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O que a xenofobia judaica tem a ver com a homofobia dos três principais monoteísmos?


O que a xenofobia judaica tem a ver com a homofobia dos três principais monoteísmos?




Por Sergio Viula
Originalmente publicado no AASA

Com vistas a criar e manter uma identidade nacional, os judeus recorreram ao conceito de raça eleita. Entretanto, a simples ideia de que Jeová teria escolhido Abraão, seu filho Isaque e seu neto Jacó para darem origem a um povo separado – significado primordial da palavra santo – já colocava o povo judeu em contraposição a todo e qualquer povo que não fosse judeu, obviamente.
Porque és povo santo ao Senhor teu Deus; e o Senhor te escolheu, de todos os povos que há sobre a face da terra, para lhe seres o seu próprio povo. Deuteronômio 14:2
O desprezo pelo não judeu, ou seja, o gentio, aquele que é de outras gentes da terra, fica claro quando Jeová proíbe que os judeus comam animal que morra espontaneamente, mas permite que os judeus o sirvam como alimento ao estrangeiro ou o vendam a este:
Não comereis nenhum animal morto; ao estrangeiro, que está dentro das tuas portas, o darás a comer, ou o venderás ao estranho, porquanto és povo santo ao Senhor teu Deus. (…) Deuteronômio 14:21
A preocupação dos escritores bíblicos era sempre a de que os judeus agissem de modo diferente, não necessariamente melhor, que os povos ao seu redor. De fato, muitas leis judaicas eram extremamente cruéis e tendenciosas. Mas, Moisés e a classe sacerdotal fazia questão que seus súditos fossem fiéis aos estatutos de Jeová, afinal essa era a garantia de que suas despensas estariam sempre cheias e prole alimentada, uma vez que eles comiam das oferendas feitas no tabernáculo e, mais adiante, no templo de Salomão. O trabalho dos sacerdotes e seus assistentes era intermediar os sacrifícios. E no caso de ofertas pacíficas, ou seja, que não fossem holocaustos, eles ganhavam uma parte. O grifo é meu:
Falou mais o Senhor a Moisés, dizendo: Fala aos filhos de Israel, dizendo: Quem oferecer ao Senhor o seu sacrifício pacífico, trará a sua oferta ao Senhor do seu sacrifício pacífico.
As suas próprias mãos trarão as ofertas queimadas do Senhor; a gordura do peito com o peito trará para movê-lo por oferta movida perante o Senhor. E o sacerdote queimará a gordura sobre o altar,porém o peito será de Arão e de seus filhos. 
Levítico 7:28-31
Sobre a exigência de que os judeus mantivessem hábitos e costumes diferentes dos povos ao redor, Moisés diz o seguinte:
Não fareis segundo as obras da terra do Egito, em que habitastes, nem fareis segundo as obras da terra de Canaã, para a qual vos levo, nem andareis nos seus estatutos. Levítico 18:3
Israel, nome que um anjo supostamente teria dado a Jacó – afinal, era melhor ser chamado de “aquele que luta com Deus e prevalece” (Israel) do que “suplantador”, “usurpador” (Jacó) – veio a ser o nome do povo exclusivo de Deus; exclusividade da qual só os judeus se gabavam. Agora, imagine um povo supostamente santo, ou seja, separado dos demais para a glória de Jeová, cujo nome, cada vez que fosse mencionado, trouxesse à mente a ideia de quem tenta “furar fila”, “passar à frente”, “tomar o lugar de outro”. Não admira que tenham inventado essa história de Jacó lutando com anjo.
Então disse: Não te chamarás mais Jacó, mas Israel; pois como príncipe lutaste com Deus e com os homens, e prevaleceste. Gênesis 32:28
Foi essa mentalidade separatista, um verdadeiro apartheidinternacional e inter-racial, de outros povos que gerou uma moral exterminadora das diferenças na teoria e na práxis judaica. Até, porque Israel não tinha território. As terras que eles estavam para invadir e usurpar (ah, Jacó!) eram de outros povos, instalados ali havia séculos. Vejamos o caso emblemático dos midianitas. Vejam que nenhum daqueles homens sobrou:
E pelejaram contra os midianitas, como o Senhor ordenara a Moisés; e mataram a todos os homens. Números 31:7
Só teve um problema: Os guerreiros de Israel pouparam as mulheres e as crianças. Moisés e o sacerdote Eleazar reprovaram esse ato de “misericórdia”, que não era tão bondoso assim. Na verdade, o interesse era de ordem sexual e escravagista. Mas, de novo, o temor de Moisés e do sacerdote Eleazar era que as mulheres ensinassem os filhos e as filhas de Israel a viverem como os filhos e as filhas de Midiã. Então, a ordem de Moisés foi clara:
Agora, pois, matai todo o homem entre as crianças, e matai toda a mulher que conheceu algum homem, deitando-se com ele. Porém, todas as meninas que não conheceram algum homem, deitando-se com ele, deixai-as viver para vós. Números 31:17-18
Esse “deixai-as viver para vós” significava literalmente que os homens de Israel poderiam desvirginar as meninas midianitas. Será que isso parece humanista o suficiente para você? Bem, não deveria.
O mais irônico é que o próprio Moisés, quando fugia do Egito, casou-se com Zípora, uma mulher midianita, filha de um sacerdote de Midiã chamado Reuel. Nem isso demoveria o sanguinário Moisés de praticar tanta violência contra o povo de sua própria esposa e de seu sogro, a quem ele devia a vida, pois foi ele quem o acolhera no meio do deserto quando fugia do Egito depois de matar um egípcio que maltratava um hebreu. Ah, e só para constar, seu primeiro filho, Gérson, também nasceu na terra de Midiã. (Êxodo 2:1-25)
Esse ato de poupar as virgens para uso próprio colaborou para fortalecer a ideia de que virgindade é símbolo de pureza. Se elas são consideradas mais puras porque são virgens, então, a abstinência sexual é uma forma de santidade. Não demora muito e logo se deriva daí que o ato sexual deve ser praticado dentro de limites muito rígidos e claramente estabelecidos pela lei mosaica. Mas outros aspectos da vida dos judeus não deixavam de ser afetados pela ascese javista: a dieta, a indumentária, a higiene pessoal, a quem a mãe deu à luz – menino ou menina. Sim, porque até isso entrava na lista de impurezas.
Aqui está o que diz Levítico 12:2-8. As partes em colchetes são comentários meus.
Fala aos filhos de Israel, dizendo: Se uma mulher conceber e der à luz um menino, será imunda sete dias, assim como nos dias da separação da sua enfermidade, será imunda.
E no dia oitavo se circuncidará ao menino a carne do seu prepúcio.
[Entenda-se por “dias da separação da sua enfermidade” os dias do seu ciclo menstrual. Vejam que a menstruação era considerada uma terrível impureza e o parto também. Maria fez cumpriu todas essas exigências quando teve Jesus. Era ela imunda? A Igreja Católica diz que ela era virgem antes do parto, permanecendo virgem depois dele – imaculada, ou seja, sem mancha, impureza ou pecado. Contudo, ela seguiu esse procedimento com relação a si mesma e ao menino Jesus, ispis letteris. E agora, José?]
Depois ficará ela trinta e três dias no sangue da sua purificação; nenhuma coisa santa tocará e não entrará no santuário até que se cumpram os dias da sua purificação.
[Mulher em resguardo, assim como a menstruada, não participava de culto, nada de missa, nada de igreja. Você conhece alguma que siga isso hoje? Obviamente, não. Quando ficam em casa, fazem-no por conveniência, não por ascese.]
Mas, se der à luz uma menina será imunda duas semanas, como na sua separação; depois ficará sessenta e seis dias no sangue da sua purificação.
[Ou seja, se a infeliz da parturiente tivesse um filho macho, ficava imunda metade do tempo: uma semana. Mas se tivesse uma fêmea, ficava imunda por duas semanas. As meninas já nasciam rotuladas como sendo um fardo maior que os meninos.]
E, quando forem cumpridos os dias da sua purificação por filho ou por filha, trará um cordeiro de um ano por holocausto, e um pombinho ou uma rola para expiação do pecado, diante da porta da tenda da congregação, ao sacerdote.
[A rola é o pássaro, hein, gente! Não tem nada a ver com a rola do marido. Piadinhas à parte, esses animais eram sacrificados de modo muito semelhante aos costumes de vários povos ao redor, inclusive os africanos que sacrificam aos Orixás. Nisso, Jeová não era tão diferente dos demais Deuses, mas a oferta tinha que ser feita no tabernáculo – em qualquer outro lugar seria abominação – e realizada por um sacerdote da família de Arão, irmão de Moisés, de acordo com as prescrições para esses holocaustos no Levítico. No final das contas, muito furdunço para nada!]
O qual o oferecerá perante o Senhor, e por ela fará propiciação; e será limpa do fluxo do seu sangue; esta é a lei da que der à luz menino ou menina.
[A mulher só se tornava limpa de novo depois desse sacrifício de sangue. Cada vez que uma judia paria, vários animais morriam. O que tem o Flu com as valsas? kkk]
Mas, se em sua mão não houver recursos para um cordeiro, então tomará duas rolas, ou dois pombinhos, um para o holocausto e outro para a propiciação do pecado; assim o sacerdote por ela fará expiação, e será limpa.
[Como Maria e José eram pobres, foi exatamente essa oferta que eles fizeram, como se vê em Lucas 2:21-24: “E, quando os oito dias foram cumpridos, para circuncidar o menino, foi-lhe dado o nome de Jesus, que pelo anjo lhe fora posto antes de ser concebido. E, cumprindo-se os dias da purificação dela, segundo a lei de Moisés, o levaram a Jerusalém, para o apresentarem ao Senhor (Segundo o que está escrito na lei do Senhor: Todo o macho primogênito será consagrado ao Senhor); e para darem a oferta segundo o disposto na lei do Senhor: Um par de rolas ou dois pombinhos.” ]
Na tentativa de separar Israel dos outros povos e seus costumes, Moisés chamou de abominação coisas tão díspares quanto comida e sexo, principalmente porque os costumes desses povos estavam geralmente associados ao culto a outros Deuses – e cultuar outros Deuses significava prestar obediência a outros sacerdotes, videntes, oráculos que não os da tribo de Levi, que não por coincidência era justamente a tribo de Moisés, Arão e Miriã – todos filhos de Joquebede, como dizem os livros de Êxodo 6:26 e de Números:
E o nome da mulher de Anrão era Joquebede, filha de Levi, a qual nasceu a Levi no Egito; e de Anrão ela teve Arão, e Moisés, e Miriã, irmã deles. Números 26:59
Vejamos alguns exemplos de abominação segundo a lei mosaica:
Todo o inseto que voa, que anda sobre quatro pés, será para vós uma abominação. Levítico 11:20
[Mas, espere um momento: não existem insetos de quatro patas. Moisés precisava ter prestado mais atenção às aulas de biologia. Pior que ele repetiu isso três versículos adiante, em Levítico 11:23]
Todo o [peixe] que não tem barbatanas ou escamas, nas águas, será para vós abominação. Levítico 11:12
[Filé de cação é abominação, hein, galera!]
Mas todo o que não tem barbatanas, nem escamas, nos mares e nos rios, todo o réptil das águas, e todo o ser vivente que há nas águas, estes serão para vós abominação. Levítico 11:10
[Casquinha de siri, risoto de camarão, moqueca de arraia, entre outras iguarias deliciosas da culinária brasileira, são abominações. Povo capixaba, baiano, carioca, cearense está todo perdido. Amazonense, paraense e outros povos que vivem perto de grandes rios e no pantanal estão lascados, porque o que eles já comeram de peixe sem escama na vida não está no gibi –tudo abominação!]
Também todo o réptil, que se arrasta sobre a terra, será abominação; não se comerá. Levítico 11:41
[Quem já comeu cobra está roubado.]
Não sacrificarás ao SENHOR teu Deus, boi ou gado miúdo em que haja defeito ou alguma coisa má; pois abominação é ao SENHOR teu Deus. Deuteronômio 17:1
[Boi manco, bode cego, só para citar dois exemplos, eram abominação, mas não foi Deus quem os fez assim? Vai entender…]
As imagens de escultura de seus deuses queimarás a fogo; a prata e o ouro que estão sobre elas não cobiçarás, nem os tomarás para ti, para que não te enlaces neles; pois abominação é ao Senhor teu Deus. Deuteronômio 7:25
[Ah, os bons católicos espanhóis que se apoderaram do ouro, da prata e das pedras preciosas que compunham as esculturas de deuses astecas, maias e incas! Eles não imaginavam que até esses metais e pedras preciosas eram abominação. E tem muito desse ouro nas próprias igrejas da Santa Madre, inclusive no Vaticano.]
Quando também um homem se deitar com outro homem, como com mulher, ambos fizeram abominação; certamente morrerão; o seu sangue será sobre eles. Levítico 20:13
[Ah, observem que a palavra abominação que os crentes de hoje tanto gostam de atribuir às relações homossexuais era a mesma usada se referir ao camarão, ao siri e à arraia? Detalhe: Vejam que não há menção às mulheres que se deitam com outras mulheres como se fossem homens. A questão primordial aqui era a homoafetividade (termo que eles desconheciam completamente). A questão era de outra ordem: a preocupação era com o “desperdício” de sêmen. Sobre isso, recomendo a leitura de uma post meu no Blog Fora do Armário - http://www.foradoarmario.net/2014/11/de-onde-vem-o-odio-de-cristaos.html.]
Não trarás o salário da prostituta nem preço de um sodomita à casa do Senhor teu Deus por qualquer voto; porque ambos são igualmente abominação ao Senhor teu Deus. Deuteronômio 23:18
[Aqui a prostituta e o sodomita são postos juntos, porque a única noção que os judeus tinham das relações entre homens era a da prostituição motivada por interesses econômicos ou prostituição ritual, inclusive masculina, durante os cultos aos Deuses da fertilidade. De novo, Jeová não admite concorrentes.]
Nem te deitarás com um animal, para te contaminares com ele; nem a mulher se porá perante um animal, para ajuntar-se com ele; confusão é. Levítico 18:23
[Auto láááá! A palavra para o sexo com animais é simplesmente confusão. O quêêêê??? Vejam o meu grifo lá. Quer dizer que oferecer um bezerro manco é abominação, mas trepar com ele é só confusão?? E tem gente que leva a sério essa joça?]
Bem, voltando à premissa básica desse artigo, tudo o que Israel fez para se diferenciar de outros povos poderia ser considerado hoje como tendo sido motivado por xenofobia. Não foi mero etnocentrismo, porque não se trata apenas de julgar outras culturas a partir da sua, o que já é suficientemente problemático, mas de exterminar todo modo de viver que não se encaixe na paranoia mosaica.
O cristianismo e o islamismo, crias não desejadas do judaísmo, têm seguido essa mesma linha no que diz respeito à sexualidade, especialmente à homossexualidade. Felizmente, percebendo a insensatez das interpretações literais desses textos, com aplicações diretas sobre os direitos civis de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros (LGBT), muitos rabinos têm tomado uma posição pró-casamento igualitário. Transcrevo abaixo um texto que eu considero muito interessante para essa discussão. O artigo é de autoria de Ivan Paulo Salgado sobre isso, postado no site deconchinha (http://deconchinha.com/index.php/religiao/99-a-homossexualidade-sob-a-perspectiva-do-judaismo):
A ação menos controversa e mais comum tomada pelos reconstrucionistas, conservadores, e os reformistas é apoiar a igualdade civil para gays e lésbicas. O CCAR, Conselho Rabínico Reformista, a partir 1977, passou a descriminalizar o sexo homossexual e acabou com toda a discriminação baseada na orientação sexual.
Mas como contornar a proibição aparentemente inequívoca bíblica contra a homossexualidade? Muitos que procuram estabelecer plenos direitos religiosos para gays e lésbicas apontam a natureza involuntária da homossexualidade. Os halakhic (legalistas) acreditam que como a homossexualidade se refere a alguém que, embora ordenado a fazer algo, realmente não consiga obedecer. Como no judaísmo, só se pode responsabilizar uma pessoa quanto a suas obrigações religiosas se ela pode livremente optar por cumprir. Assim, algumas autoridades judaicas argumentam que a homossexualidade não é escolhida, assim não pode ser proibida.
Na verdade, o movimento da Reforma do Judaísmo não condena o sexo homossexual, e as pessoas abertamente homossexuais são elegíveis para admissão em escolas rabínicas. Além disso, o movimento de Reforma aprova cerimônias rabínicas de casamentos entre pessoas do mesmo sexo. No entanto, eles não consideram o casamento homossexual como equivalente ao casamento heterossexual. Considerando que o casamento heterossexual é referido como Kiddushin (palavra hebraica para santo). Mesmo assim há rabinos que aplicam este termo para relações homossexuais.
Daniel Siegel, o diretor da escola rabínica ALEPH argumenta que Aliança para a Renovação Judaica, aprovou o casamento homossexual especificamente porque que a santidade não deve ser limitada apenas a certas pessoas e a determinadas relações. No Judaísmo reconstrucionista, o casamento homossexual é considerado um valor religioso. Usando esse princípio como ponto de partida, Rebecca Alpert argumentou que a recusa do governo israelense em reconhecer o casamento homossexual viola as liberdades religiosas.
Alguns rabinos do movimento conservador também se apoiam no conceito de que um indivíduo não tem nenhuma escolha real quanto ao sexo homossexual. Em dezembro de 2006, Comitê do Movimento Conservador aprovou duas teshuvot (posições) contraditórias sobre a homossexualidade. Rabinos, sinagogas e outras instituições conservadoras podem não permitir cerimônias de casamento homossexuais e não contratar rabinos ou cantores abertamente gays ou lésbicas. Por outro lado, podem simplesmente optar por fazê-lo. Ambas as posições são consideradas válidas.
Nos últimos anos, tem havido uma maior consciência da presença de gays e lésbicas nas tradicionais comunidades judaicas. Numerosas organizações e grupos de apoio existem para gays que estão interessados em manter um estilo de vida tradicional judaica. Steven Greenberg, rabino ortodoxo, educador e gay escreve e ministra palestras sobre as possibilidades de gays e lésbicas na comunidade ortodoxa. Finalmente, o documentário “Trembling Before G-d” (Tremendo perante Deus), sobre gays judeus ortodoxos, teve um impacto significativo no aumento da consciência sobre a homossexualidade no mundo ortodoxo Judeu.
Gostaria de ressaltar, antes de encerrar, que este movimento pró-revisão e pró-inclusão também está se dando nos dois outros monoteísmos: o cristianismo e o islamismo. Basta, a título de exemplificação, citar a Igreja Anglicana na Inglaterra, a Igreja da Escócia (de linha presbiteriana) e a Igreja Presbiteriana dos EUA. Mas há outras, especialmente aquelas criadas com uma visão inclusiva desde o final da década de 60, como é o caso daMetropolitan Community Church, fundada por Troy Perry.
Entre os islâmicos, esse movimento ainda é muito embrionário, mas sinaliza que há uma demanda interna, muitas vezes silenciada a ferro e fogo. Vejam a reportagem Paris terá primeira mesquita na Europa aberta aos homossexuais (http://www.portugues.rfi.fr/europa/20121129-paris-tera-primeira-mesquita-na-europa-aberta-gays-e-feministas). E também uma postagem de abril de 2012, no Blog Fora do Armário (http://www.foradoarmario.net/2012/04/categorias-artigos-baladas-babados.html) que reproduzia notícia sobre o casamento de dois homens, realizado por um imã numa cerimônia íntima.
Isso acontece porque nenhuma dessas religiões é um bloco monolítico. Existem judeus, cristãos e muçulmanos progressistas e secularizados o suficiente para quererem reformas baseadas em princípios humanistas. Já os literalistas não são sempre tão literalistas assim. Eles ignoram tudo o que consideram conveniente ignorar. Um exemplo interessante é a proibição mosaica de que pessoas com necessidades especiais sejam sacerdotes, pastores ou o que o valha. O legislador foi muito claro em Levítico 21:17-20:
Fala a Arão, dizendo: Ninguém da tua descendência, nas suas gerações, em que houver algum defeito, se chegará a oferecer o pão do seu Deus.
[Oferecer o pão do seu Deus = exercer o sacerdócio no tabernáculo.]
Pois nenhum homem em quem houver alguma deformidade se chegará; como homem cego, ou coxo, ou de nariz chato, ou de membros demasiadamente compridos,
[Homens com necessidades especiais não podem ser sacerdotes, segundo a lei mosaica. Mas, um momento… nariz chato é defeito? Quem é padre ou pastor africano ou afrodescendente, dá um glória a Deus aí! E o que a mulherada está fazendo no pastorado e no sacerdócio de algumas igrejas protestantes? Moisés jamais autorizou mulheres no ministério sacerdotal. Eita, religião machista do cacete, literalmente.]
Ou homem que tiver quebrado o pé, ou a mão quebrada, ou corcunda, ou anão, ou que tiver defeito no olho, ou sarna, ou impigem, ou que tiver testículo mutilado.
[Testículo??? O que isso tem a ver com o exercício do sacerdócio? Pastor com vitiligo também está perdido, porque isso era visto como defeito impeditivo. Ué, anão não pode ser sacerdote ou pastor? Outra coisa, eu conheço pastor corcunda numa igreja neopentecostal que eu frequentei quando era novo convertido. E agora?]
A desculpa que eles usam quando alguém cita essas passagens absurdas é que isso fazia parte da velha aliança. Segundo eles, o sacrifício de Cristo – veja a necessidade de sempre se matar alguém para obter o favor divino, e mesmo que Cristo tenha sido o último, lá está a Eucaristia para renovar o horror da crucificação a cada missa ou culto – aboliu tudo isso ou quase tudo, porque quando se trata de relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, eles querem manter o veto e expandi-lo para as lésbicas que nem sequer são citadas ali. Além disso, os conceitos contemporâneos de homossexualidade, direitos civis, casamento igualitário e famílias homoparentais são coisas com as quais Moisés nem sonhava, e que pertencem a uma moral e a uma ética que Moisés seria incapaz de conceber.
Todavia, seus sucessores tentam tornar tudo isso menos estúpido num mundo muito mais esclarecido do que aquele em que escravos supersticiosos passaram a invasores inflados pela crença de que eram o povo de propriedade exclusiva de Deus que podia matar, saquear, escravizar e fazer muitas outras coisasnada abomináveis (#sóquenão), desde que fosse para a maior glória de Jeová e para o fortalecimento do único povo portador de sua revelação – os próprios judeus.
De fato, há muita coisa a ser resgatada nesse passado (não tão distante) horripilante e cruel do judaísmo e de seus dois robustos filhotes, o cristianismo e o islamismo, mas eu prefiro deixar os mortos enterrarem seus próprios mortos, porque vive mais leve quem carrega menos peso. E religião, em última análise, é peso morto. Há, contudo, pessoas LGBT que encontram caminhos religiosos não castradores da sexodiversidade ou das identidades transgêneras. Algumas têm trabalhado duro para mudar a cara feia dos três grandes monoteísmos, bem como de religiões animistas ou politeístas que porventura tenham bebido em fontes homofóbicas e transfóbicas ao longo dos séculos.
Na verdade, tudo isso faz parte do direito humano à liberdade de crença e de agremiação. Felizmente, porém, muitas pessoas LGBT cresceram como ateias e assim permanecem, havendo também aquelas que vieram a ser ateias a partir de sua própria experiência religiosa submetida ao crivo incontornável do ceticismo. Pessoalmente, figuro nesse último segmento, valendo dizer que qualquer condescendência minha para com a ideia de que Deus ou Deuses disseram isso ou aquilo se dá apenas para o bem do argumento que norteia esse artigo. Penso que falar com Deus não faz de ninguém um doido, mas se ele responder, procure um psiquiatra.
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Leia Em Busca de Mim Mesmo.
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Aberrações homofóbicas islamitas

Homossexual atirado de prédio em território dominado 
por extremistas muçulmanos do Estado Islâmico



Por Sergio Viula

Essa semana, um amigo me marcou numa postagem que falava sobre extremistas islâmicos enforcando homossexuais em países dominados pelo fanatismo muçulmano. A foto seguia mesma linha da foto acima. Deixei uma carinha de tristeza lá, mas não teci comentários. Afinal, não é de hoje que se sabe o que muçulmanos homofóbicos são capazes de fazer quando estão empoderados de alguma maneira, seja pelo viés do terrorismo paralelo ou da violência estatal ("terrorismo legalizado") em países dominados por imãs e aiatolás, só para citar dois.

Logo depois de eu ter dado uma carinha triste para a postagem, um muçulmano que se apresenta como "mais liberal" escreveu comentários que ignoravam o drama dessas pessoas perseguidas, enquanto tentava salvaguardar suas próprias crenças.

Depois de tentar tampar o sol com uma peneira - sem sucesso, para quem tem uma capacidade mínima de interpretação de texto - ele se valeu de um termo de semântica duvidosa: islamofobia. 

Não é de hoje que a estratégia de muitos muçulmanos é chamar de "islamofobia" qualquer sinal de questionamento a suas crenças ou qualquer denúncia feita contra as [cruéis] violações praticadas contra os direitos básicos dos indivíduos, desde que realizadas em nome de Alá e de seu profeta. Fizeram isso quando tentaram minimizar o ataque terrorista à sede do semanário Charlie Hebdo. E não foi apenas nesse caso.

O absurdo dessa tentativa de silenciamento

O que eles não percebem é que isso equivale a tentar desviar a atenção de um flagrante estupro, alegando que acusar o criminoso é um mero ato de misandria.

Aos que possam ignorar o significado de misandria, trata-se do deprezo ou ódio ao que é masculino por si só.

Não é difícil entender a analogia. Esconder a hediondez do ato do estuprador recorrendo à misandria como cortina de fumaça é um absurdo inaceitável. Por si só, ele já desqualifica o indivíduo que se vale dele. 

Pois bem, quando alguém alega que uma justa e necessária denúncia de violação aos direitos humanos não passa de um ato de islamofobia, essa pessoa pode e deve ser imediatamente posta sob suspeição, tanto em relação à sua intencionalidade como em termos de sua estratégia de argumentação. 

Apesar de ter pensado nessas coisas e ter comentado algumas delas com o amigo que me marcara na postagem, decidi não perder meu tempo com o tal muçulmano autodeclarado mais "equilibrado" ou "progressista", que preferiu acusar o Brasil e o México de matarem mais homossexuais do que qualquer país islâmico, em vez de condenar a homofobia estatal praticada com o apoio do aparato jurídico nesses países muçulmanos

E não são poucos os países nos quais pessoas LGBT vivem em constante ameaça sob todos os pontos de vista. O cinturão islâmico vai do norte da África até o Oriente Médio, estendendo-se para o sul e para o norte da Ásia, uma vez que muitas ex-repúblicas soviéticas são majoritariamente muçulmanas e são governadas por extremistas como Razman Kadyrov, responsável pelo sobejamente conhecido "expurgo gay" (https://theintercept.com/2020/07/11/chechenia-exterminio-homossexuais/) denunciado pelos principais jornais do mundo.


Todos os países em verde são dominados pela religião islâmica e por governos islâmicos



Além de não se solidarizar incondicionalmente com os enforcados e atirados de prédios naquela postagem, o tal muçulmano "mais progressista" ignorou outros pontos quando tentou usar o mau exemplo das sociedades mexicana e brasileira para desviar a atenção do tema central da postagem. 

E por que digo isso? 

Porque se você for alvo de homofobia ou transofobia no Brasil ou no México, que são sociedades secularizadas e com vários direitos garantidos aos cidadãos LGBT por meio da lei ou da jurisprudência, você poderá recorrer à polícia e ao sistema jurídico contra os crimes motivados por esse tipo ódio - o que não acontece nos países islâmicos, onde os cidadãos LGBT, especialmente os homens gays, são presos imediatamente se forem a uma delegacia reportar qualquer violência sofrida por homofobia ou transfobia. 

Isso ocorre em países islâmicos porque as leis vigentes ali determinam que tais pessoas, se identificadas, sejam presas e castigadas. Não é preciso ser muito inteligente para ver a diferença; basta não ser um completo hipócrita.

Com a intenção de alertar o meu amigo, comentei os seguintes pontos em mensagem privada:
 
"Não espere de muçulmanos devotos ou de pessoas muito simpatizantes ao islamismo qualquer parceria contra o totalitarismo islâmico. Eles vão deixar de lado o papo sobre o totalitarismo e vão focar no que eles gostam de chamar de islamofobia, que é o jeito mais fácil de calar quem disser que o Islã tem homofobia, sim."

E acrescentei: "Eu condeno esses livros e todas as escrituras de tradição que eles têm como sendo fábulas perigosas sobre as quais se pode construir muito fascismo."

Faço um adendo: Estou me referindo ao islamismo aqui por ser este o tema da discussão, mas isso vale para o cristianismo e o judaísmo também. Aliás, todo e qualquer progressismo ou liberalismo nos três monoteísmos aí citados deve-se ao secularismo e ao humanismo secular, não aos profetas e/ou messias que tenham dado origem ou sido o tema dos escritos sagrados dessas religiões.

Dez países muçulmanos condenam pessoas homossexuais à pena de morte. São eles: 

1. Iêmen
2. Irã
3. Iraque
4. Arábia Saudita
5. Mauritânia
6. Qatar
7. Nigéria
8. Somália
9. Sudão
10. Emirados Árabes

Em todos esses países, a condenação à morte está nas próprias leis que regem cada uma dessas nações. Não se trata de terrorismo do Estado Islâmico como organização usurpadora de poder político. Trata-se de governos reconhecidos mundialmente. Aliás, sobre o Estado Islâmico, vale lembrar que eles executam gays sob os aplausos dos "piedosos" seguidores de Alá e de seu profeta em muitos dos locais onde conseguem entrar (vide BBC - https://www.bbc.com/portuguese/internacional-36516950).


E as comunidades inclusivas?

Que bom que já existem uns pouquíssimo ambientes onde gays não serão decapitados, mas acolhidos sem a imposição de "modificarem" sua sexualidade. Porém, é preciso dizer que as comunidades religiosas consideradas mais progressistas que suas equivalentes mais tradicionais não estão isentas de uma série de discursos e comportamentos alienados em diversos pontos. 

Elas podem promover mais inclusão? Sim. Todavia, isso não as libera do compromisso de denunciarem abertamente os crimes praticados tanto pelo profeta a quem honram como por seus sucessores. 

Na verdade, muitas vezes, essas comunidades ditas inclusivas servem mais ao propósito de tornar as aberrações doutrinárias e históricas do islamismo mais palatáveis ao mundo secularizado do que ao propósito de expurgar os fundamentos desse ódio todo e de abolir outros comportamentos castradores das liberdades individuais, beneficiando os próprios muçulmanos com uma reforma radicalmente libertária.

A vida nunca será melhor se for construída sobre a fantasia

A fantasia pode servir aos propósitos do lúdico, do divertimento, mas se alguém leva a fantasia a sério, como se ela retratasse a realidade, essa pessoa vai labutar no erro. E isso vai trazer problemas sérios mais cedo ou mais tarde. 

As pessoas que colocam a fé acima de tudo, especialmente quando ela abrange todos os aspectos da vida, como é o caso da fé islâmica, judaica e cristã, sejam elas "progressistas" ou não, dificilmente priorizarão o conhecimento verdadeiro sobre a crença, quando o conhecimento disputar com o que elas consideram como fundamental para a preservação de sua própria fé. E isso é muito perigoso.

Outra coisa que muitos muçulmanos interessados em transformar a história do islamismo em algo mais palatável costumam fazer é alegar leniência por parte de Maomé para com alguns homossexuais que ele teria encontrado pelo caminho, ignorando os incontáveis homens gays que foram mortos exatamente por causa dele e de seus parentes e amigos mais próximos.


Havia homens que amavam outros homens no tempo de Maomé?


Mas é claro que sempre existiram gays nos territórios dominados pelos homens de Maomé. Disso, não resta dúvida. Recomendo a leitura do artigo "A história gay secreta do Islã" (https://asiaticospeladiversidadeblog.wordpress.com/2019/05/16/a-historia-gay-secreta-do-isla/). Isso, porém, não significa que o Islã seja inclusivo por si só. Pelo contrário, se o profeta preferido dos muçulmanos tivesse enfatizado que os homens poderiam amar homens ou mulheres e que as mulheres também poderiam amar mulheres ou homens com os mesmo direitos garantidos, não haveria espaço algum para a homofobia demonstrada por muçulmanos, individualmente, ou nacionalmente. É justamente porque aconteceu o contrário que tais coisas são viáveis nesses círculos valendo-se dos textos que eles consideram sagrados.


A história gay secreta do Islã:
https://asiaticospeladiversidadeblog.wordpress.com/2019/05/16/a-historia-gay-secreta-do-isla/


Além disso, faço questão de ressaltar que apenas transar aqui e ali com alguém do mesmo sexo não chega nem perto do ideal de direitos iguais a que aspiramos atualmente. Homens que conseguem encontrar outros homens para sexo ou até mesmo romance existem e resistem até nas piores sociedades do mundo em termos de violações aos Direitos Humanos. Isso, porém, pode custar-lhes a vida. O que queremos vai muito além disso. Queremos a plena igualdade de direitos com todas as liberdades civis garantidas.


Marcado outra vez numa dessas publicações

Hoje, fui marcado novamente numa dessas publicações, mas não pelo amigo que me marcara antes. Agora, trata-se de um homem gay e muçulmano muito engajado na defesa das crenças islâmicas. Transcrevo aqui a minha resposta, apenas poupando o nome de quem me marcou. 

O texto no qual ele me marcou foi escrito por alguém que procurava defender o "histórico de leniência" do fundador do Islã - o ilustre profeta Maomé. 

Minha resposta foi a seguinte:

Eu conheço a história de muitas culturas que eram amplamente tolerantes aos homossexuais antes de serem  influenciadas pelo islamismo, especialmente no norte da África. Porém, ressalto que qualquer liberdade sexual ali jamais se deveu ao islamismo em si. 

[Adendo: Ser tolerante não significa ser justo e igualitário. A ideia de tolerância pressupõe a ideia de que algo não é bom o suficiente para ser totalmente incluído, mas também não é ruim o suficiente para ser definitivamente extirpado. Tolerância não é suficiente.]

Na realidade, os homossexuais desfrutavam de muita liberdade para aquela época em várias dessas culturas antes das invasões maometanas, só passando a serem perseguidos por ordem dos líderes muçulmanos e de seus títeres.

Esse texto [no qual ele me marcara] sub-repticiamente tolera homofobia por parte do texto sagrado dos muçulmanos e de seu profeta em muitos sentidos. Alguns muçulmanos poderiam até achar que, nós gays, deveríamos ser gratos a Maomé lendo esse texto. Porém, a própria ideia de que Maomé decidia quem viveria e quem morreria já é um absurdo totalmente ridículo. E o que mais me espanta é o fato de muitos muçulmanos ficarem recorrendo a essas ideias de "leniência" por parte desses assassinos "sacralizados", em vez de combaterem frontalmente governos genocidas apoiados por líderes muçulmanos, mesquitas e pessoas comuns com ideias perigosamente incendiárias com relação aos seus concidadãos LGBT. 

Fico especialmente irritado quando muçulmanos gays defendem, de alguma maneira, esses bandidos homofóbicos como se tais criminosos possuíssem alguma luz que os dignificasse. 

Quando gays fazem isso em defesa de seus algozes, vejo um caso nítido da "síndrome de Estocolmo" - aquela que é caracterizada por uma relação de solidariedade entre o sequestrado e seus sequestradores. 

Nenhum homossexual, em qualquer lugar do mundo, teria o menor direito se o planeta fosse dominado pelo Islã. O texto escrito pelo tal muçulmano "progressista" presta um desserviço à história. Se, por um lado, devemos resgatar as histórias de amor entre homens e entre mulheres LGBT, por outro, precisamos preservar o REGISTRO HISTÓRICO DA PERSEGUIÇÃO ÀS LIBERDADES E DIREITOS SEXUAIS DAS PESSOAS LGBT por Maomé e seus sucessores. 

Além disso, se eu não tenho o menor apreço pelo cristianismo e suas lideranças [apesar de serem muito mais secularizados hoje do que o bloco islâmico], o que faz alguém pensar que eu vou ter o mínimo de tolerância com culturas e sistemas religiosos, políticos ou econômicos, baseados nessa visão ridiculamente primitiva do suposto profeta árabe e de seus seguidores?  

A própria ideia de submissão que já está na raiz da palavra Islã é uma contradição a tudo que eu defendo como liberdade e autonomia individuais.  





É justo reconhecer o direito de um muçulmano viver "livremente" a sua homossexualidade, apesar da sua religião, ou tentando harmonizar as duas.  E, diga-se de passagem, é o que eu faço quando eu vejo um cristão realizando a mesma compatibilização em relação a suas crenças e sua sexualidade. Isso, porém,  não significa que eu tenha o menor apreço pelo islamismo ou pelo cristianismo. Também não acho que este gay será tão pleno quanto ele seria se abandonasse tanto uma como outra religião.

Aliás, essa harmonização que permite que se tenha até mesmo vida pública assumida por um indivíduo gay e muçulmano ao mesmo tempo só é possível em países secularizados, ou seja aqueles cujos sistemas jurídico-político-econômicos encontram-se livres das garras do islamismo como tal.

Espero que eu tenha conseguido me fazer entender claramente nesse assunto, porque não vou entrar nesse joguinho de quem mata mais ou qual das duas religiões é a pior. Para mim, nenhuma das duas presta. Contudo, quem domina blocos inteiros no mundo, quase uniformemente e com tanta letalidade, é o islamismo. E isso não pode continuar a ser tolerado em nome de algum tipo de fábula antiga a respeito de Maomé ou de Alá.

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O meu comentário foi até aí. Postei hoje (03/04/21) por volta das 9:30 da manhã. Porém, ao procurar a postagem agora, às 17:22, não a encontrei mais. 

Provavelmente, o muçulmano muito 'resolvido' que escreveu o post ao qual me referi no comentário acima, ou o outro que me marcou, optou pelo meu silenciamento.  Na realidade, eles não resistem a uma discussão que não parta do princípio de que o Islã seja uma revelação divina e não uma construção humana que já custou e continua custando muito sangue humano.

De qualquer modo, eu já tinha copiado o texto do meu comentário para fazer essa postagem, só por via das dúvidas. E, para deixar claro de uma vez, repito que nenhuma divindade, texto, tradição ou ritual JAMAIS se colocará acima dos direitos individuais fundamentais de cada ser humano na minha estrutura de pensamento ou modus operandi.

O direito à crença ou à não-crença deve ser preservado, mas NENHUMA violência pode ser aceita com base no direito à liberdade de consciência. A vida e as liberdades que permitem sua preservação e autorrealização sempre virão em primeiro lugar.

Autoridades sauditas querem pena de morte para quem sair do armário

Um relatório publicado indica qu epessoas que saírem do armário na Arábia Saudia poderiam enfrentar pena de morte. 


Traduzido por Sergio Viula para o Blog Fora do Armário





Oraz, um jornal saudita, reportou no sábado passado que procuradores da cidade de Jiddah propuseram nova lei com pena de morte em resposta a dezenas de casos que eles processaram nos últimos seis meses. Estes incluem 35 pessoas que receberam sentenças de aprisionamento por sodomia.
 
Okaz reportou que as autoridades de Jiddah processaram 50 casos em que homens supostamente se vestiram como mulheres. Um médico que mora na cidade portuária no Mar Vermelho foi solto depois de pagar fiança por ter sido preso sob a acusação de ter hasteado uma bandeira do Orgulho LGBT sobre sua casa.

Um homem gay saudita que mora fora do reino disse ao Washington Blade na segunda-feira, durante uma entrevista telefônica, que as penalidades reforçadas que os procuradores de Jiddah propuseram se aplicariam ao país inteiro. O homem, que administra uma conta no Twitter que publica notícias especificamente relacionadas a LGBT, bem como outras informações sobre a Arábia Saudita, disse que a proposta desencadeou medo entre as pessoas LGBT do país.

Chanan Weissman, um porta-voz do Escritório de Democracia do Departamento de Estado, Direitos Humanos e Trabalho (State Department’s Bureau of Democracy, Human Rights and Labor), disse ao Blade na terça que os Estados Unidos estão "cientes dessas denúncias, mas não podem verificar sua exatidão."

“Continuamos a reunir mais informações" - disse ele.

Usuários de mídias sociais na Arábia Saudita e em toda parte começaram a usar a hashtag "Você não me aterrorizará. Eu sou gay" no Twitter para expressar sua oposição à pena proposta.

A Arábia Saudita está entre os países nos quais sexo consensual entre pessoas do mesmo sexo continua punível com a pena de morte. Agora, essas denúncias indicam que eles querem estender essa pena para o simples ato de se assumir LGBT online.

O texto de Michael K. Lavers sobre esse assunto é mais extenso do que essa introdução. 

Veja mais aqui:
https://www.washingtonblade.com/2016/03/28/report-saudi-authorities-seek-death-penalty-for-coming-out/


Círculo do Michael K Lavers

Michael K. Lavers tem trabalho como parte da equipe de escritores para o Washington Blade desde maio de 2012. Entre as histórias que ele cobriu, estão a aprovação da lei de casamento entre pessoas do mesmo sexo em Maryland, a epidemia de HIV/AIDS, o crescimento do movimento LGBT na América Latina e a consagração do Bispo de New Hampshire, o primeiro homossexual assumido, V. Gene Robinson.


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UM TEXTO MEU SOBRE ESSE TEMA


Islamismo, intolerância e a resistência dos muçulmanos LGBT



Islamismo, intolerância e a resistência dos muçulmanos LGBT
Por Sergio Viula
11/01/2015 
 
Muçulmanos LGBT nos EUA em passeata pelos direitos LGBT

 
Domingo passado, publiquei aqui um texto, intitulado “O que a xenofobia judaica tem a ver com a homofobia dos três monoteísmos”. Não é preciso pensar muito para se perceber que o cristianismo e o islamismo importaram da Torá muitos de seus princípios, doutrinas e mandamentos.
 
No texto da coluna de hoje, gostaria de pensar brevemente sobre o que há a respeito das relações entre pessoas do mesmo sexo no livro sagrado dos muçulmanos o Alcorão, também chamado de Corão.
 
Destaco aqui a menção feita, na 7ª Surata, ao profeta Ló – ou Lot como eles grafam no Corão:
 
E (enviamos) Lot,(505) que disse ao seu povo: Cometeis abominação como ninguém no mundo jamais cometeu antes de vós, acercando-vos licenciosamente dos homens, em vez das mulheres. Realmente, sois um povo transgressor.
 
E a resposta do seu povo só constituiu em dizer (uns aos outros): Expulsai-vos da vossa cidade porque são pessoas que desejam ser puras(506).
 
Porém, salvamo-los, juntamente com a sua família, exceto a sua mulher, que se contou entre os que foram deixados para trás.(507)
 
E desencadeamos sobre eles uma tempestade.(508) Repara, pois, qual foi o destino dos pecadores!
 
Apesar dessa passagem e mais umas poucas que abordam as relações entre homens, não se pode dizer que o Corão tenha regras realmente aplicáveis a questões contemporâneas que nada tem a ver com promiscuidade sexual, tais como: casamento igualitário e demais direitos civis dos cidadãos gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros. 

Por isso, as nações que adotam o islamismo como religião oficial ou que tem maioria populacional muçulmana agem de modos diferentes para com as pessoas LGBT: há países que punem com a pena de morte qualquer pessoa encontrada em ato sexual com alguém do mesmo sexo e há países que aplicam penas mais brandas, como prisão.
 
É preciso esclarecer que a homossexualidade e a transexualidade nem sempre são tratadas do mesmo modo. Explico:
 
No Irã, homossexuais são enforcados, inclusive adolescentes. Porém, se o indivíduo for transexual e fizer a operação de adequação genital, não será perseguido. Isso porque tal pessoa será absorvida pela cultura do binarismo de gênero que os líderes islâmicos geralmente enfatizam e fazem questão de preservar.
 
A má notícia é que há registro de homens gays que se submeteram à transexualização para escaparem à perseguição para logo depois caírem em depressão, porque nunca foram mulheres transexuais, mas homens gays cuja identificação com o gênero masculino foi profunda e irreversivelmente violada.
 
Vale lembrar que essa brecha para a aceitação das pessoas transexuais não existe invariavelmente em todos os países muçulmanos. E há um estranho silêncio sobre homens transexuais, ou seja, aqueles que nasceram com genitália feminina e assumem o gênero masculino. Levando em consideração que a adequação genital de vagina para pênis não corresponde tão perfeitamente quanto seu inverso, é bem provável que os homens transexuais não desfrutem do mesmo beneficio que as mulheres transexuais – aquelas que nasceram com genitália masculina e exibem identidade feminina.
 
Enquanto a sanguinária perseguição contra pessoas LGBT em diversos países islâmicos continua sendo patrocinada pelo Estado ou propositadamente ignorada por ele, um filme fez enorme sucesso no Ocidente. Seu nome é A Jihad for Love. Trata-se de um documentário com depoimentos de pessoas muçulmanas que são LGBT. Elas falam de seus dramas, aspirações e vivências. A revista A Capa fez matéria sobre isso.
 
A rede jornalística Al Jazeera publicou notícia sobre um Imã assumidamente gay no Canadá. Obviamente, ele só pôde se assumir e permanecer em liberdade (para não dizer vivo), graças à democracia canadense e à laicidade daquele Estado. Transcrevo um trecho traduzido por mim aqui, mas a matéria pode ser encontrada no site da Al Jazeera.
 
Ele tem sido condenado por outros líderes muçulmanos, e alguns imãs locais têm se recusado a cumprimenta-lo. Mas o Imã Daayiee Abdullah – que se crê ser o único imã assumidamente gay das Américas – orgulha-se de sua história.
 
Ele nasceu e cresceu em Detroit, onde seus pais eram batistas [da Convenção Batista] do Sul. Aos 15 anos, ele assumiu-se para eles. Aos 33, enquanto estudava na China, Abdullah se converteu ao Islã, e foi estudar religião no Egito, na Jordânia e na Síria. Mas como homem gay na América, ele viu muçulmanos gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros terem suas necessidades espirituais negligenciadas e se tornou o primeiro imã a oferecer apoio comunitário.
 
Por aí, já se vê que o número de pessoas LGBT entre muçulmanos não é diferente do número encontrado em outros grupos religiosos e não religiosos. Na verdade, levando-se em conta a naturalidade da homossexualidade, da bissexualidade e da transgeneridade, é de se esperar que essas pessoas sejam encontradas em quaisquer grupos humanos. Agora, o modo como cada grupo lida com essa diversidade é que pode ser produtivo ou destrutivo. Se o grupo produz e reproduz homofobia, bifobia e transfobia, então haverá sofrimento, mas se essas características humanas forem encaradas com a naturalidade que já trazem em si mesmas, então não haverá conflito quanto ao que se é, como se ama, e como se vive.

A grande questão que salta aos olhos das pessoas ateias, agnósticas e céticas é:
 
Para que ser religioso e querer participar de uma comunidade de fé que, além de todos absurdos do ponto de vista epistemológico, ético e existencial, ainda acumula e cultiva preconceitos contra homoafetivos, biafetivos e transgêneros?
 
A pergunta parece até retórica, mas não é tão simples assim. As pessoas não são religiosas porque são heterossexuais e nem deixam de o ser porque são lésbicas, gays, bissexuais ou transexuais.
 
Uma coisa, porém, é certa: o número de pessoas secularizadas em locais que são maciçamente religiosos vai crescendo discretamente. E entre elas também existem aquelas que, sendo LGBT, ousaram pensar livremente, chegando à conclusão de que religião, qualquer que seja ela, não é mais verdadeira que qualquer mito rebaixado à posição de mera produção cultural – o que não deixa de conferir-lhe algum valor, obviamente, mas longe de ser o de verdade absoluta.
 
Parece-me que a melhor maneira de se combater o fanatismo violento é promovendo o esclarecimento da população com foco nos direitos humanos e no pensamento secularista humanista, porque suas premissas dão espaço para a convivência pacífica de todos, sem adotar qualquer crença religiosa como verdade final.
 
Aliás, é esse conceito de verdade como revelação divina, que não pode ser questionada, que mobiliza tanta gente para atos de violência como o que vimos na última quarta-feira, quando extremistas islâmicos mataram Charlie Hebdo e outras 11 pessoas na França. Não nos dobremos de modo algum, mas também não percamos a clareza do pensamento racional, acompanhado daquela terna firmeza que caracteriza as pessoas serenas e donas de si, porque de fanáticos, bastam os extremistas religiosos.

Sobre o cartoon do Charlie Hebdo com o menino sírio - por Sergio Viula




Atualizando o caso:

Um desenho no jornal satírico Charlie Hebdo sugerindo que Alan Kurdi, o garoto sírio de três anos de idade, encontrado morto numa praia turca no ano passado, cresceria para ser um assediador sexual causou raiva nas redes sociais na quinta-feira, 14/01/16, informa a agência Reuters.

O cartoon descreve dois homens correndo atrás de uma mulher apavorada com a seguinte legenda: "O que teria sido do jovem Alan se ele tivesse crescido? Um apalpador de corpos na Alemanha."

Ataques sexuais contra mulheres na cidade de Colônia e em outras cidades alemãs na véspera de ano novo, muitos deles atribuídos a imigrantes, geraram mais de 600 queixas criminais e causaram constrangimentos às políticas sobre refugiados da chanceler da Alemanha, Angela Merkel. Mais de um milhão entraram na Alemanha no ano passado, mais do que em qualquer outro país da Europa. (grifo meu)

O cartoon foi publicado uma semana depois do aniversário dos ataques aos escritórios do Charlie Hebdo em Paris, que mataram 12 pessoas em janeiro de 2015. A fase "Je suis Charlie" ("Eu sou Charlie"), foi amplamente adotada por apoiadores online.

Desta vez, muitas pessoas nas mídias sociais disseram que o cartoon foi ofensivo, enquanto outras argumentaram que Charlie Hebdo estava mantendo seu tom usualmente provocativo para provocar debates sobre as atitudes dos europeus para com a crise migratória.

A imagem de Alan deitado de bruços numa praia turca em setembro passado correu o mundo e provocou uma onda de solidariedade para com o clamor dos refugiados que escavam da guerra e da pobreza no Oriente Médio e na África.
Fonte:  Agência Reuters: http://www.reuters.com/article/us-france-cartoon-idUSKCN0US2WJ20160114
 
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COMENTÁRIO DESTE BLOGUEIRO


Há muitas questões envolvidas aqui. De saída, quero deixar claro que não pretendo esgotá-las. Gostaria, porém, de destacar alguns pontos:
 
1. Na minha opinião, o cartoon foi de mau gosto, porque atribui aos imigrantes, de modo geral, uma destino irrevogável. A partir de uma espécie de profecia na base do faz-de-conta, o jornal faz diversas assunções a respeito dos homens muçulmanos. Entre elas, a seguinte: 

Se o menino vivesse, ele teria um só destino: ser homem heterossexual assediador de mulheres como muitos dos seus pares muçulmanos que, por décadas, foram doutrinados no pensamento de que toda mulher ocidental é puta e que as putas não merecem respeito - dois equívocos que fazem parte do senso comum entre os seguidores de Maomé. As mulheres ocidentais, que eles consideram poder apalpar e assediar com cantadas horrorosas, seriam facilmente estupradas ou apedrejadas em muitos países dominados pela mentalidade islâmica. Isso é fato. Mas, daí a dizer que o menino seria inevitavelmente assim e sugerir que talvez essa morte evitasse que a sociedade tivesse mais um desses imbecis, vai um abismo enorme. 

Só para provocar reflexão: 

E se o menino fosse gay e crescesse para se apaixonar por outro homem? Nesse caso, talvez sua própria comunidade quisesse exterminá-lo como já aconteceu em abrigos para imigrantes, onde homens gays correram graves riscos de vida, sendo preservados por ação governamental. Mas nem mesmo isso poderia ser tomado por garantido. Fica só a sugestão.
 
2. O menino se afogou em consequência de conflitos com os quais ele nunca contribuiu, porque nem sequer teve tempo para assumir posicionamentos a respeito deles. Foi mais uma vítima das inúmeras formas de violência que seguem acontecendo no mundo. Ele não foi a única criança morta. Muitas morreram em condições semelhantes, mas ele tornou-se uma espécie de representante de todos esses seres humanos indefesos e injustiçados, que mal sabem falar sua própria língua e morrem sem qualquer possibilidade de autodefesa. Por isso, considero ofensivo fazerem tais conexões entre essa criança injustiçada e os abusadores muçulmanos que assediaram essas mais de 600 mulheres somente nos festejos de ano novo. O debate poderia ter sido provocado de outros modos, mesmo que absolutamente satíricos, mas isso não justifica qualquer forma de violência e não devíamos insuflá-la. Já existem loucos demais por aí querendo apenas um motivo para explodirem seus corpos e arrastarem uma multidão com eles.
 
3. Apesar do mal gosto do cartoon, isso não muda o absurdo dos ataques terroristas. Aquele episódio de destruição fundamentalista contra os cartunistas do Charlie Hebdo continua sendo emblemático do que significa o barbarismo do fanatismo religioso - esse mesmo que continua com os dois pés fincados no quinto século d.C., praticamente sem modificação desde então. Em alguns aspectos, esse fanatismo é capaz de coisas ainda piores hoje, porque se Maomé atacava com cavalos, camelos e espadas naquele tempo, hoje seus seguidores mais extremistas atacam com aviões, carros bomba e armas de fogo de longo alcance, grosso calibre e autonomia para dezenas de tiros sem troca de cartucho.

4. Não posso falar por todos os que adotaram o "Eu sou Charlie". Não sei o que se passava pela cabeça de cada um, mas posso falar por mim mesmo. E a quem quiser levar em conta o que penso, meu mais sincero "obrigado". A quem preferir nem considerar o que tenho a dizer, espero que esteja de posse de todos os ângulos dessa situação para realmente não precisar sequer ouvir outras vozes. Muito bem, eu fui um dos que adotaram o slogan solidário "Eu sou Charlie" no Facebook. Mas o que é que eu queria dizer com isso. afinal de contas?

A) Primeiro, que sou contra todo tipo de violência;

B) Segundo que sou a favor da liberdade de expressão e de imprensa, inclusive para os satíricos;

C) Terceiro, que quando houver abuso dessa liberdade ou de quaisquer outras, não se pode suprimi-las ou reagir a elas com violência. Nada justifica o terrorismo e outras formas menos dramáticas de violência. A mesma democracia que provê os meios para o exercício das liberdades civis também provê os meios para exigir reparação por qualquer dano a terceiros. Além disso, existe a possibilidade de boicote e de debate. Não há qualquer justificativa para atos de violência contra pessoas ou instituições pelo uso de suas liberdades, mas há recursos poderosos e eficientes garantidos pelas instituições democrático-republicanas. Aprendamos a utilizá-los;
 

D) Minha solidariedade e empatia para com o Charlie Hebdo no momento do atentado terrorista tinha o propósito de chamar atenção para o seguintes binarismos conflitantes e autoexcludentes. Claro que abraço os primeiros e rejeito os segundos em cada uma das contraposições abaixo:

D1) Liberdade de expressão VERSUS controle religioso e/ou estatal das expressões de pensamento pelas mais diversas vias e com os mais diversos conteúdos;

D2) Valorização do ser humano acima de qualquer dogma VERSUS a absolutização 
do dogma, inclusive ao custo de vidas humanas; 

D3) Direitos humanos são inegociáveis VERSUS a sacralidade de certas ideias não pode ser sequer questionada, mesmo que estas sejam a base para a manutenção de muitas estruturas iníquas e violadoras de direitos humanos básicos.

5. O fato de me solidarizar com o Charlie Hebdo naquele momento não era um cheque em branco. Não significava que tudo e qualquer coisa que eles fizessem dali em diante contaria incondicionalmente com meu apoio nem mesmo que eu tivesse apoiado tudo o que eles haviam feito/dito antes. Minha solidariedade devia-se essencialmente ao fato de que o ataque ao Charlie Hebdo por fundamentalistas islâmicos era tão execrável quanto o ataque de extremistas da mesma estirpe contra a imagem de Buda no Afeganistão, que, graças aos cientistas, poderão ser recuperadas. O mesmo posso dizer do ataque contra o Museu do Cairo, quando extremistas muçulmanos decapitaram cerca de 30 múmias e danificaram objetos que haviam pertencido a Tutankhamon. Semana passada, vários homens-bomba atacaram uma área comercial de Bangladesh frequentada por estrangeiros, fazendo com que o governo agora caçasse cerca de 2.000 homens-bomba em potencial no país. 

Todos esses ataques são tão execráveis quanto o ataque ao Charlie Hebdo, salvaguardadas as diferenças entre o ataque a um patrimônio cultural e o massacre de seres humanos, mas é justamente contra a lógica que promove tudo isso que o jornal satírico se coloca de modo tão contundente e, muitas vezes, até inapropriado, como no caso da charge do menino sírio afogado e os apalpadores de mulheres. 

Eu poderia continuar citando vários casos que ilustram o barbarismo desses extremistas muçulmanos movidos pela lógica do "nós contra todo mundo até a decapitação do último herege".

6. Muitos imigrantes querem se integrar à Europa e desfrutar da atmosfera de liberdade que indubitavelmente é maior ali, pelo menos para o cidadão europeu de nascimento. Mas mesmo sendo estrangeiros e estando submetidos a vários constrangimentos, aparentemente haverá mais possibilidades para eles ali do que em seus países de origem, nos quais, mesmo sendo cidadãos por nascimento, não gozavam de qualquer possibilidade de divergir sem serem presos, torturados ou mortos. No entanto, existem imigrantes querendo criar "ilhas de fanatismo religioso" nos países para onde migraram. De acordo com a lógica desses 'espaços sociais criados à revelia' dos costumes locais, as mulheres continuam sendo objetos a serem utilizados e trocados em negociações entre os patriarcas de suas famílias, homossexuais continuam correndo risco de morte por serem gays, dissidentes do islamismo continuam sendo considerados blasfemos e punidos com rigor, e possíveis ateus são execrados como sendo a própria encarnação de satanás. Ironicamente, um casal gay alemão abrigou 24 imigrantes e tem encorajado outras pessoas a fazerem o mesmo. Fonte: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/11/06/sociedad/1446796125_710981.html

Não podemos fechar os olhos a isso por causa do mau gosto do Charlie Hebdo. Não podemos dizer que o mau gosto do cartoon feito sobre o menino encontrado morto na praia da Turquia inverta tudo instantânea e acriticamente. Não mesmo.

Não aprovo o cartoon, mas não retiro meu apoio à liberdade de expressão, seja na pena e no papel do Charlie, seja na fala ou na escrita de qualquer outro. Isso não significa que não devamos confrontar esse tipo de produção duvidosa, mas isso tem que ser feito por outros meios que não o da violência.

Ao mesmo tempo que me solidarizo com a família desse menino nesse ponto, fico me perguntando por que esses mesmos muçulmanos não denunciam outras violências contra essas crianças, principalmente a violência doméstica, que é insuportável para qualquer padrão racional. Uma coisa não anula a outra, mas o silenciamento de qualquer uma delas é tendencioso, é hipócrita, e, humanisticamente falando, míope. É má-fé.

Encerrando, porque já me alonguei demais, digo apenas o seguinte:

A Europa tem que deixar de ser xenofóbica sem se tornar condescendente com aquilo que em qualquer cultura seja uma violação dos direitos humanos -- venha de seus próprios cidadãos ou de cidadãos de outras partes do mundo, seja em seu território ou em território alheio. E se os muçulmanos conseguirem conjugar suas crenças com as liberdades do secularismo e do humanismo que a Europa procura (e nem sempre consegue com perfeição) viabilizar, eles viverão em condições muito mais humanas e produtivas do que tudo o que seus governos fundamentalistas lhes ofereceram.

Não tenho a menor vontade de deixar o Brasil, apesar de todos os seus problemas, mas se eu tivesse que enfrentar algo semelhante ao que esses sírios enfrentaram em sua terra, eu adoraria ser recebido com dignidade na terra que eu escolhesse como refúgio. MAS -- um mas bem gigante -- eu teria que me adequar às regras do local, mesmo que, depois de adaptado, buscasse linhas de fuga das opressões que pudesse enfrentar ali. O que eu não poderia fazer era exigir que alemães, franceses, ingleses, etc. agissem como brasileiros só para que eu me sentisse melhor no lugar que me abrigou. Eu provavelmente teria que me tornar mais alemão, francês ou inglês, mesmo sem esquecer quem sou e de onde vim. Foi isso o que os imigrantes que vieram para o Brasil -- mesmo mantendo suas tradições -- fizeram. E quem viola os códigos locais responderá por isso, querendo ou não. 

Então, ao mesmo tempo que se respeita as liberdades desses imigrantes muçulmanos, espera-se que eles também incorporem os códigos de conduta locais e respeitem as diferenças com as quais eles provavelmente não estão acostumados. Do mesmo modo, a sociedade europeia e suas instituições devem evitar colocar mais pressão sobre quem já está tão oprimido.

Parece-me que essa era a provocação do Charlie Hebdo: Recebemos os imigrantes, mas como evitar que eles transformem a terra que os recebeu em algo parecido com aquela de onde fugiram? A escolha pelo menino sírio em conexão com os abusadores parece ter sido vista por eles como uma forma incontornável de chamar atenção para isso. De novo, o menino e sua família não necessariamente estavam conectados a esse estado de coisas só por serem imigrantes sírios.

De qualquer modo, LEMBREM-SE que Rivellino, o craque brasileiro que foi trabalhar no Qatar, teve que fugir do país depois de rejeitar a proposta do príncipe, que estava disposto a pagar quanto fosse por uma noite de amor com sua esposa (essa é a lógica de muitos desses muçulmanos vivendo na Europa - não todos, mas o suficiente para que mais de 600 mulheres na minúscula cidade de Colônia registrassem queixa na polícia (em pleno réveillon) contra assediadores, apalpadores de corpos ou de bundas, como queiram. Vale ressalvar aqui que a cidade de Colônia não é tão pequena assim, como bem disse meu amigo e querido leitor Tio Enilson. Mas, o que eu tenho em mente é uma comparação entre essa cidade de um milhão de habitantes e a minha (Rio de Janeiro). Claro que apenas uma parcela da população se reúne naquela praça - o que torna o número de ataques às mulheres ainda mais expressivo. O réveillon do Rio, por exemplo, reúne numa única praia -- sem contar os outros pontos de festejo espalhados pela cidade -- o equivalente a duas cidades inteiras de Colônia. E mesmo assim, nunca testemunhou nada parecido com isso.

Roberto Rivellino - ídolo dos anos 60
Veja o caso de Rivelino aqui no site da Fox Sports. Apesar do tom humorístico da matéria, a situação não foi nada engraçada ou inofensiva. Ele poderia ter sido preso e a mulher dele poderia ter sido tomada à força, mas ele teve a sorte de ser ajudado por amigos e alguns sheiks em sua fuga do país: http://www.foxsports.com.br/videos/157468739755-causo-rivellino-acerta-bolada-em-principe-que-queria-sua-esposa

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