nossa homofobia internalizada.

Um indivíduo postou uma selfie de dentro do motel, em plena ação. Outro dia, um ex-ator pornô foi “flagrado” em um aplicativo, com um perfil que procurava sexo a três com o namorado. Qual foi a reação do mundinho? Espanto! Horror! “É por isso que não somos respeitados, por causa desse tipo de gay!”

Ah, gente…

Sexo é ótimo, todo mundo adora. Madonna à parte, se existe alguma coisa que empresta unidade aos homossexuais é o desejo sexual, já que até a afetividade não é praticada por todos. Como grupo, somos definidos por nossa sexualidade. É ela que vira um marcador cultural de identidade, concordemos com isso ou não. Moralismo simplesmente não combina com o arco-íris, é muito cinza ou bege…

Temos radares de caçar homem instalados em nossos celulares e compartilhamos barbaridades em grupinhos do Face ou do Whats, e no entanto nos preocupamos com a “nossa imagem” para o mundo exterior. O fantasma da exclusão é tão grande que nos convencemos de que os héteros estão preocupados com o que fazemos.

Como assim, gente? Não somos respeitados porque o machismo se alimenta desse desrespeito, dessa generalização da inferioridade. Essa prática de “vigiar e punir”, apontando qual comportamento seria digno ou não, só nos mantém no lugar que foi designado para nós: o inferior.

Nós sempre seremos considerados inferiores porque a heterossexualidade – a norma – precisa dessa validação. É necessário apontar o reprovável para que seja possível colocar-se acima disso, e essa situação não vai mudar. Transformar atitudes individuais – sejam elas consideradas certas ou erradas – em ônus ou bônus para TODOS os gays é uma ignorância. É homofobia. É gritar que “essa bicha não me representa” tentando se diferenciar, apenas para reafirmar a ideia de que somos todos a mesma coisa. É um paradoxo.

Se somos tão diferentes, qual seria o porquê de nos defendermos dessa forma? Se cada um é responsável por suas ações, que diferença faz que A ou B aja desse ou daquele jeito? Não se vê heterossexuais sendo responsabilizados como um todo por, por exemplo, crimes praticados por indivíduos, certo? Já disse uma vez que “respeito não se pede e nem se conquista, é um direito universal”. Então não há razão para aplicarmos esse tipo de julgamento tão ferrenho entre nós.

É claro, a não ser que concordemos com nossa inferioridade. Isso sim, além de vergonhoso, é digno de pena.



É bom ou não é?

A Controvérsia da Normalidade

Qual dessas fotos representa você?

A Controvérsia da Normalidade


Por Sergio Viula


Eu sempre digo que adoro ler os comentários dos meus leitores. Alguns me incentivam, outros me divertem — e ainda tem aqueles que me inspiram. Foi o que acabou de acontecer. Estava lendo um comentário do Léo (no post “Homenagem a Heath Ledger”, de 30/01/08), e o cara simplesmente tocou num dos calcanhares de Aquiles de uma grande parte dos gays atuais: o medo de serem associados às “desprezíveis” bichinhas (como pensam os machistas). O comentário dele desencadeou uma série de pensamentos relâmpago na minha mente... geralmente inquieta.

A questão é a seguinte: existem muitos homossexuais que têm medo de sair do armário. Ponto pacífico. Outros continuam no armário porque acham conveniente para suas profissões, convívio familiar etc. O medo ainda é a base dessa escolha. Medo de rejeição, rótulos, olhares julgadores, deboches. Mas é preciso respeitar a decisão daqueles que optam por continuar do lado de dentro. Só que não existem apenas dois tipos de homossexual: os que estão dentro e os que já saíram. A coisa é bem mais complexa.

Há homossexuais assumidos que vivem sua sexualidade como quem segue o conselho das cervejarias pressionadas pela agência reguladora e pelo governo federal: “Beba com moderação.” Eles fazem o mesmo com sua identidade. Querem ser vistos como gays “moderados”: o tipo bem-moldado, comportado, social e politicamente correto. O problema é que todos esses rótulos se baseiam em estereótipos ditados pela heteronormatividade — aquela voz que sempre começa com “homem que é homem...” e, a partir daí, empacota tudo que lhe interessa: “... não desmunheca”, “... não fala macio”, “... não ri demais”, “... não chora”, “... anda largado”, “... senta de perna aberta”, “... coça o saco”, “... fala palavrão”, “... não usa rosa”... Cansou? Eu também. Cansei de ouvir isso a vida inteira, vindo de pai, mãe, tia, avó, tio, primo, colega... todo o “esquadrão da vigilância masculina”.

Mas sabe qual é o maior problema? Muitos homossexuais ouviram isso por tanto tempo que passaram a acreditar. Para quem ainda vive trancado no armário da própria vida, isso não é novidade. Tem que ser bom ator, senão nem precisa sair — o armário despenca só com o olhar do próximo, sempre atento ao menor escorregão.

O problema maior é com quem já saiu do armário. Aqueles que frequentam lugares e eventos LGBTQIA+, que fazem parte de comunidades gays online. Mas mesmo assim, ainda caem na tentação de querer agir o mais parecido possível com os heterossexuais. Não que haja algo errado em ser “naturalmente” masculino. Há gays que simplesmente não possuem traços comportamentais que destoem do que se convencionou chamar de “masculino”. E muitos deles são assumidíssimos! Levam cantada de mulher o tempo todo e não hesitam em dizer que têm namoradO, maridO, parceirO. Até aí, tudo bem. O problema surge quando o sujeito só consegue agir assim à força, ou quando age assim naturalmente, mas recrimina os que têm um comportamento mais “afetado”.

E sabe qual é o problema? É o desejo de parecer “normal”.

Qual o problema de ser diferente? Qual o problema de desmunhecar, de falar macio, de não gostar de futebol, de amar a coleção da Barbie, de ouvir “Macho, Macho Men”, “I Will Survive” ou “It’s Raining Men” no volume do pagode do vizinho no churrasco de domingo? É claro que gays têm gostos musicais variados como qualquer outro ser humano. Mas não há quem curta mais divas dos anos 70 e 80 do que os gays. Isso é fato.

Muitos homossexuais desprezam os “afetados”, os gays passivos, os transgêneros, os transformistas, os travestis, as lésbicas (especialmente as mais masculinas). Isso mostra o quanto ainda estão presos ao modelo heterossexual e machista. Por que o homem gay não pode ter um comportamento mais feminino? E por que a mulher gay não pode ter um estilo mais masculino? Não que isso seja necessário — mas por que deveria ser visto como indesejável?

Eu acho ótimo que existam essas variações de comportamento. Isso desmonta o pensamento binário de que tudo no comportamento humano tem que estar dividido entre macho e fêmea. Como se gênero fosse o divisor universal de águas na conduta do homo sapiens. Mas, infelizmente, é isso que ainda define, na cabeça de muita gente, o que é “normal”. Bem disse Pepeu Gomes: “Se Deus é menino e menina, sou o masculino-feminino...” — e olha que, até onde se sabe, o cara é heterossexual.

Mas o quão seguro é esse conceito de “normalidade” que o ser humano inventou como referência e que acabou se tornando sua própria armadilha de urso? (Ai... como dói!)

Tem gay votando em candidato homofóbico só para tentar se diferenciar dos outros gays pela sórdida via da homofobia (ou auto-homofobia, nesse caso). A gente precisa ver além dos estereótipos se quiser ser, no mínimo, justo — para não dizer inteligente.

O que você diria se eu alegasse que não é normal uma mulher saber ler e escrever? Ou trabalhar fora? Ou dar sua opinião quando homens estão discutindo? Ou votar? — Tudo isso era considerado anormal até bem pouco tempo. Imagine se as mulheres tivessem sucumbido à pressão machista em nome da tal “normalidade”...

O que falta a muitos homossexuais é exatamente isso: brio, orgulho de ser quem são. Ser quem se é — será que é pedir muito? Respeitar o jeito do outro — é demais?

É curioso como o machismo contamina até os lençóis. Tem viado doido pra dar a bunda, mas com vergonha do que o outro vai pensar: “E se ele achar que sou só uma bichinha passiva?” — pensam muitos (passivos!!!) até hoje. Besteira! É bem possível que o viado que banca o machão ativo seja justamente o que mais deseja ser passivo, mas nem se dá a chance. Vai logo pegando por trás para não deixar dúvidas.

É tragicômico ver o número de gays que não assumem que são passivos quando uma drag sacana provoca a plateia da boate:

“Cadê o grito das passivas?” — ela grita.

Meia dúzia responde timidamente: “Uuuuh...”

“E das ativas?” — ela insiste.

Alguns respondem.

A boate está lotada e quase ninguém se manifesta?!?! Como assim? Será que a maioria ali é hétero? Claro que não! Isso só mostra que muita gente ainda tem medo de assumir o próprio desejo. E por quê? Porque “homem que é homem não dá o cu” — dizem os machistas, desde o berçário até o túmulo.

E a bicha passa a vida toda se sentindo diminuída porque gosta de dar, mas não tem coragem de assumir isso com orgulho. Ou acha que, para dar, tem que colocar peruca. Kkkkk! Já vi caras com tanta testosterona que dava medo só de olhar — e na hora H, me deram as costas. Buniiiitaaas! E daí? Deixa de ser homem só porque curte preencher esse generoso buraco negro? Kkkkk!

Mas não pensem os apressadinhos que estou indo contra o que eu mesmo defendi, só porque, nesse exemplo, fui ativo. Alguém pode dizer:
“Ah, ele fala que vale tudo, mas só contou caso em que comeu alguém.”

Ahahahaha... Como são bobinhos esses meus leitores precipitados e intérpretes do inexistente... Ahahahaha...

Já passei por outra situação também. Lógico. Já fui pra cama com alguém que, pra ser mulher, só faltava a xereca. Eu achando que ia pegar de tudo quanto é jeito, mas o viado me disse que só fazia a ativa — podia ser verdade, ou só aquele medinho que comentei no início. Não importa. O que importa é que eu dei... e não recebi de volta. Ahahahaha...

Pra ser sincero, não conseguiria viver feliz casado com alguém que quisesse ser ativo o tempo todo comigo. Isso não escondo. É uma questão de preferência. Deve acontecer o mesmo ao contrário com outras pessoas. Tudo bem. Mas daí a dizer que nunca dei ou que nunca darei de novo? Ahahahaha... me poupe! Eu sou maior que meu cú e que meu pau. Estou além de qualquer restrição dessas. Tenho preferências, sim — mas camisa de força para o desejo, não. Preferência é só um desejo que se repete mais vezes que os outros, só isso.

Alguém pode dizer:

“Ih, igualzinho a mim... ‘Total Flex’!”

E os machistas, de novo:

“Ah, esses caras ‘bipolares’ na cama dizem que fazem as duas coisas só pra não serem tachados de passivos.”

De novo o preconceito contra o passivo. Qual o problema de o viado ser “total flex”? Deixa ele explorar seu potencial plenamente. Por que não? Inveja das ativas que não costumam dar a bunda, mas se ressentem disso? Ou despeito da passiva que tem medo de estar dando pra outra passiva? — uma que, como camaleão, se adapta: dá quando comem, e come quando dão. Kkkkk!

Sabe o que parece? Que as pessoas têm necessidade desesperada de rótulos, classificações, categorias. E, enquanto isso, perdem as melhores oportunidades de viver plenamente seus corpos e os corpos oferecidos na hora do amor. Não há certo ou errado, normal ou anormal no desejo entre duas pessoas de comum acordo e em pé de igualdade.

Não precisamos de agremiações do tipo “As Dadeiras Incansáveis” ou “As Comedoras Inflexíveis”. Precisamos entender, de uma vez por todas, que nossas diferenças não são excludentes — são complementares.

Parafraseando certo texto “sagrado”:

“Como darão, se não houver quem coma? E como comerão, se não forem convidados? Como está escrito: quão formosos os pênis que não se sentem acanhados e as bundas que não se fazem de rogadas.”  (Epístola de São Sergio aos Humanos)

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