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Pessoas LGBT com deficiência e a igualdade no casamento

Se “amor é amor”, por que pessoas queer com deficiência ainda esperam por uma verdadeira igualdade no casamento?


Sarah Jacob - autora

Assista ao vídeo que eu fiz sobre isso:


Do portal Gay Times

Traduzido por Sergio Viula


Neste Mês do Orgulho da Deficiência, Sarah Jacobs — embaixadora da organização Just Like Us — reflete sobre a luta contínua pela igualdade no casamento para pessoas com deficiência.

“Amor é amor” é um dos pilares do Orgulho. Um grito de guerra entoado em protestos, estampado em broches e bandeiras, e usado em toda publicação corporativa obrigatória durante o mês de junho. Esse slogan ajudou a pressionar governos a reconhecer que pessoas LGBTQIA+ merecem os mesmos direitos e proteções legais que qualquer outra pessoa. Em muitos aspectos, funcionou.

A frase se tornou tão aceita que há até discussões dentro da própria comunidade LGBTQIA+ sobre se já passou da hora de aposentá-la, por ter cumprido seu papel e ser agora um vestígio de campanhas passadas. Que todos deveríamos seguir em frente.

Mas nem todos vencemos. Porque, no Reino Unido e em outras partes do mundo, pessoas com deficiência ainda esperam por uma verdadeira igualdade no casamento.

Legalmente, pessoas com deficiência podem se casar. Mas o sistema de benefícios pune muitas de nós por fazê-lo. No Reino Unido, sob a Lei de Reforma da Assistência Social de 2012, uma vez que um casal está legalmente casado ou em união civil, sua renda passa a ser avaliada em conjunto. Para pessoas com deficiência que dependem de benefícios para sobreviver e cobrir os altos custos de uma vida acessível, o casamento pode significar a redução ou corte total desses recursos vitais.

O resultado? Pessoas com deficiência são forçadas à dependência financeira de seus parceiros. Corremos o risco de perder não só dinheiro, mas liberdade. Essa política aumenta o risco de abuso, cria uma enorme pressão nos relacionamentos e reforça a ideia desumanizante de que pessoas com deficiência são um “fardo” a ser transferido do Estado para o cônjuge.

Muitas pessoas com deficiência trabalham. Mas os benefícios geralmente cobrem equipamentos essenciais, dispositivos de mobilidade, cuidados especializados e outras necessidades que sustentam a vida. Para quem não trabalha ou não pode trabalhar, esses benefícios são um salva-vidas. E esse apoio não deveria desaparecer só porque nos apaixonamos.

Segundo uma pesquisa da organização Scope, lares com pessoas com deficiência precisam, em média, de 1.010 libras a mais por mês para alcançar o mesmo padrão de vida de lares sem pessoas com deficiência. Sem os recursos adicionais que o sistema de benefícios oferece, esse peso devastador pode — e de fato — destrói vidas.

Isso não é igualdade no casamento. É um sistema que força pessoas com deficiência a escolher entre independência e intimidade, entre formar uma família e sobreviver financeiramente. “Amor é amor” deveria valer para todas as pessoas.

Nenhum benefício por deficiência deveria ser avaliado com base na renda de outra pessoa. Ninguém deveria ter que ponderar se dizer “sim” significa perder a capacidade de viver sua vida.

Como uma pessoa queer com deficiência, lembro da alegria ao ver a igualdade no casamento finalmente aprovada no Reino Unido e, depois, na Irlanda. Lembro das lágrimas, das comemorações, da sensação de que a vida realmente estava melhorando para nós.

Hoje estou na idade em que amigos héteros e queer estão planejando casamentos, falando sobre flores, locais da cerimônia e sobre quem vai chorar primeiro no altar.

Fico feliz por eles. De verdade. Mas também fico com raiva. Porque, se algum dia eu for pedida em casamento, não poderei simplesmente dizer sim. Terei que calcular o custo. Terei que pensar no risco. O que acontece se minha condição piorar e eu não puder mais trabalhar? Meu parceiro passaria a me ressentir? Eu me tornaria mais uma estatística entre pessoas com deficiência abusadas que não conseguem sair de casa por falta de recursos? Vou ter que sentar com meu parceiro e ter aquela conversa que ninguém deveria precisar ter. Aquela em que explico que, para mim, o casamento pode significar perder tudo de que dependo para viver.

Neste período de Orgulho, vamos lembrar do que deu início a tudo isso. Vamos lembrar que a luta não era por bolos coloridos e hashtags, era — e ainda é — sobre amor.

Precisamos voltar às raízes do nosso movimento e exigir uma verdadeira igualdade no casamento. Para pessoas queer, para pessoas com deficiência, para todas nós. Porque amor ainda é amor. E o amor ainda merece mais.

Cadeirante e gay assumido, Pedro Fernandes fala ao Blog Fora do Armário.


Pedro Azevedo Fernandes, nosso entrevistado.
Instagram: https://www.instagram.com/mundopedrofernandes/



Por Sergio Viula




Conheci Pedro através das redes sociais. Aliás, esse é um dos lados positivos das redes - aproximar pessoas que talvez não se encontrassem de outra maneira. Pedro Azevedo Fernandes é um jovem petropolitano (cidade da região serrana do estado do Rio de Janeiro), ator formado, que também estuda marketing na Unopar e trabalha. Pedro é especial em muitos sentidos, mas existem duas características dele que valem o destaque aqui, visto que motivaram essa entrevista para o Blog Fora do Armário: Pedro é cadeirante e gay. 

O Blog Fora do Armário gosta de dar voz a pessoas da comunidade gay, sejam elas líderes do movimento LGBT ou membros dessa comunidade que possam nos ensinar algo ou que precisem de apoio. Pedro se enquadra na categoria dos que podem nos ensinar algo. 

Fora do Armário: Qual é o maior desafio para uma pessoa cadeirante na cidade onde você mora?

Pedro Fernandes: O maior desafio é a mobilidade urbana. Vivo numa cidade histórica, tombada pelo Patrimônio Histórico, e com isso enfrento algumas dificuldades na minha cidade. Mas isso está mudando. É um trabalho de conscientização feito pouco a pouco.

Em relação ao mercado de trabalho, é a mesma coisa. Ainda há muito preconceito com pessoas com deficiência que queiram atuar na televisão ou no teatro. É uma barreira que a gente enfrenta e que tem que ser vencida.

Fora do Armário: Quando foi que você se percebeu gay e qual foi a reação dos seus pais?


Pedro Fernandes:  Eu me descobri gay com 12 anos de idade e me assumi com 15. Teve esse espaço de tempo até eu me aceitar. Tive minha primeira experiência com 12 anos, e foi uma experiência de beijo... nem foi de sexo. Sexo mesmo foi com meu primeiro namorado, aos 21.

Para meus pais, foi difícil até eles assimilarem essa informação, entenderem, e serem capazes de respeitar. Uma coisa que eu sempre digo é que eu brigo para ser respeitado, não para ser aceito. Minha mãe tem muito medo até hoje. Ela é aquela mãezona mesmo. Ela tem medo que eu sofra preconceito por ser membro de duas minorias.

Terminei meu relacionamento com meu namorado há pouco tempo, mas continuamos próximos. Minha mãe adora ele. Ela consegue me entender, me enxergar como eu sou verdadeiramente.

Em relação aos amigos, eu nunca liguei para isso, sabe? Porque quem é meu amigo de verdade vai gostar de mim como eu sou. Então, se alguém se afastou de mim por esse motivo, eu nem percebi, porque eu estava tão bem com a aceitação da minha família que a aceitação dos amigos passou a ser consequência. Quem gostar de mim vai gostar de mim do jeito que eu sou.


Fora do Armário: Você disse que terminou há pouco com seu namorado. Quanto tempo vocês namoraram?

Pedro Fernandes: O nosso relacionamento durou quatro anos. Terminamos, mas ele continua sendo meu amigo. Ele me ajuda no dia-a-dia. A parceria continua – sempre! – a todo vapor. Eu tenho muita gratidão a ele porque ele me mostrou uma visão de mundo que eu não tinha. A minha visão de mundo se ampliou, e poder estar num relacionamento de verdade, que vai além do sexo, é ótimo. A gente se conheceu através de um amigo. Ele é do Espírito Santo. Ele me conheceu, a gente começou a conversar em outubro, e em novembro, ele já estava aqui, e a gente começou a namorar. Ele é uma pessoa encantadora. Não deu certo depois de um tempo, mas a amizade continua. 

Fora do Armário: Quais são os desafios para alguém que é gay e tem necessidades especiais dentro da comunidade gay?

Pedro Fernandes: O maior problema é a vaidade. Aquela coisa de "eu tenho que ter um namorado melhor que o seu, mais bonito que o seu, mais forte que o seu, mais rico que o seu". Então, eu acho que a maior dificuldade que alguém enfrenta no 'mundo gay' é ter alguma deficiência, alguma necessidade que exija um comprometimento do outro no relacionamento.

A gente sofre um pouquinho, mas eu acredito que não seja por maldade ou medo da parte de outros gays, mas devido ao fato de que as pessoas, em geral, não sabem lidar com quem tem alguma deficiência. Acho que falta informação, material para orientar. Cada deficiência demanda um cuidado específico. Mas eu também penso que não é qualquer pessoa que está preparada para ter um relacionamento com alguém que tenha necessidades especiais. Você tem que entrar no universo daquela pessoa. Não é fácil. Não é como namorar com um andante. Você vai precisar entender que terá que se privar de algumas coisas, se adaptar, ou modificar, mas se a pessoa estiver disposta a isso, a relação vai valer muito a pena. Ela vai aprender muita coisa. Vai ser uma troca entre dois mundos diferentes. Mas ainda falta muita informação. Por exemplo, essa entrevista que eu estou dando aqui para você já vai servir de material para quando uma pessoa se deparar com ela, poder dizer: “É, não é tão difícil assim.”

Eu preciso, por exemplo, de ajuda para ir ao banheiro, para trocar de roupa, para me locomover. Um relacionamento precisa incluir tudo isso, mas não pode cair na mesmice, porque um namorado não é um enfermeiro, um cuidador. Por isso, eu acho que a maioria das pessoas tem medo do novo, do desconhecido. 

Fora do Armário: Como é sua atuação em relação à homossexualidade e às pessoas com necessidades especiais? Você já foi a alguma Parada LGBT?

Pedro Fernandes:  Eu sou bastante militante, sim, nas duas causas. Nas causas das minorias, digamos assim. Sou militante mesmo e gostaria de seguir carreira na política e defender essas duas bandeiras. Na verdade, tenho três bandeiras: a das pessoas com deficiência, a dos LGBT, e a dos artistas. Essas são as três bandeiras que eu levo comigo.

Com relação à Parada LGBT, eu ainda não fui a nenhuma, mas foi por falta de oportunidade mesmo. Eu não tive quem me acompanhasse ou onde ficar. Eu sou muito favorável às Paradas LGBT, apesar de achar que elas têm se tornado um carnaval para muitos. Mas, creio que elas não perderam seu viés político. Elas ainda estão aí para dizer que nós existimos e temos o direito de ser felizes. Eu pretendo ir à Parada de São Paulo no ano que vem ou mesmo à Parada do Rio.


Fora do Armário: Qual é a sua meta para os próximos 10 anos?

Pedro Fernandes: A minha meta é seguir carreira na vida pública, me formar agora na faculdade marketing e, de repente, fazer mais uma faculdade, apesar de não saber ainda qual vai ser.

Gostaria de me tornar uma representatividade da pessoa com deficiência, da pessoa LGBT, e do artista, principalmente aqui na minha cidade, que é uma cidade muito conservadora e que precisa dessa representatividade.

Penso em lançar um livro contando os detalhes da minha história, até para servir de material, uma vez que existe muito pouco material sobre isso.

Também gostaria de fazer um filme com o mesmo teor e participar de alguma novela. São esses os desejos que eu tenho.

Fora do Armário: Que recado você deixaria para os leitores do Blog Fora do Armário?

Pedro Fernandes: Eu acredito que só a arte e a educação podem mudar o mundo. Esses dois segmentos andam muito separados - coisa que não deveria acontecer –, uma vez que esses dois segmentos dialogam muito entre si.

Então, eu peço a todo mundo que acredite no poder da educação e no poder da arte, e que caminhem junto com a gente na busca por esse mundo ideal.

Precisamos buscar a igualdade e construir um Estado laico. E o Estado laico só vai se concretizar quando a educação não receber influência religiosa alguma e quando a arte não sofrer censura ou influência religiosa alguma. A educação e a arte são as duas ferramentas capazes de modificar a nossa sociedade, a nossa visão de mundo. 


PING PONG COM PEDRO FERNANDES:




Hobby preferido?
Cantar.

Livro de cabeceira?
De teatro.

Filme Preferido?
A dona da história.

O que mais te atrai num homem?
Um bom papo.

O que te faria desistir de um homem?
Atitudes preconceituosas.

Pessoa que você mais admira?
Como artista, Fernanda Montenegro. Na vida, minha mãe.

Sua melhor memória?
Minha primeira aula de teatro.

Seu maior desejo?
Deixar um legado por onde eu passar.

Amar é...
Se doar ao outro sem esperar nada em troca.

Sexo é...
Importante e saudável.

O melhor do Brasil?
Sua cultura.

O pior do Brasil?
O preconceito contra sua própria cultura e contra seu povo.

Como seria o relacionamento ideal?
Um relacionamento equilibrado.

Pedro numa frase:
Uma mente colorida tentando colorir esse mundo cinza.

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