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O que é isso?


O que é isso que machuca e dá prazer? O que é isso que torna alguém absolutamente indispensável de uma hora para outra? De repente, um exemplar da raça humana torna-se o mais deslumbrante, o mais atraente, o mais divertido, o mais belo, o único que realmente interessa... O que é isso que, ao tocar-nos, faz-nos ver tudo por um prisma totalmente novo?

O que chamamos de amor já rendeu muitas reflexões ao longo da história; já ocupou algumas das mentes mais brilhantes que se desenvolveram neste planeta.

Em O Banquete, Platão descreve um dos diálogos de Sócrates. Desta vez, tratava-se do Amor (Eros). Os pensadores sucederam-se em explicações sobre o Amor. Aristófanes, o quarto a discursar, adverte que os homens são insensíveis para com o poder miraculoso de Eros. Para conhecer esse poder, ele diz que é preciso antes conhecer a história da natureza humana e, dito isto, passa a narrar o mito da nossa unidade primitiva e posterior mutilação.

Segundo Aristófanes, havia inicialmente três gêneros de seres humanos, que eram duplos de si mesmos: havia o gênero masculino-masculino, o feminino-feminino e o masculino-feminino, o qual era chamado de andrógino. Nas palavras do poeta, a situação teria sido a seguinte:

"É então de há tanto tempo que o amor de um pelo outro está implantado nos homens, restaurador da nossa antiga natureza, em sua tentativa de fazer um só de dois e de curar a natureza humana. Cada um de nós, portanto, é uma téssera complementar de um homem, porque cortado com os linguados, de um só em dois; e procura cada um o seu próprio complemento."

 


Assim, aqueles que foram um corte do andrógino, sejam homens ou mulheres, procuram o seu contrário. Isso explica o amor heterossexual. E aquelas que foram o corte da mulher, o mesmo ocorrendo com aqueles que são o corte do homem, procurarão unir-se ao seu igual. Aqui, Platão apresenta uma explicação para o amor homossexual feminino e masculino.

Quando essas metades se encontram, sentem as mais extraordinárias sensações, intimidade e amor, a ponto de não quererem mais se separar, e sentem vontade de se “fundirem” novamente em um só. Esse é o nosso desejo ao encontrarmos a nossa cara-metade.

Esse conceito de cara-metade, portanto, é antigo. Vem do século V antes de Cristo!



Descartes (1596–1650) fez a seguinte exposição sobre três formas de amor:

"Parece-me que podemos, com maior razão, distinguir o amor em função da estima que temos pelo que amamos, em comparação com nós mesmos. Pois, quando estimamos o objeto do nosso amor menos que a nós mesmos, temos por ele apenas uma simples afeição; quando o estimamos tanto quanto a nós mesmos, a isso se chama amizade; e, quando o estimamos mais, a paixão que temos pode ser denominada como devoção. (...) Ora, a diferença que há entre esses três tipos de amor manifesta-se principalmente pelos seus efeitos; pois, como em todos [os tipos de amor] nos consideramos juntos e unidos à coisa amada, estamos sempre dispostos a abandonar a menor parte do todo que compomos com ela, para conservar a outra.

Isto leva-nos, na simples afeição, a sempre nos preferirmos ao que amamos; e, na devoção, ao contrário, a preferirmos a coisa amada e não a nós mesmos, de tal forma que não hesitamos em morrer para a conservar."
(René Descartes, em As Paixões da Alma)

Nietzsche vê no amor o desejo de posse. Ele diz claramente:

"Mas é o amor de sexo para sexo que se revela mais nitidamente como um desejo de posse: aquele que ama quer ser possuidor exclusivo da pessoa que deseja, quer ter um poder absoluto tanto sobre a sua alma como sobre o seu corpo, quer ser amado unicamente, instalar-se e reinar na outra alma como o mais alto e o mais desejável."
(A Gaia Ciência)

Por isso mesmo, o amor também demanda disciplina. Mas como disciplinar esse “diabinho” chamado Eros? Se deixarmos, o amor pode até “sufocar” o amado exatamente por causa desse desejo de posse. E, paradoxalmente, se esse desejo toma o controle mesmo, acaba enfraquecendo o próprio amor.

Bertrand Russell, por sua vez, pensa no amor a partir da entrega, em vez da posse. Ele diz que a felicidade parece ser incompatível com a cautela em amar ou com o temor de amar. Amar é entregar-se ao amado:

“De todas as cautelas, a cautela no amor é talvez a forma mais fatal para a felicidade verdadeira.”

“Temer o amor é temer a vida, e os que temem a vida já estão meio mortos.”

Assim como Bertrand Russell, Espinosa relaciona a felicidade ao objeto do nosso amor, mas ele introduz o conceito de qualidade desse objeto. Que tipo de pessoa ou coisa amamos? Dependendo da qualidade do objeto do amor, podemos ser felizes ou infelizes:

“Toda a felicidade ou infelicidade consiste somente numa coisa, a saber, na qualidade do objeto ao qual aderimos pelo amor.”

Foucault, discorrendo com Schroeter sobre amor e paixão a partir do filme produzido por este, A Morte de Maria Malibran, ouviu a seguinte pergunta: "Você pode me falar de sua paixão?"

Foucault respondeu:

“Vivo há dezoito anos em um estado de paixão por alguém. Talvez em um dado momento esta paixão tenha tomado a forma de amor. Na verdade, trata-se de um estado de paixão entre nós dois, de um estado permanente que não tem outras finalidades que não ele mesmo e pelo qual sou investido completamente, que me atravessa. Creio que não há uma só coisa no mundo, nada, o que quer que seja, que me pararia quando se trata de ir reencontrá-lo, falar com ele.”
(13 de dezembro de 1981)

Eu já amei de muitas maneiras diferentes, intensidades diferentes, pessoas diferentes. Entretanto, encontro-me hoje numa relação de amor diferente de todas as outras – o que não desmerece nenhuma delas. Atualmente, sinto-me tão conectado a quem amo que me assusto com a intensidade desse sentimento e a dimensão desse relacionamento.

Isso fica mais nítido à medida que sinto saudade dele. É deslumbrante que eu seja capaz de um sentimento assim, e que ele seja capaz de despertá-lo em mim. Por outro lado, é assustador que esse sentimento seja capaz de tomar conta de mim de tal forma que até mesmo uma simples decisão do dia a dia passe pelo crivo do “é compatível com o que queremos para nós dois?”, em vez do anterior “o que é que me interessa?”

Quando a gente ama, tudo passa a ser visto sob o prisma desse amor. Hoje fiquei sozinho num momento em que eu queria desesperadamente estar com ele. Fui parar num barzinho, onde pedi uma porção de alcatra ao molho madeira e tomei três cuba libres, um após o outro. Como não sou de beber, fiquei logo “altinho”. A bebida, mesmo mentirosa, ajudou-me a baixar a bola do meu Super-Ego e deixar o meu Id mais à vontade. Só que, em vez de começar a dar boa noite até para manequim de vitrine, comecei a escrever. Vi casais e amigos juntos e senti ainda mais falta do meu amor perto de mim. Para falar a verdade, escrevi este post na mesa do bar:

Por que é que a vida tem que ser assim?
Por que é que temos que sofrer a falta que a distância, sem a menor cerimônia, gera e alimenta às custas de nossa própria energia psíquica?
Por que é que o trabalho, que deveria financiar os sonhos, patrocina os pesadelos?

Meu amor está longe por causa do trabalho. Eu estou mergulhado em saudade por causa do “nobre” ofício. Se ele estivesse aqui, eu estaria em casa fazendo amor, conversando, vendo TV – não num bar tentando esquecer a distância que nutre a saudade.

Do lado de lá, ele sofre a mesma coisa. Já me ligou umas quatro ou cinco vezes hoje. Está “aperreado”, como dizem os queridos nordestinos, por causa dessa distância. Ele quer tanto quanto eu – se é que se pode dimensionar o querer? Tudo que sei é que queremos. Queremos um ao outro, e dói saber que não podemos ter um ao outro por causa da dura tarefa de sobreviver, para a qual o trabalho é meio.

Estava dando prova numa turma quando escrevi o seguinte:

Fome é saudade de comida
Saudade é fome de gente
Estou faminto por ti
Nada há que me alimente

Pensava que em dois dias minha fome estaria saciada, mas fui surpreendido com a deprimente notícia de que a empresa o havia requisitado para Brasília, já na segunda-feira. Ou seja, teremos apenas algumas horas de domingo entre os infindáveis dias que nos mantiveram separados esta semana e que se repetirão na semana que vem.

Fiquei muito irritado com essas perspectivas. Ele também. A sobrevivência, porém, solicita, demanda, requer, exige. Tem hora que dá vontade de mandar a rotina para a puta que a pariu, juntamente com seus irmãos gêmeos: o trabalho e os deveres.

Mas... quem pode viver só de amor?





Vou ter que amargar o primeiro jogo do Brasil sem ele. Pensei que fosse curtir o primeiro jogo do Brasil com ele... Isso para não falar do Dia dos Namorados amanhã, que vou passar sem ele. Vale a pena suportar essa ditadura do mercado? Como escapar dela, todavia? Nunca pensei que, amando um maquiador, eu teria que ficar sem marido como ficam os amantes de marinheiros, pilotos, comissários de bordo, etc. A gente se ama tanto que, quando não está junto, parece que falta um pedaço.

Entretanto, se a dor dessa momentânea amputação passa, as coisas não melhoram. Pelo contrário, esse estancamento até pode ser sinal de que o amor, a paixão, o tesão já não são mais os mesmos. Porém, se a dor persiste, em função da não presença, a vida parece tornar-se um fardo, porque o tempo já não é mais aliado do encontro, mas cúmplice da separação — e Eros não pode estar feliz longe do objeto que o encanta.


Os auto-proclamados defensores da moralidade



Moralidade, costumes e casamento: uma reflexão necessária


Por Sergio Viula


É impressionante a energia, o tempo e os recursos de toda espécie que os defensores da moralidade — leia-se, especialmente, os pregadores eletrônicos e seus congêneres menos abastados — empregam na defesa do que chamam de “moral”. Mas será que já pararam para pensar no que é, de fato, essa coisa que eles — e tantos outros — chamam de “moralidade”? Duvido muito.

Via de regra, pregam primeiro e pensam depois — quando pensam. Isso porque não cultivam o hábito da reflexão racional, descomprometida com crenças pré-estabelecidas. Submetem a razão à fé, transformando-a em sua serva. É uma relação sadomasoquista, na qual a fé assume o papel sádico, e a razão, o masoquista. A fé escraviza a razão, e esta se deixa dominar — até o sufocamento. Algemada à cama da superstição, é fustigada com o chicote do medo e da culpa. Por isso, duvido que esses pregadores — e seus fiéis, crédulos ouvintes — pensem de fato.

Um exemplo claro: todos eles defendem a moralidade como algo fixo, dado, imutável. No entanto, a moralidade não é outra coisa senão obediência aos costumes — sejam eles quais forem. E costumes são apenas a maneira tradicional de agir e de avaliar.

"Em toda parte onde os costumes não mandam, não há moralidade; e quanto menos a vida é determinada pelos costumes, menor é o cerco da moralidade. O homem livre é imoral, porque em todas as coisas quer depender de si mesmo e não de uma tradição estabelecida. Em todos os estados primitivos da humanidade, 'mal' é sinônimo de 'individual', 'livre', 'arbitrário', 'inabitual', 'imprevisto', 'imprevisível'."
(Nietzsche, Friedrich – “Aurora”, p. 23, Ed. Escala)

Quando um indivíduo age de modo diferente da tradição, seu ato — e ele próprio — são vistos como "imorais" pela sociedade que o cerca. E, se também estiver contaminado pelo mesmo sistema de valores, ele próprio sentirá culpa. Mas o que é, afinal, "tradição"? Nada mais do que uma autoridade superior à qual se obedece — quase sempre por medo e superstição.

Um momento… Se a moralidade advém dos costumes em vigor, quem sanciona esses costumes? Os legisladores, curandeiros, sacerdotes — ou seja, as esferas mais altas da hierarquia social, que, desde os tempos primitivos, se veem como representantes dos deuses. E é justamente por querer ditar costumes, segundo suas crenças e tradições, que pastores, pregadores e sacerdotes sem batina se lançam candidatos ao poder legislativo. Não estão interessados no Executivo — não têm preparo para gerir cidades, estados ou o país (especialmente os “políticos” evangélicos). Eles querem ser vereadores, deputados, senadores. É nessa esfera que se criam leis — leis que sancionam ou vetam comportamentos individuais, determinando penas judiciais conforme os costumes que pretendem manter ou impor. É um poder perigoso esse de moldar costumes pela força da lei.

Uma vez estabelecidos os costumes — e a moralidade que deles nasce —, qualquer tragédia passa a ser interpretada como punição divina. Está lançada a semente da caça às bruxas. As vítimas? Mulheres, judeus, gays, ciganos — qualquer grupo vulnerável, que seja alvo de inveja ou ódio velado. A história está repleta de exemplos assim.

Quando o domínio da moralidade baseada em costumes se impõe, toda forma de originalidade passa a ser vivida com culpa. Os melhores indivíduos têm, muitas vezes, uma existência desnecessariamente dolorosa por causa disso — e suas vidas se tornam menos frutíferas do que poderiam ser, caso percebessem o quão arbitrários e relativos são os costumes e valores de sua sociedade.

Entre tantos costumes que observamos no dia a dia, há um que costuma causar polêmica: o casamento entre pessoas do mesmo gênero. Há, inclusive, um projeto de lei estagnado no Congresso Nacional, travado pelo lobby de pastores e outros moralistas eleitos à base de pregações e ameaças apocalípticas proclamadas de púlpitos país afora — com destaque para os pentecostais e neopentecostais.

Vamos refletir sobre o casamento em si. Trata-se de um costume, uma tradição que acabou carregando em seu bojo uma certa moralidade — arbitrária, como todas. Dizem os moralistas: “Casamento é só entre homem e mulher.” De onde tiraram essa ideia? Das tradições, especialmente as religiosas.

Mas antes mesmo de falar sobre o gênero dos cônjuges, é preciso responder: o casamento é uma criação divina ou humana? Humana, é claro — assim como as divindades que o teriam instituído.

O casamento foi criado para proteger bens, aumentar riquezas e garantir a herança legítima. A filiação tinha mais a ver com posse do que com afeto. As mulheres, por sua vez, sempre souberam como atribuir filhos a homens que não eram seus verdadeiros pais — por medo ou interesse. Dar o nome de um homem a seus filhos era vital para evitar a desonra. Já os homens gostavam de reconhecer seus filhos para perpetuar seus nomes e suas posses.

Com o tempo, o casamento se popularizou — e se tornou um negócio lucrativo para diversas empresas. Seu verdadeiro sentido se perdeu, e passou a ser visto como algo sagrado, divino.

Ninguém precisa casar para amar. Mas muita gente casa sem amar. Se um homem e uma mulher podem se casar por conveniência ou interesse, por que dois homens ou duas mulheres não poderiam fazer o mesmo?

Há sociedades em que um homem se casa com várias mulheres; outras, em que uma mulher se casa com vários homens. A Sociologia e a Antropologia oferecem inúmeros estudos sobre isso. O que é exceção para nós pode ser regra para outros — e vice-versa.

Em diversos países europeus — e em alguns estados americanos —, o casamento entre pessoas do mesmo sexo já é uma realidade. E daí? Qual é o problema? Quando é que o Congresso Nacional vai legislar com base nos direitos dos indivíduos, e não nos interesses de moralistas retrógrados que se comportam mais como advogados de Satã do que promotores do tribunal divino?

É hora de reavaliar nossos valores, repensar nossos conceitos, questionar criticamente nossos costumes e tradições. Precisamos agir com liberdade e originalidade, exigindo nosso espaço — e respeitando o espaço do outro. E, acima de tudo: não votar em gente que, se pudesse, estaria abanando as fogueiras da Inquisição numa praça perto de você!

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