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O Caso Conservador a Favor do Casamento Gay - Theodore b. Olson - Newsweek

Theodore B. Olson


O Caso Conservador a Favor do Casamento Gay


Por que casamento entre pessoas do mesmo sexo é um valor.
By Theodore B. Olson - NEWSWEEK. Published Jan 9, 2010


Junto com meu bom amigo e adversário ocasional na corte, David Boies, eu estou tentando persuadir uma corte federal a invalidar a Proposição 8 da Califórnia – a medida aprovada por voto que derrubou o direito constitucional de pessoas do mesmo sexo casar-se na Califórnia.

Meu envolvimento neste caso encontra certo grau de consternação entre os conservadores. Como poderia um republicano politicamente ativo, um veterano das administrações de Ronald Reagan e George W. Bush, desafiar a definição “tradicional” de casamento e pressionar por uma interpretação “ativista” da Constituição para criar um novo direito constitucional?

Minha resposta para essa aparente enigma repousa sobre uma vida inteira de contato com pessoas de diferentes experiências, histórias, pontos-de-vista e características intrínsecas, e sobre minha rejeição ao que vejo como superficialmente apelativas, mas definitivamente falsas percepções a respeito de nossa Constituição e de sua proteção da igualdade como direito fundamental.

Muitos dos meus amigos conservadores têm uma hostilidade quase automática contra o casamento gay. Isso não faz sentido, porque as uniões de pessoas do mesmo sexo promovem os valores que os conservadores prezam. O casamento é uma das pedras fundamentais de nossas comunidades e de nossa nação. Em termos práticos, trata-se de uma união estável entre dois indivíduos que trabalham para criar um lar amável e uma parceria social e econômica. Nós encorajamos casais a se casarem porque os compromissos que eles firmam um com o outro produzem benefícios não apenas para eles mesmos, mas também para suas famílias e comunidades. O casamento requer que pensemos para além de nossas necessidades pessoais. Ele une dois indivíduos baseado em aspirações compartilhadas, e ao fazer isso, estabelece um investimento formal no bem-estar da sociedade. O fato de que indivíduos que são gays queiram participar dessa instituição social vital é evidência de que ideais conservadores gozam de ampla aceitação. Os conservadores deveriam celebrar isso, em vez de lamentar.

Legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo também é um reconhecimento dos princípios básicos americanos, e representaria o clímax do compromisso de nossa nação com os direitos iguais. Esta é - alguém já disse - a última pedra a ser ultrapassada para a garantia dos direitos civis em nossa luta de dois séculos para atingir o alvo colocado para essa nação ao tempo de sua formação.

Esse princípio americano fundamental de igualdade é central para nossas convicções políticas e legais, quer sejamos republicanos, democratas, liberais ou conservadores. O sonho que veio a ser a América começou com o conceito revolucionário expresso na Declaração de Independência em palavras que estão entre as mais nobres e elegantes já escritas: “Consideramos essas verdades como autoevidentes: que todos os homens são criados iguais, que são investidos pelo seu Criador de certos direitos inalienáveis, entre os quais estão a Vida, a Liberdade e a busca pela Felicidade.”.

Infelizmente, levou muito tempo até que nossa nação pudesse viver a promessa de igualdade. Em 1857, a Suprema Corte sustentava que um afro-americano não podia ser cidadão. Durante a Guerra Civil, Abraham Lincoln eloquentemente fez a nação lembrar-se de seu princípio fundador: “nossos pais criaram nesse continente uma nova nação, concebida em liberdade e dedicada à proposição de que todos os homens são criados iguais.".

No final da Guerra Civil, para tornar a promessa de igualdade uma realidade, a 14 a. Emenda à Constituição acrescentou o mandamento de que “nenhum estado privará qualquer pessoa de vida, liberdade e propriedade, sem o devido processo da lei; nem negará a qualquer pessoa a igual proteção das leis.".

Leis subsequentes e decisões judiciais deixaram claro que a igualdade sob a lei se estende a pessoas de todas as raças, religiões, e lugares de origem. Que melhor maneira de tornar essa aspiração nacional completa do que aplicar a mesma proteção a homens e mulheres que diferem de outros somente com base em sua orientação sexual? Não consigo pensar numa única razão – e não ouvi nenhuma desde que embarquei nessa jornada – para a contínua discriminação contra membros decentes e trabalhadores de nossa sociedade sobre aquela base.

Diversas leis federais e estaduais têm permitido certos direitos e privilégios a casais gays e lésbicos, mas essas proteções variam dramaticamente de estado para estado, e quase universalmente negam verdadeira igualdade a gays e lésbicas que desejam se casar. A própria ideia de casamento é básica para o reconhecimento como iguais em nossa sociedade; qualquer status menor que esse é inferior, injusto e inconstitucional.

A Suprema Corte dos Estados Unidos tem mantido que o casamento é um dos direitos mais fundamentais que nós temos como americanos sob nossa constituição. Ele é uma expressão do nosso desejo de criar uma parceria social, de viver e compartilhar a alegria e as dificuldades da vida com a pessoa que nós amamos, e de formar um compromisso duradouro e uma identidade social. A Suprema Corte tem dito que o casamento é uma parte das proteções constitucionais à liberdade, privacidade, liberdade de associação e identificação espiritual. Resumindo, o direito de casar ajuda-nos a definir quem somos e nosso lugar na comunidade. Sem isso, não pode haver verdadeira igualdade sob a lei.

É verdade que o casamento nessa nação tem sido tradicionalmente considerado como um relacionamento exclusivamente entre um homem e uma mulher, e muitas das múltiplas religiões de nossa nação definem o casamento exatamente naqueles termos. Mas enquanto a Suprema Corte havia sempre considerado o casamento naquele contexto, os direitos e liberdades subjacentes que o casamento incorpora não estão de modo algum confinados aos heterossexuais.

O casamento é um compromisso civil nesse país bem como, em alguns (mas dificilmente todos) os casos, um sacramento religioso. Ele é um relacionamento reconhecido pelos governos como provendo um status privilegiado e respeitado, digno do apoio e benefícios do estado. A Suprema Corte da Califórnia descreveu o casamento com uma “união aprovada sem reservas e favorecida pela comunidade.” Onde o estado concordou com a sanção oficial e a provisão de benefícios para aqueles que entram num relacionamento assim, nossas cortes tem instado que impedir aquele status requereria justificativas poderosas e que esse status não pode ser arbitrariamente negado.

Quais são, então, as justificativas para a decisão da Califórnia sobre a Proposição 8 de retirar o acesso à instituição do casamento por alguns de seus cidadãos sobre a base de sua orientação sexual? As razões que eu tenho ouvido não são convincentes.

A explicação frequentemente mencionada é a tradição. Mas simplesmente porque alguma coisa tem sido feita de certa maneira não significa que ela tenha que permanecer sempre daquela maneira. Caso contrário, ainda estaríamos segregando escolas e prisões. Gays e lésbicas têm sempre estado entre nós, formando parte de nossa sociedade, e eles têm vivido como casais em nossas vizinhanças e comunidades. Por muito tempo, eles têm experimentado discriminação e até perseguição; mas nós, como sociedade estamos começando a nos tornar mais tolerantes, aceitando e compreendendo. A Califórnia e muitos outros estados têm permitido que gays e lésbicas formem parcerias domésticas (ou uniões civis) com a maior parte dos direitos dos heterossexuais casados. Assim, pessoas gays e lésbicas podem agora viver juntas em relacionamentos sancionados pelo estado. Portanto, parece anômalo citar “tradição” como uma justificativa para impedir o status de casamento e assim continuar a rotular esses relacionamentos com menos dignos, menos sancionados, como menos legítimos.

O Segundo argumento que eu geralmente ouço é que o casamento tradicional atende ao interesse estatal da procriação – e que abrir o casamento para casais do mesmo sexo diluiria, diminuiria, e desvalorizaria esse alvo. Mas esse não é inteiramente o caso. Impedir que lésbicas e gays se casem com seus parceiros não faz com que mais heterossexuais se casem e gerem mais filhos. Da mesma forma, permitir que gays e lésbicas se casem com alguém do mesmo sexo não desencorajará os heterossexuais de se casarem com uma pessoa do outro sexo. Como, então, permitir casamentos entre pessoas do mesmo sexo reduziria o número de crianças que os casais heterossexuais concebem?

Esse argumento da procriação não pode ser levado a sério. Nós não inquirimos se os casais heterossexuais pretendem ter filhos antes de permitirmos que se casem. Nós permitimos o casamento entre pessoas idosas, prisioneiros, e por pessoas que não pretendem ter filhos Mais ainda: seria pernicioso pensar que o casamento devesse ser limitado aos heterossexuais por causa do desejo do estado de promover a procriação. Nós não consideraríamos constitucional a proibição do casamento se o estado decidisse - como a China tem feito - desencorajar a procriação.

Outro argumento, ainda mais vago e menos persuasivo, é que o casamento gay de alguma forma prejudica o casamento heterossexual. Eu ainda não encontrei uma pessoa que possa me explicar o que quer dizer isso. De que maneira, permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo diminui os casamentos dos casais heterossexuais? Diga-se de passagem, que quando o juiz do nosso caso pediu ao nosso oponente para identificar os modos pelos quais o casamento entre pessoas do mesmo sexo poderia ferir o casamento heterossexual, para seu próprio crédito ele respondeu honestamente que não conseguia pensar em nenhum.

É fato que não há qualquer boa razão para que neguemos o casamento a parceiros do mesmo sexo. Por outro lado, existem muitas razões pelas quais deveríamos formalmente reconhecer esses relacionamentos e abraçar o direito de gays e lésbicas de se casarem e se tornarem membros plenos e iguais de nossa sociedade.

Independentemente do que se pense sobre a homossexualidade, é fato que gays e lésbicas são membros de nossas famílias, clubes e locais de trabalho. Eles são nossos médicos, nossos professores, nossos soldados (quer admitamos ou não), e nossos amigos. Eles clamam por aceitação, relacionamentos estáveis, e sucesso em suas vidas, exatamente como os restantes de nós.

Conservadores e liberais igualmente precisam concordar com os princípios que certamente nos unem. Podemos seguramente concordar sobre o valor de família forte, relacionamentos domésticos duradores, e comunidades habitadas por pessoas com compromissos entre si que sejam reconhecidos e sancionados. Confinar alguns de nossos vizinhos e amigos que compartilham esses mesmo valores a uma classe fora da lei ou de segunda mina seu senso de pertencimento e enfraquece sua ligação com os restantes de nós e com o que deveriam ser nossas aspirações em comum Até aqueles cujas convicções religiosas inibem o endosso do que possam considerar um “estilo de vida” inaceitável deveriam reconhecer que a reprovação não deveria manter o estigma ou o tratamento desigual.

Quando nos recusamos a concordar com esse status para gays e lésbicas, nós os desencorajamos quanto aos mesmos relacionamentos a que encorajamos outros. E também estamos dizendo-lhes, àqueles que os amam, e à sociedade como um todo que seus relacionamentos são menos dignos, menos legítimos, menos permanentes, e menos valiosos. Eu não consigo imaginar como possamos nos beneficiar como sociedade fazendo isso.

Eu entendo (mas rejeito) certos ensinamentos religiosos que denunciam a homossexualidade como moralmente errada, ilegítima ou não natural; e eu me oponho fortemente àqueles que defendem que relacionamentos entre o mesmo sexo deveriam ser desencorajados pela sociedade e pela lei. A ciência nos ensinou - senão a própria história - que gays e lésbicas não escolhem ser homossexuais mais do que os restantes de nós escolhemos ser heterossexuais. Em grande parte, essas características são imutáveis, como ser canhoto. E, enquanto nossa Constituição garante a liberdade de exercermos nossas convicções religiosas individuais, ela igualmente proíbe que forcemos nossas crenças sobre os outros. Eu não acredito que nossa sociedade possa jamais viver a promessa de igualdade, e os direitos fundamentais à vida, à liberdade, e à busca da felicidade, até que acabemos com a discriminação de indivíduos sobre a base da orientação sexual.

Se nascemos heterossexuais, não nos é comum percebermos aqueles que nasceram homossexuais como uma aberração e uma ameaça. Muitas religiões e muito de nossa cultura têm sido reforçada por aqueles impulsos. Muito frequentemente, isso tem levado ao preconceito, hostilidade e discriminação. O antídoto é compreensão, e razão. Nós já toleramos leis nesta nação que proibiam o casamento entre pessoas de diferentes raças. A Suprema Corte da Califórnia foi a primeira a declarar essa discriminação inconstitucional. A Suprema Corte dos Estados Unidos unanimemente concordou 20 anos mais tarde, em 1967, num caso conhecido como Amor versus Virgínia (Loving vs Virginia). Parece inconcebível hoje que somente 40 anos atrás houvessem lugares nesse país onde mulheres negras não podiam se casar legalmente como homens brancos. E há somente 50 anos, 17 estados ordenavam a educação pública segregada — até que a Suprema Corte derrubou aquela prática por unanimidade no caso Brown versus Junta de Educação (Brown v. Board of Education – N.T.: semelhante à Secretaria de Educação no Brasil). A maioria dos americanos se orgulha dessas decisões e do fato de que as leis estaduais discriminatórias que as produziam foram invalidadas. Estou convencido que os Americanos se orgulharão igualmente quando não mais discriminarmos gays e lésbicas e dermos as boas-vindas a eles em nossa sociedade.

As reações aos nossos processos têm reforçado para mim essas verdades essenciais. Eu tenho visto raiva, ressentimento, e hostilidade, e ouvido palavras como “traição” e outras críticas cortantes. Mas eu tenho sido coberto com expressões de gratidão e de boa vontade da parte de pessoas de vários caminhos diferentes na vida, incluindo poderia acrescentar, muito conservadores e libertários cujos nomes poderiam surpreender. Eu tenho me emocionado especialmente por muitas confissões pessoais de como é solitário e pessoalmente destrutivo ser tratado como um sem-casta, e quão significativo será ser respeitado por nossas leis e instituições civis como um americano, com direito à igualdade e respeito. Não tenho dúvida que estamos do lado certo da batalha, o lado certo da lei, e o lado certo da história.

Alguns já sugeriram que começamos esse processo cedo demais, e que nem o país nem a corte estão “prontos” para lidar com esse assunto e remover esse estigma. Discordamos. Representamos clientes reais – dois casais maravilhosos da Califórnia que mantém relacionamentos duradouros. Nossas clientes lésbicas estão criando quatro crianças bem-educadas que não poderiam ter pais melhores. Nossas clientes desejam se casar. Elas acreditam que têm o direito constitucional. Elas desejam ser representadas na corte e buscar a vindicação desse direito montando um desafio protegidas pela Constituição dos Estados Unidos contra a validade da Proposição 8 sob as cláusulas de igual proteção e devido processo garantidas pela 14ª. Emenda. De fato, o Procurador Geral da Califórnia reconheceu a inconstitucionalidade da Proposição 8, e a cidade de São Francisco juntou-se ao nosso caso para defender os direitos de gays e lésbicas ao casamento. Não dizemos às pessoas que têm uma apelação legítima que esperem até o tempo “certo” e que o povo esteja “pronto” para reconhecer sua igualdade e dignidade de acordo com a lei.

Cidadãos a quem a igualdade tem sido negada invariavelmente ouvem que devem “esperar sua vez” e “ser pacientes”. Todavia, veteranos de batalhas pelos direitos civis no passado descobriram que foi o ato de insistir sobre os direitos iguais que finalmente promoveu aceitação desses mesmos direitos. Quanto a estarem “prontos” os tribunais para esse caso, apenas alguns anos atrás, em Romer v. Evans, a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubou uma emenda constitucional do estado do Colorado que retirava os direitos dos gays e lésbicas à proteção das leis anti-discriminação naquele estado. E sete anos atrás, em Lawrence v. Texas, a Suprema Corte considerou como totalmente desprovida de qualquer base racional, as leis do Texas que proibiam práticas sexuais íntimas em ambiente privado por pessoas do mesmo sexo, invalidando uma decisão contrária tomada 20 anos antes.

Essas decisões tem gerado controvérsia, é claro, mas essas são decisões da mais alta corte da nação nas quais nossos clientes têm o direito de confiar. Se todos os cidadãos têm um direito constitucional ao casamento, se as leis estaduais que retiram proteções legais de gays e lésbicas como classe são inconstitucionais, e se a conduta sexual íntima e privada entre pessoas do mesmo sexo é protegida pela Constituição, resta muito pouco a que os oponentes do casamento entre pessoas do mesmo sexo possam se agarrar. Como Justice Antonin Scalia, que deixou o caso Lawrence, destacou: "Que justificação (sobraria) para possivelmente negar os benefícios do casamento aos casais homossexuais exercendo ‘a liberdade protegida pela Constituição’?" Ele está certo, é claro. Alguém poderia concordar ou não com essas decisões, mas até Justice Scalia tem reconhecido que elas vão numa única direção.

A Proposição 8 da Califórnia é particularmente vulnerável ao desafio constitucional, porque aquele estado agora criou uma louca colcha de retalhos em termos de regulação de casamento que não faz sentido para ninguém. A Califórnia reconhece o casamento entre homens e mulheres, incluindo pessoas no corredor da morte, abusadores de crianças e espancadores de mulheres. Ao mesmo tempo, a Califórnia proíbe o casamento por parceiros estáveis carinhosos, amorosos, mas tenta compensar oferecendo-lhes a alternativa de “parcerias domésticas” com virtualmente todos os direitos de pessoas casadas exceto o status de casamento aprovado pelo estado. Finalmente, a Califórnia reconhece 18.000 casamentos entre pessoas do mesmo sexo que aconteceram nos meses entre a decisão da Suprema Corte que garantir os direitos do casamento gay e a decisão dos cidadãos da Califórnia de retirar aqueles direitos através da aprovação da Proposição 8.

Então, existem agora três classes de californianos: casais heterossexuais que podem se casar, divorciar e casar de novo, se quiserem; casais do mesmo sexo que não podem se casar, mas podem viver juntos em parcerias domésticas; e casais do mesmo sexo que são casados agora, mas se vierem a se divorciar, não podem casar de novo. Este é um sistema irracional, é discriminatório, e não se sustenta.

Americanos que acreditam nas palavras da Declaração de Independência, no discurso de Gettysburg de Lincoln, na 14ª Emenda, e nas garantias da Constituição à proteção e dignidade iguais diante da lei não podem sossegar enquanto esse erro persistir. Esse não é um assunto conservador ou liberal; é um assunto americano, e está na hora de nós, como americanos, abraça-lo.

Fonte: https://www.newsweek.com/conservative-case-gay-marriage-70923


Traduzido por Sergio Viula para o Blog Fora do Armário

Bolsonaro e Fascismo: Leia esse texto



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sexta-feira, 1 de abril de 2011

JAIR BOLSONARO É PORTA-VOZ DE MUITOS BRASILEIROS


O silêncio pode em algumas situações significar perigosa conivência. Por essa razão, não penso ser desejável e adequado simplesmente ignorar o episódio apenas com intuito de não jogar mais holofotes sobre alguém que pretende se alimentar dessas luzes da audiência. Ao contrário: há algumas reflexões importantíssimas que merecem ser feitas, a partir das lamentáveis e criminosas declarações feitas pelo capitão-deputado federal Jair Bolsonaro (PP/RJ) ao programa CQC, exibido pela TV Bandeirantes na segunda-feira, dia 28 de março.

Ao responder a questionamento da cantora Preta Gil sobre a possibilidade de um filho dele namorar uma negra e vociferar, em horário nobre, que "não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco. Meus filhos foram muito bem educados e não viveram em ambiente como, lamentavelmente, é o teu", Bolsonaro explicitou - e não pela primeira vez - duas ordens de preconceitos, simultaneamente: homofobia e racismo. Ardiloso, não demorou a avisar que "não havia entendido a pergunta" e tentou desculpar-se com o movimento negro, intensificando no entanto as investidas intolerantes contra homossexuais.

A estratégia é pensada: racismo, no Brasil, é crime inafiançável e tipificado pela Lei 7716, de 5 de janeiro de 1989. A pena pode chegar a cinco anos de prisão. A homofobia, ao contrário, ainda não é juridicamente considerada um crime. Daí a necessidade premente de aumentar a pressão sobre o Senado Federal em favor da aprovação do Projeto de Lei 122/2006, que criminaliza as práticas homofóbicas e as iguala ao crime de racismo.

No início do ano, por iniciativa da senadora Marta Suplicy (PT/SP), a proposta foi desarquivada e deverá ser analisada pela comissão de Direitos Humanos da casa, antes de chegar ao plenário. Aprová-la representaria, na avaliação do Movimento Não à Homofobia, "colocar o Brasil na vanguarda da América Latina, assim como o Caribe, como um país que preza pela plenitude dos direitos de todos seus cidadãos, rumo a uma sociedade que respeite a diversidade e promova a paz".

Liberdade de expressão???

Diante das reações imediatas e intensas dos movimentos sociais e dos setores progressistas da sociedade, e mais uma vez ardiloso, Bolsonaro apelou para o desgastado argumento do "estou sendo censurado, quero ter garantido meu direito à liberdade de expressão". Falso. O capitão-deputado mistura, no dito popular, alhos com bugalhos e procura confundir para tentar convencer. No limite, trocando em miúdos, o que ele faz é reivindicar o direito de ter preconceitos e de manifestá-los pública e impunemente. Estapafúrdio, um contra-senso. Uma atrocidade e aberração.

Porque certamente a Constituição Federal estabelece, em seu capítulo primeiro, artigo quinto, inciso nono que "é livre a expressão de atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura ou licença". No entanto, como bem lembra o advogado Rogério Faria Tavares em artigo publicado pelo Observatório da Imprensa, "o cidadão que, no ato de expressar-se, violar a integridade de qualquer outro membro do referido elenco de direitos, não está resguardado por qualquer garantia constitucional: incorre em flagrante desrespeito à Carta de 88 e deve sofrer as consequências correspondentes". O especialista completa: "quando o ato de expressar-se se dá fora do contexto jurídico apropriado, sua qualificação é outra: "abuso," "infração" ou "crime".

Direitos estão associados a deveres e a responsabilidades. A liberdade de expressão, pilar fundamental e insubstituível da democracia, uma das razões de ser do regime democrático, não é absoluta e deve estar conectada harmonicamente a outros preceitos constitucionais também importantíssimos para o funcionamento do Estado de Direito. A prerrogativa de dizer não pode atentar contra a dignidade de outro ser humano. Para construir uma analogia e guardadas as diferenças e devidas proporções: admitir que, em nome da liberdade de expressão, Bolsonaro pode vir a público para manifestar intolerâncias contra negros e homossexuais seria como aceitar que Hitler estava correto ao professar em seus discursos agressões contra os judeus, ciganos, imigrantes, mulheres, portadores de deficiência física, negros e homossexuais... Pois é...

Estimular o debate????

Não procede também a "justificativa" anunciada pelo CQC para convidar o capitão-deputado para a entrevista: o programa alegou que, por ser uma figura polêmica e sem papas na língua, Bolsonaro ajudaria a enfrentar tabus e a incentivar o debate. O "confundir para explicar" se manifesta novamente. Não há dúvidas que, em democracias, pluralidade e contraditório precisam ser fomentados, mas dentro dos marcos constitucionais e civilizatórios, da legítima e desejável divergência racionalizada, sem que representem apologia da intolerância, do preconceito e, no limite, do crime. É isso: debater significa apresentar ideias e argumentos - não incitar ou cometer crimes.

Lembra o jornalista Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania, que "toda vez em que você critica pessoas publicamente por suas características intrínsecas, tais como cor da pele, origem geográfica, crença religiosa ou comportamento sexual, entre outros, está, sim, discriminando, pondo à parte e condenando pessoas por uma faceta delas que não têm como mudar".

E eu recordo cá com meus botões que, em 1992, ao apoiar a decisão da escola Ursa Maior, na capital paulista, de recusar a matrícula da aluna Sheila Carolina de Oliveira, 5 anos, por ser portadora do vírus da Aids, o então presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo (SEMESP), José Aurélio de Camargo, afirmou sem pudores que "a criança aidética já nasce com atestado de óbito assinado e portanto não precisa estudar". Abjeto, de embrulhar o estômago. Recuou em seguida, lamentando "o mal-entendido e dizendo que apenas desejava incentivar o debate sobre a doença". Cinismo leviano levado às últimas consequências. A propósito: o argumento do CQC ao explicar o espaço oferecido a Bolsonaro é de natureza bastante semelhante, não?

É preciso considerar ainda mais uma confusão deliberadamente incentivada pelo programa. Não raro, os professores nos deparamos em sala de aula com falas do tipo "você viu a reportagem feita pelo CQC? Ficou boa aquela entrevista feita pelo CQC, não?". Ora, entrevista e reportagem são conceitos e técnicas pertencentes ao campo do jornalismo (que faz pensar e incentiva reflexões); o CQC é um programa de entretenimento (que espetaculariza, provoca sensações e cutuca os instintos mais primitivos). Espertamente, o programa movimenta-se para se apropriar da chancela de credibilidade e reconhecimento sociais de que o jornalismo ainda dispõe. Faz humor (e nem vou entrar no mérito do tipo e da qualidade do humor que faz), mas alega informar. Mais uma vez, é preciso estar atento e saber separar o joio do trigo.

Ventos do fascismo

Não menos importante: Jair Bolsonaro cumpre atualmente o seu sexto mandato como deputado federal e recebeu em 2010, na última disputa, 120.646 votos, alcançando o posto de décimo-primeiro mais votado no Rio de Janeiro. "Logo, tem adeptos fiéis. Conta com financiadores perseverantes", reforça Saul Leblon, na Agência Carta Maior. Sugiro exercício bem simples: acompanhar cartas sobre o assunto que têm sido publicadas pelos jornais, nas seções dos leitores. Boa parte delas tece elogios à postura de Bolsonaro. Cuidado: o capitão-deputado está longe de ser uma caricatura; ao contrário, publiciza, reverbera e amplifica aquilo que muita gente no Brasil infelizmente pensa e defende: extermínio de pobres, perseguição às minorias, pena de morte, tortura, racismo, homofobia, ditadura...

Bolsonaro funciona como porta-voz de setores representativos e significativos da sociedade brasileira (só para lembrar, ao abrir a caixa de Pandora na eleição presidencial de 2010, José Serra conquistou cerca de 44% dos votos no segundo turno). O comportamento do capitão-deputado e as falas dele - e o respaldo social que recebem - nos levam a duas importantes reflexões finais. Primeiro: conseguimos, os setores progressistas, vencer a disputa presidencial nas três últimas eleições - mas estamos certamente falhando na construção de hegemonia de valores e princípios. Segundo (e como consequência da anterior): os ventos do fascismo insistem em soprar despudoradamente por aqui.

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