Mostrando postagens com marcador fanatismo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador fanatismo. Mostrar todas as postagens

A exposição do Santander QueerMuseu

 
Exposição Queer Museu no Santander Cultural em Porto Alegre (RS) 
(Reprodução/Facebook)


Por Sergio Viula


Pensei que estava na Idade Média de novo. Dizer isso já parecer jargão hoje em dia, mas é fato. O gritos de blasfêmia no meio de uma exposição de arte pareciam ecoar dos porões da Santa Inquisição. Com esses, vinham os gritos de pedofilia, visando claramente a mobilizar multidões através do pânico e do ódio. Tudo isso cheirava à lenha fumegante oriunda das fogueiras "santas", de quem não suporta ver um símbolo desconstruído, mas considera obra de deus queimar corpos vivos nas chamas do ódio fanático como era feito em praça pública.

Não, eu não estava assistindo a algum romance com temática medieval. Era só um vídeo clandestino feito por três patetas que aparentemente representavam o MBL (Movimento Brasil Livre) e que pegavam carona nas sandices ditas por fanáticos religiosos, extremistas de direita (não são melhores e nem piores que os extremistas de esquerda - todo extremismo é uma merda), e por sensacionalistas do ódio como o chatésimo Olavo de Carvalho, citado pelos três patetas do MBL como autoridade "profética" durante a gravação do vídeo. Um deles chega a dizer que o referido arremedo de pensador já havia previsto que depois do casamento entre pessoas do mesmo sexo, viria o casamento pluriamoroso e depois a zoofilia e a pedofilia. Ou seja, a culpa pelas cagadas que os heterossexuais fazem ou podem vir a fazer, conforme a visão dessa turma, é sempre dos gays.

Troca esse disco, idiota. Já está carcomido pelo tempo e pela experiência. As famílias homoparentais estão aí para desmentir essa besteira toda.

Fiquei pensando: E se esses loucos decidirem fazer uma cruzada moralista e fanática contra qualquer obra de arte em qualquer exposição do Brasil, será que os organizadores vão retirar aquela obra ou fechar a exposição também? Será que é cedendo ao obscurantismo que vamos avançar com o esclarecimento? Será que a rendição diante do grito estúpido, imbecilizado por discursos totalitaristas e fundamentalistas vai nos ajudar a derrotar a ignorância e o ódio que colocam em xeque qualquer noção de liberdade e até mesmo de proteção à vida? Sim, porque o discurso dessa gente monstrifica as pessoas que não se enquadram em sua ridiculamente mesquinha cartilha. E aos monstros, os homens "de bem" costumam oferecer a navalha afiada.

Gostei de ver que os seguranças da exposição colocaram para fora do recinto o pateta que pretendia abordar uma família que passeava tranquilamente pelos corredores. O pateta filmador não podia admitir que um casal e seu filho andassem pelos corredores da exposição MuseuQueer. Mas aquela tentativa de assédio foi a última gota para transbordar o copo da paciência dos funcionários do museu. Constranger visitantes é passar de qualquer limite. Estava nítido pelo comportamento dos três idiotas que eles não frequentam espaços de arte.

Sobre as peças expostas que eles mais difamaram e contra as quais envenenaram alguns ignorantes de plantão, vale dizer que todas elas são obras de arte, mas que nem por isso se prestam aos mesmos papéis.

Primeiro, porque retratar o fato de que existem seres humanos que praticam sexo "interespécie", ou seja, sexo com outros animais que não os humanos, não é o mesmo que mostrar gravuras de crianças que são gays ou transgêneros, entre os quais também travestis. Mas, parece que esses três patetas só entendem a travestilidade como a venda do corpo na pista. Como são estúpidos! Eles essencializam o circunstancial sem a menor compreensão do que seja gênero e do que seja prostituição, ainda que muito desta última se deva exatamente aos atravessamentos das desigualdades vivenciadas por transgêneros no que diz respeito às oportunidades na sociedade em que essas pessoas estão inseridas.

Obviamente, dizer que as orientações sexuais e as identidades de gênero são uma característica de nossa humanidade como um todo já é deixar subentendido que crianças, por serem humanas, podem apresentar qualquer uma delas, inclusive crianças trans, as quais podem ser homossexuais, heterossexuais, bissexuais, etc. Isso nada tem a ver com pedofilia, que é o desejo de um adulto por uma criança. Desejo esse que pode chegar à consumação do ato sexual com ou sem o consentimento do infante, e que é crime. Dizer que uma criança é gay, bissexual, transgênero ou não, está para a pedofilia do mesmo jeito que dizer que uma criança é heterossexual está para o estupro. Os patetas do MBL, além de mal informados, demonstram má-fé.

Aliás, não é no QueerMuseu que as crianças correm risco de serem atacadas por pedófilos. É nas sacristias, nos retiros, nos gabinetes de aconselhamento pastoral. E não somente aí, mas em muitos outros lugares considerados pelos referidos três patetas e seus seguidores como sendo seguros para crianças.

A decisão do Santander em cancelar a exposição foi infeliz e só acena para esses incendiários como a suposta confirmação de que suas ações renderam "frutos". Isso os estimula ainda mais a perseguir e difamar outras inciativas artísticas. Aliás, na Holanda, de onde vem o banco Santander, o Museu do Sexo deixa tudo isso no chinelo. E tem pais que levam os filhos sem o menor constrangimento.

E por quê? Porque, como retratava aquela peça que mostrava hóstias com nomes de partes do corpo, tudo isso é corpo, meu corpo, teu corpo, o corpo do outro. E cada um tem o direito de fazer do seu corpo o que bem entender, mas não do corpo do outro. E é quando dois querem a mesma coisa, em condições semelhantes, que tudo o que eles fizerem entre si terá legitimidade, não importa quem faz o quê. Os limites são justamente o da idade do consentimento e o do respeito à vontade alheia.

Detalhe: Disco de trigo sem a consagração de um padre não é hóstia. Qualquer pessoa minimamente entendida em teologia católica (ou até mesmo no catecismo) sabe disso. O biscoitinho de trigo só é "corpo de Cristo" depois da consagração sacerdotal - aquela que é feita durante a missa, que nada mais é do que a celebração do "corpo de Cristo" - chamado pelos católicos de "Eucaristia". Então, escrever nomes de partes do corpo num disco de trigo não é o mesmo que pegar a hóstia que restou da missa no sacrário e fazer outros usos dela. Os patetas disseram mais uma patetice quando apelaram aos católicos sem saber que muitos católicos desprezaram completamente a incitação deles por saberem muito bem a diferença entre um biscoito numa exposição e a hóstia recebida na missa.

Todavia, o que esses caras fizeram é semelhante ao que fazem muçulmanos fanáticos em diversas partes do mundo: Destroem obras de arte milenares por acharem que elas blasfemam contra seu diminuto deus. Chamam-no de grande, mas grande mesmo só a patetice dos fanáticos.

Daí a colocar as mulheres em sacos de pano dizendo que são sinais de virtude, proibir o canto ou a dança, espancar em praça pública homens que ousem beber um gole de vinho, enforcar homossexuais ou lançá-los de prédios, casar meninas de 9 anos com homens de 60, como acontece por aquelas bandas, é só um passo.

Mas o tiro deles pode ter saído pela culatra. Uma exposição que poderia ter ficado confinada a uma quadra de uma cidade gaúcha acabou ganhando o Brasil todo, desencadeando discussões, debates e novos movimentos em prol da liberdade artística. Como se vê nas obras de Foucault, quanto mais a Igreja criava mecanismos de controle sobre o sexo, mais ela o colocava no centro das atenções, enfraquecendo seus próprios interditos e reforçando discursivamente a existência e a pujança do erotismo que nos é comum, ainda que se manifeste de modos diversos em cada um de nós. O MBL não aprendeu nada com a História. Bem feito, a ignorância custa caro ao próprio ignorante.

Não nos curvemos, sigamos fazendo arte! Muita arte!

NÃO AO FUNDAMENTALISMO E AO CONSERVADORISMO OBSCURANTISTA!


P.S.: Há um tempo, o SESC também recebeu um espetáculo, dessa vez de teatro, chamado Macaquinhos. Foi um auê nas redes sociais, com burrices do nível dessas do MBL, mas ditas por aquele tipo de gente que pensa que 'gala' é o feminino de 'galo'... kkkkkkk Detalhe: O SESC não cancelou o espetáculo como fez o Santander com a exposição. PARABÉNS para o SESC e uma vaia para o Santander.

Adolescente Transexual que cometeu suicídio havia citado os pais cristãos em blog

(H/T: lazerprincess) Leelah Alcorn


Texto publicado pelo Progressive Secular Humanist
Quem lê bem em inglês encontrará muita coisa interessante sobre humanismo secular nesse site. Recomendo.


Traduzido por Sergio Viula para o Blog Fora do Armário


Adolescente Transexual que cometeu suicídio havia citado os pais cristãos em blog


Depois de anos de abuso e rejeição por parte de rígidos pais cristãos, uma adolescente transexual de Ohio cometeu suicídio atravessando diante de um caminhão.

Leelah Alcorn, também conhecida como Joshua Alcorn, foi atropelada e morta por um caminhão que passava pela southbound Interstate 71, estrada que corta a a comunidade de Union Township, domingo de manhã. A tragédia parece não ter sido um acidente, mas suicídio.

Em seu blog no Tumblr, Leelah deixou uma comovente nota de suicídio, detalhando uma vida de dor e rejeição, uma vida dominada por pais cristãos que se recusavam a entender, ou simplesmente não conseguiam compreender , que sua preciosa criança era uma menina em corpo de menino.

Em seu último post no blog Leelah escreve:

Se vocês estão lendo isso, significa que eu cometi suicídio e, obviamente, não pude deletar esse post da minha sequência.
Por favor, não fiquem tristes, foi para melhor. A vida que eu viveria não valeria a pena... porque eu sou transgênero. Eu poderia entrar em detalhes explicando porque me sinto assim, mas essa nota provavelmente seria longa como, de fato, já está. Simplificando, sinto-me como uma garota presa no corpo de um garoto, e tenho me sentido assim desde que tinha 4 anos. Eu nunca soube que havia uma palavra para esse sentimento, nem que era possível que um garoto se tornasse uma garota, então eu nunca contei a ninguém e simplesmente continuei a fazer as coisas tradicionalmente consideradas como "de menino" para tentar me encaixar.

 

Quando eu tinha 14 anos, entendi o que significa transgênero e chorei de felicidade. Depois de 10 anos de confusão, eu finalmente entendi quem eu era. Imediatamente, contei à minha mãe, e ela reagiu de modo extremamente negativo, dizendo-me que isso era uma fase, que eu nunca seria uma garota de verdade, que Deus não comete erros, que eu estou errada. Se vocês estão lendo isso, pais, por favor não digam isso a seus filhos. Mesmo que vocês sejam cristãos ou contrário às pessoas transgêneras, nunca digam isso a alguém, especialmente a seu filho. Isso não fará outra coisa, senão com que eles se odeiem. Foi exatamente isso que fez comigo.

 

Minha mãe começou a me levar ao terapeuta, mas somente terapeutas cristãos (que eram todos tendenciosos), então eu nunca recebi a terapia de que eu precisava de fato para curar-me da minha depressão. Eu só recebi mais cristãos me dizendo que eu era orgulhoso e errado e que eu devia buscar a Deus por ajuda.

Quando eu tinha 16 anos, entendi que meus pais nunca se aproximariam e que eu teria que esperar até os 18 anos para começar qualquer forma de tratamento de transição, o que absolutamente quebrou meu coração. Quanto mais você espera, mais difícil é a transição. Eu me sentia desesperançada, porque eu apenas pareceria como um homem drag pelo resto da minha vida. No meu aniversário de 16 anos, quando eu não recebi consentimento dos meus pais para começar a transição, eu chorei até dormir.

Eu formei uma atitude do tipo "foda-se" para com meus pais e me assumi gay na escola., achando que, talvez, se eu preparasse o caminho para sair do armário como trans, o choque seria menor. Apesar da reação dos meus amigos ter sido positiva, meus pais ficaram furiosos. Eles sentiram como se eu estivesse atacando a imagem deles, e como se eu fosse um embaraço para eles. Eles queriam que eu fosse seu perfeito garotinho cristão heterossexual, e isso, obviamente, não era o que eu queria.

Então eles me tiraram da escola pública, tomaram meu laptop e celular, e proibiram-me de participar de qualquer mídia social, isolando-me completamente dos meus amigos. Isso provavelmente aconteceu na minha vida quando eu estava mais deprimida, e fico surpresa de não ter me matado. Eu fiquei completamente solitária por 5 meses. Nenhum amigo, nenhum apoio, nenhum amor. Só o decepção dos meus pais e a crueldade da solidão.

No final do ano escolar, meus pais finalmente se aproximaram e me devolveram meu celular e me deixaram voltar às redes sociais. Fiquei animada, eu finalmente teria meus amigos de volta. Eles estavam extremamente entusiasmados em me verem e falarem comigo, mas só de início. Por fim, eles perceberam que não me davam a mínima, e eu fiquei ainda mais solitária do que antes. Os únicos amigos que eu achava que tinha só gostavam de mim porque me viam cinco vezes por semana.

Depois de um verão praticamente sem amigos, somado ao peso de ter que pensar sobre a faculdade, economizar dinheiro para sair de casa, manter minhas notas altas, ir à igreja toda semana e me sentir como um merda, porque todo mundo lá era contra tudo aquilo pelo que eu vivia, decidi que era suficiente. Eu nunca vou conseguir fazer a transição com sucesso, mesmo quando eu sair de casa. Eu nunca serei feliz do jeito que me pareço ou falo. Eu nunca terei amigos suficientes para me satisfazerem. Eu nunca terei amor suficiente para me satisfazer. Eu nunca encontrarei um homem que me ame. Eu nunca serei feliz. Terei que viver o resto da minha vida como um homem solitário que queria ser uma mulher ou viver minha vida como uma mulher solitária que odeia a si mesma. Não há jeito de vencer. Não há saída. Já estou triste o suficiente, eu não preciso que minha vida se torne nada pior. As pessoas dizem “it gets better” (melhora), mas isso não é verdade no meu caso. Piora. Piora a cada dia.

Aí está o essencial, porque eu quero me matar. Desculpem se essa não é uma razão suficientemente boa para você, ela é suficientemente boa para mim. Por minha vontade, eu quero que 100% das coisas que me pertençam legalmente sejam vendidas e o dinheiro (mais o meu dinheiro no banco) sejam doados para grupos de apoio e movimentos de direitos civil transexuais, não me importa qual. O único modo para que eu descanse em paz será se um dia as pessoas trangêneras não forem tratadas como eu fui, se forem tratadas como humanas, com sentimentos corretos e direitos humanos. Gênero precisa ser abordado nas escolas, quanto mais cedo, melhor. Minha morte precisa significa algo. Minha morte precisa ser ser contada entre as pessoas transgêneras que cometeram suicídio esse ano. Está tudo fodido. Consertem. Consertem a sociedade. Por favor.

Adeus,
(Leelah) Josh Alcorn

Apesar do Leelah ter pedido que não ficássemos tristes, devemos estar tristes. Essa foi uma tragédia evitável. Tudo o que era preciso era um pouco mais de educação, e um pouco menos de fanatismo.

Chris Seelbach, membro do City Council (espécie de Câmara de Vereadores) de Cincinnati, que fez história em 2011, quando se tornou o primeiro político assumidamente gay eleito para o City Council de da cidade, discutiu o suicído de Leelah em sua página no Facebook, noting:

a verdade é que…. ainda é extremamente difícil ser uma pessoa transgênera jovem nesse país. Temos que fazer melhor que isso.

Pela leitura de sua carta, Leelah deixa claro que ela quer que sua morte ajude, de alguma maneira, os "movimetnos de direitos civis trans".

[Nota do Tradutor: O autor desse artigo em inglês convocou doadores]

Por favor, juntem-se a mim fazendo uma doação (investimento em nossas crianças) agora mesmo para o TransOhio.
Invista clicando aqui: https://www.transohio.org/

 

Leelah se foi, mas não será esquecida – agora ela é mais um símbolo do sofrimento inefável e muitas vezes silencioso de tantos jovens, LGBT e ou não, forçados a sofrer opressão e abuso por seus pais encegueirados por superstição religiosa e fanatismo.
  


---------------------------------------
COMENTÁRIO DESTE BLOGUEIRO

Até quando preconceitos valerão mais que vidas humanas, ou dogmas mais do que filhos, ou a opinião da família, dos vizinhos, da congregação, do pastor mais do que os laços familiares?

Ame seu filho/filha, pai/mãe, irmão/irmão, avô/avó, tio/tia, primo/prima, cunhado/cunhada, sogro/sogra, e quantos outros parentes você tiver, seja ele/ela gay, lésbica, bissexual, transexual ou tenha ele/ela qualquer outra maneira de ser e de amar. Não há justificativa para a transfobia, a homofobia ou qualquer outro preconceito. Viva e deixe viver. Ame e deixe amar. 

E se você sofre com esses preconceitos, especialmente por parte de seus familiares, procure ajuda especializada e capaz de lidar com a diversidade afirmativamente. 

METAFÍSICA DA EXPLORAÇÃO -- O deus dos oprimidos é inconscientemente uma imagem ideal daquilo que os miseráveis gostariam de ser.



Por Marcia Eberlin - via Facebook em 15/08/14



METAFÍSICA DA EXPLORAÇÃO -- O deus dos oprimidos é inconscientemente uma imagem ideal daquilo que os miseráveis gostariam de ser. A colorida fantasia da opulência divina e a bem-aventurança espiritual, que os “pobres de espírito” usufruirão nos recantos celestiais, são apenas um reflexo distorcido do desejo inconsciente que as massas têm de usufruírem materialmente o estilo burguês de vida.

Infelizmente a alienação religiosa é por demais cruel, enquanto a riqueza é dividida entre os membros da classe dominante, aos oprimidos sobram apenas migalhas da produção material. O pior é que, pela potência ideológica de tal engodo, o explorado ainda acredita que está trabalhando para a glória do “reino de Deus”.

Essa exploração velada, feita pela classe dominante, foi percebida profundamente pelo filósofo Marx. Sobre tal manipulação ele escreveu as seguintes palavras:

" Se minha própria atividade não me pertence, mas é uma atividade alienada, forçada, a quem ela pertence? A um ser outro que não eu. O que é esse ser? Os deuses? É evidente, nas mais primitivas etapas de produção adiantada, por exemplo, construção de templos etc., no Egito, Índia, México, e nos serviços prestados aos deuses, que o produto pertencia a estes. Mas os deuses nunca eram por si só os donos do trabalho; tampouco o era a natureza (...) O ser estranho a quem pertencem o trabalho e o produto deste, a quem o trabalho é devotado e para cuja fruição se destina o produto do trabalho, só pode ser o próprio homem. Se o produto do trabalho não pertence ao trabalhador, mas o enfrenta como uma força estranha, isso só pode acontecer porquê há um outro homem que não o trabalhador. Se sua atividade é para ele um tormento, ela deve ser uma fonte de satisfação e prazer para o outro. Não os deuses nem a natureza, mas só o próprio homem pode ser essa força estranha acima dos homens "(Manuscritos Econômicos e Filosóficos – p.98).

Como a religião é sempre o reflexo distorcido das classes que dominam, historicamente a mesma sempre esteve ao lado dos mais fortes, por isso, o trabalho alienado, distante de sua fonte humana, sempre foi justificado pelas variadas religiões como algo pertencente aos deuses. Daí a ideia do senso comum, de que a exploração, ao contrário de ser um “mal”, é uma forma de “purificação espiritual” e, portanto, uma coisa agradável aos deuses. Quantas pessoas no Brasil são ensinadas a se conformarem com seu "carma", para assim ganharem o direito de uma melhor reencarnação? Quantos outros são convencidos de que seu sofrimento e escassez material e cultural são subprodutos de um plano divino maior? Enquanto "mega- igrejas" são erguidas por nossos sorridentes pastores televisivos, gráficas imensas rodam a todo vapor novos livros "psicografados", padres cantores tornam-se abruptamente celebridades, entre outras façanhas inumeráveis de nosso crescente mercado da "fé", o homem comum se vê cada vez mais distante de usufruir o próprio trabalho de suas mãos. Com a desculpa de salvarem a nossa "alma", esses agentes do "mundo espiritual" perpetuam, às custas de nossa "santa alienação dirigida", a nossa fatídica resignação "cristã". Por quanto tempo os pastores tosquiaram as ovelhas?

O sofrimento humano e as crenças





O sofrimento humano e as crenças


Por Sergio Viula
23/12/13


As crenças podem ser tão variadas quanto os seres humanos. Há até quem creia na própria crença como meio para aliviar sofrimentos e superar dificuldades pessoais. A questão já não é mais se a fé é remédio ou placebo. Afinal, placebo que ‘funciona’ é remédio, pragmaticamente falando. Mas, para funcionar é preciso que a pessoa que faz uso dele realmente acredite que se trata de um genuíno remédio, pois se o paciente suspeitar de que está diante de um mero placebo, o efeito já não será o esperado.

Assim mesmo é com a fé: é preciso que a pessoa acredite realmente que os conteúdos de sua crença têm correspondência no mundo real, ou seja, que não são apenas ideais.

Crenças podem ser belas sob o ponto de vista estético.

Como não considerar belos os paramentos sacerdotais do catolicismo, do islamismo, do candomblé, da umbanda, que são indubitavelmente muito mais belos do que o mero paletó da maioria dos pastores protestantes ou mesmo do que a estola negra dos reformados? E o que dizer da maioria de seus templos, rituais, dietas, etc.?

Crenças podem ser boas sob o ponto de vista filantrópico.

Pessoas que acreditam ter a missão de aliviar o sofrimento que grassa pelo mundo a fora podem fazer muito bem ao próximo, ainda que esse conceito de bem possa ser questionado quando ambições pós-morte entram na economia desses atos de ‘caridade’.

Crenças podem ser consideradas tipos de ‘saberes’, especialmente do ponto de vista dos foucaultianos e das tradições.

Elas baseiam-se em oralidade, tradições escritas, rituais, preceitos e outros conteúdos. Algumas vezes podem envolver até conhecimentos sobre saúde, tais como ervas que curam e coisas a serem evitadas para a preservação do corpo e da mente.

Claro que o oposto também ocorre: crenças podem ser feias, cruéis, venenosas, destrutivas ao corpo e à mente. Rituais de iniciação que colocam em risco a integridade física e mental de crianças, adolescentes, nubentes, e por aí vai.

Um preço alto


De uma coisa, porém, qualquer crença carece: liberdade de pensamento. No momento em que o indivíduo crê, ele começa a usar o conteúdo de sua crença como crivo da verdade. Ela passa a ser o contrapeso da balança, a peneira, a régua, o esquadro e o compasso, através dos quais tudo será medido, pesado, julgado. Tudo estará sujeito à crença em primeiro lugar e mesmo que o indivíduo reveja algum conceito, isso geralmente se dará com base na própria crença, isto é, haverá alguma justificativa baseada nos conteúdos dessa mesma fé.

O ser humano que nutre alguma crença no sobrenatural, e daí deduz regras para a vida, parâmetros para a análise do que acontece ao seu redor e para a interpretação de si mesmo e de sua relação com esse derredor, terá sua percepção e sua razão dominadas pelos fantasmas evocados dessas mesmas crenças – o que também determinará, em grande parte, suas ações e reações a tudo isso.

Essa dinâmica interior é tão intensa e aparentemente tão real que o indivíduo que passa por tais experiências [na verdade, psíquicas] tende a ver uma espécie de confirmação da veracidade de suas crenças em tudo o que acontece a ele mesmo e aos que o cercam.

Hoje, presenciei uma situação assim: um jovem que aspira à felicidade e a uma vida equilibrada com a pessoa que ele ama; trabalhador; sofrido por acumular várias decepções na vida; pensando que havia finalmente encontrado a pessoa certa para compartilhar seus dias e se aprumar, sofreu a decepção de vê-la arruinar tudo, numa espécie de crise psicótica [sei lá que nome dar a isso].

Amando-a e querendo continuar com ela, mas vendo que não podia fazer nada contra a ira, a ofensa e a agressão, especialmente porque não queria revidar, queria apenas apaziguar os ânimos, ele entra numa espécie de colapso nervoso e não consegue parar de chorar e de falar desesperadamente.

Ela, que tem um background evangélico pentecostal, compartilha da ideia de que o diabo existe, pode possuir corpos, e que só Deus pode libertar. Contudo, considera que não tem sido boa bastante para contar com o favor divino e acha que também tem sua cota de demônios.

Ele, que tem um background de umbanda ou candomblé [não está claro], acredita que ela tenha um encosto para agir assim, do nada.

Acreditando que o Deus judaico-cristão possa lhe oferecer uma vida melhor do que os Deuses africanos, desesperado por ajuda e tendo sido cercado por quatro ou cinco crentes na hora do desespero, acaba por pedir oração. Foi o suficiente para que o circo fosse armado. Ele, cuja fé inclui a incorporação, se submetia àqueles cuja fé inclui o exorcismo. Prato cheio para mais gritaria.

Tive compaixão do rapaz. Decidi intervir. Pedi que parassem de gritar e me deixassem conversar com ele. Falei carinhosamente que ele não precisava se sujeitar a essa humilhação, que tudo isso não passava de um tipo de colapso. Disse-lhe que a sobrecarga emocional, o sofrimento acumulado e a crise daquele momento eram pesados demais para que ele carregasse tudo isso sozinho. Ele precisava conversar. Disse-lhe – prostrado e em profundo sofrimento sob o eco de “liberta, Jesus” – que sua imaginação o estava traindo. Pedi que ele se controlasse, porque tudo se ajeitaria. Disse-lhe que ele só precisava relaxar e que não devia deixar as pessoas trata-lo como possuído por algo maligno, que seus deuses não eram piores do que o deus deles. Ele se acalmou.

Os crentes não gostaram nada disso. Quiseram me convencer de que eu ‘sabia’ a ‘verdade’ e que não podia renega-la. Talvez tenham pensado, a partir de suas crenças (de novo!), que o 'demônio' podia estar se aquietando para não me dar motivos para crer. Afinal, a presença do demônio seria uma prova da existência de Deus – pensam os próprios exorcistas. Mais uma vez, a crença ditava juízos a partir de uma razão viciada em encarar mitos como realidades autônomas.

Pessoalmente, já não sabia de quem sentir mais compaixão. Tentei convencê-los de que aquela gritaria exorcista só piorava o estado do rapaz. Disse que não estavam ajudando o moço a superar a dor, mas multiplicando seu sofrimento em meio a tudo aquilo. Como já era previsível, não me deram ouvidos.

O rapaz continuou implorando “eu quero Deus”.

Saí, dizendo que não sabia quem seria pior nessa história toda – deus ou o diabo.

Que deus é esse que não age. Que deus é esse que precisa dessa gritaria toda para ouvir um pedido? E que demônio é esse que não obedece ao seu Criador? O povo gritava a ficar rouco. Sem exagero algum, as alas psiquiátricas de qualquer hospital pareceria menos louca.

Senti muita pena do rapaz e dos exorcistas de plantão. No fundo, sei que todos eles querem o melhor. É por amor que fazem isso. Mas, amor sem conhecimento pode ser instrumento de sujeição, tanto de si mesmo a outros quanto de outros a si mesmo.

Mas era justamente o “filtro” da crença que não permitia que “possuído” e “exorcistas” vissem a contradição em que estavam envolvidos. Tudo fazia sentido de acordo com suas crenças: o mal que ele sofria era obra do capeta; a solução era Jesus. Ele mesmo deve ter achado que essa crença ‘limpinha’ – sem charuto, sem cachaça, sem defumador – só podia ser melhor do que a dele. Ledo engano. Os crentes têm outros vícios – entre eles, o da contradição: Deus pode fazer todo o bem que deseja, mas não faz. Agora, se Deus não faz o bem, podendo fazê-lo, então não pode ser bom. Contudo, eles continuam cantando “louvai ao SENHOR, porque ele é bom; porque a sua benignidade dura para sempre.” (Salmos 136:1)

A música amolece o coração e sua repetição entorpece o entendimento.

O resumo da ópera é que o rapaz continua cheio de problemas e frustrações, enquanto os exorcistas seguem cheios de fantasias e ilusões. E grande parte desses sofrimentos e fantasias é fruto das crenças que cada um abraçou ao longo da vida.

Todos eles precisam mais da psicanálise do que imaginam. A moça, talvez até de psiquiatria.

Viver dói. As crenças poderiam anestesiar a dor de alguma forma [placebo], mas ao mesmo tempo em que aliviam algumas, criam outras – a pior delas é a ideia de que não posso conduzir minha vida de modo belo, bom e sábio sem as muletas da fé. Pessoas que, do ponto de vista existencial, têm capacidade para andar sozinhas, para correr, pular, chutar, mas preferem mancar apoiados na fé. Pior ainda: sentem-se gratas por aquilo de que não precisam. Até estranham que outros não tenham muletas ou que - por via das dúvidas- façam uso delas, mas sem muita convicção.

Todo ser humano deveria caminhar pelas próprias pernas, lançando tais muletas por terra, criando seu próprio caminho a cada passo que dessem, fosse no dia da alegria ou da tristeza, do prazer ou da dor, porque a vida não é só uma coisa nem [só] outra. E todas elas terminam quando a morte chega – todas igualmente. Impreterivelmente.

Emancipar-se das crenças é sinal de amadurecimento, mas ser adulto dói. A maioria prefere viver eternamente sob a tutela de pais/mães imaginários, cercados de 'irmãos' que também se consideram filhos destes.

Não digo isso com arrogância. Digo-o com tristeza, porque sei que nenhuma evidência, argumento ou lição na vida – ao contradizer a crença – será sequer levado a sério pela maioria das pessoas. E a razão é simples: a maioria crê em alguma entidade imortal, sejam vários deuses ou um só, imanentes ou transcendentes, pessoais ou impessoais; bajulados por um séquito de colaboradores e contrariados por um ou mais adversários contumazes, sejam lá quais forem seus nomes.

Muita gente pensa que a vida sem fé no sobrenatural é mais difícil. Esse é outro juízo equivocado nascido da crença; apenas outro mecanismo de defesa. E não me surpreenderia que a maioria das pessoas nem sequer chegasse a ler metade desse texto. As mais resistentes talvez cheguem ao fim, mas com aquele pensamento nada original: “quando as coisas apertarem, ele vai correr para Deus. Todo mundo pode ser ateu em tempos de paz. Quero ver na hora da dor."

Dizendo isso, apenas revelam que não podem conceber um ser humano absolutamente desprovido de crença no sobrenatural, no divino, no pós-morte, etc. Elas pensam que, bem lá no fundo, deve existir uma fagulha de fé que – se alimentada pela lenha da necessidade – há de se tornar numa fornalha de devoção. Esse é apenas um dos modos como quem crê lida com o desconforto de ver que há quem viva sem o menor vestígio de fé. E isso diz muito mais a respeito dos que creem do que a respeito dos que não.

Ironicamente, enquanto sofro por esse rapaz, essa moça e demais envolvidos, nutrindo o desejo de que todos eles se emancipem das crenças que iludem sua percepção e juízo, cerceando sua liberdade, acho que isso dificilmente acontecerá. Estatisticamente, é uma minoria que desperta do sono dogmático.

A vida, porém, ignorando teístas e ateus, segue sempre adiante, mas nunca em linha reta.

Fundamentalistas criam uma guerra santa em torno do 'design inteligente'



Em Dover, uma cidade nos EUA, um julgamento que durou 6 semanas para decidir sobre um pleito absurdo promovido por fundamentalistas contra a ciência - uma tentativa de recristianizar o sistema escolar americano.

Fundamentalistas são pessoas famintas por poder e dispostas a eliminar tudo que não sirva a seus propósitos. Um desafio à sensatez de qualquer sociedade.




Outro golpe contra o fundamentalismo, só que numa outra perspectiva.





Drauzio Varella fala sobre intolerância religiosa

O fervor religioso é uma arma assustadora, disposta a disparar contra os que pensam de modo diverso


Intolerância religiosa
por Drauzio Varella 


Dr. Drauzio Varella


SOU ATEU e mereço o mesmo respeito que tenho pelos religiosos.
A humanidade inteira segue uma religião ou crê em algum ser ou fenômeno transcendental que dê sentido à existência. Os que não sentem necessidade de teorias para explicar a que viemos e para onde iremos são tão poucos que parecem extraterrestres.

Dono de um cérebro com capacidade de processamento de dados incomparável na escala animal, ao que tudo indica só o homem faz conjecturas sobre o destino depois da morte. A possibilidade de que a última batida do coração decrete o fim do espetáculo é aterradora. Do medo e do inconformismo gerado por ela, nasce a tendência a acreditar que somos eternos, caso único entre os seres vivos.

Todos os povos que deixaram registros manifestaram a crença de que sobreviveriam à decomposição de seus corpos. Para atender esse desejo, o imaginário humano criou uma infinidade de deuses e paraísos celestiais. Jamais faltaram, entretanto, mulheres e homens avessos a interferências mágicas em assuntos terrenos. Perseguidos e assassinados no passado, para eles a vida eterna não faz sentido.

Não se trata de opção ideológica: o ateu não acredita simplesmente porque não consegue. O mesmo mecanismo intelectual que leva alguém a crer leva outro a desacreditar.

Os religiosos que têm dificuldade para entender como alguém pode discordar de sua cosmovisão devem pensar que eles também são ateus quando confrontados com crenças alheias.

Que sentido tem para um protestante a reverência que o hindu faz diante da estátua de uma vaca dourada? Ou a oração do muçulmano voltado para Meca? Ou o espírita que afirma ser a reencarnação de Alexandre, o Grande? Para hindus, muçulmanos e espíritas esse cristão não seria ateu?

Na realidade, a religião do próximo não passa de um amontoado de falsidades e superstições. Não é o que pensa o evangélico na encruzilhada quando vê as velas e o galo preto? Ou o judeu quando encontra um católico ajoelhado aos pés da virgem imaculada que teria dado à luz ao filho do Senhor? Ou o politeísta ao ouvir que não há milhares, mas um único Deus?

Quantas tragédias foram desencadeadas pela intolerância dos que não admitem princípios religiosos diferentes dos seus? Quantos acusados de hereges ou infiéis perderam a vida?

O ateu desperta a ira dos fanáticos, porque aceitá-lo como ser pensante obriga-os a questionar suas próprias convicções. Não é outra a razão que os fez apropriar-se indevidamente das melhores qualidades humanas e atribuir as demais às tentações do Diabo. Generosidade, solidariedade, compaixão e amor ao próximo constituem reserva de mercado dos tementes a Deus, embora em nome Dele sejam cometidas as piores atrocidades.

Os pastores milagreiros da TV que tomam dinheiro dos pobres são tolerados porque o fazem em nome de Cristo. O menino que explode com a bomba no supermercado desperta admiração entre seus pares porque obedeceria aos desígnios do Profeta. Fossem ateus, seriam considerados mensageiros de Satanás.

Ajudamos um estranho caído na rua, damos gorjetas em restaurantes aos quais nunca voltaremos e fazemos doações para crianças desconhecidas, não para agradar a Deus, mas porque cooperação mútua e altruísmo recíproco fazem parte do repertório comportamental não apenas do homem, mas de gorilas, hienas, leoas, formigas e muitos outros, como demonstraram os etologistas.
O fervor religioso é uma arma assustadora, sempre disposta a disparar contra os que pensam de modo diverso. Em vez de unir, ele divide a sociedade -quando não semeia o ódio que leva às perseguições e aos massacres.

Para o crente, os ateus são desprezíveis, desprovidos de princípios morais, materialistas, incapazes de um gesto de compaixão, preconceito que explica por que tantos fingem crer no que julgam absurdo.
Fui educado para respeitar as crenças de todos, por mais bizarras que a mim pareçam. Se a religião ajuda uma pessoa a enfrentar suas contradições existenciais, seja bem-vinda, desde que não a torne intolerante, autoritária ou violenta.

Quanto aos religiosos, leitor, não os considero iluminados nem crédulos, superiores ou inferiores, os anos me ensinaram a julgar os homens por suas ações, não pelas convicções que apregoam.

************

Cruzada religiosa combate direitos civis dos gays

Marcelo Semer



Cruzada religiosa combate direitos civis dos gays


Por Marcelo Semer
De São Paulo


O vereador Carlos Apolinário, ligado à Assembleia de Deus, apresentou proposta para criar em São Paulo, o dia do "orgulho hetero", levando o projeto para votação às vésperas da Parada Gay.

A Marcha para Jesus virou palco de repúdio à decisão judicial que garantiu a união estável homoafetiva, tendo como principal estandarte que "o verdadeiro Supremo é Deus".

A deputada Myriam Rios, hoje missionária católica, fez pronunciamento na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro propagando a expressão "orientação sexual pedófila". Dizia ter medo da proximidade de uma babá lésbica a filhas pequenas ou do assédio de um motorista travesti sobre seus meninos.

Porque a incorporação de direitos civis aos homossexuais está incomodando tanto assim aos ativistas da religião?

Não são eles os primeiros que deveriam se destacar pela defesa do amor, da solidariedade e do abrigo aos mais vulneráveis?

Onde estão as tradicionais preocupações com desigualdades sociais e manifestações de fraternidade?

Há quem diga que os grupos religiosos se sentiram intimidados com a proposta de criminalizar a homofobia.

Paradoxo dos paradoxos, pois a punição do preconceito é justamente o combustível para a liberdade de crença.

Em algum lugar do mundo, membros das mais diversas religiões já sentiram na pele o terror do preconceito e da intolerância. Como reproduzi-lo, então?

Depois da decisão do STF que autorizou a Marcha da Maconha, reconhecendo o legítimo direito à manifestação, muitos disseram em um misto de birra e revolta: se vale defender a maconha, vale falar qualquer coisa. Acabou-se a mística da homofobia.

É uma ideia equivocada.

Como bem explicou o ministro Celso de Mello, em voto primoroso, a liberdade deve ser garantida para expressar os mais diversos pensamentos. Mas nunca para ferir -o Pacto de San José da Costa Rica, que o país subscreveu, exclui do âmbito protetivo da liberdade de expressão todo estímulo ao ódio e ao preconceito.

Propor a legalização da maconha é legal. Dizer que os homossexuais são promíscuos, não.

Reverenciar o "orgulho hetero" também não é o mesmo que fazer uma parada gay -assim como prestigiar a consciência negra não se equipara em louvar o "orgulho branco", típico dos sites neonazistas.

A diferença que existe entre eles reside na situação de poder e de vulnerabilidade.

Os movimentos negros e gays se organizam pela igualdade e procuram combater a discriminação - o "poder branco", memória do arianismo, busca exatamente reavivá-la. Não quer igualdade, quer supremacia.

Basta ver que a proposta do "orgulho hetero" se impõe como um resgate da "moral e dos bons costumes", tal como uma verdadeira cruzada.

Por fim, mas não menos importante, a absurda vinculação entre homossexualidade e pedofilia.

Não é grave apenas pelo que mostra -um profundo desconhecimento da vida. Mas, sobretudo, pelo que esconde.

Jogar o defeito no outro, no diferente, naquilo que não nos pertence, é o primeiro passo para esconder o mal que nos cerca, e assim evitar sua punição.

Em vinte e um anos de judicatura criminal, vi inúmeros padrastos molestaram sexualmente suas enteadas, tios violentarem suas sobrinhas e até mesmo pais condenados por estupros seguidos em meninas de menos de dez anos. Na grande maioria dos casos, os crimes são praticados por heterossexuais.

Não se trata de tara, perversão ou qualquer outro atributo de fundo moralista. É simplesmente violência.

Misturar as estações não é ruim apenas por propagar um preconceito infundado. Mas por nos distanciar do problema e, em consequência, da solução.

Quando um dogma supera as lições que a vida nos traz, quando o apego à filosofia é maior que o amparo a dor, quando até o sempre solidário cerra os punhos, um sinal de alerta se acende.

É preciso relembrar que somos todos humanos.


************************

Marcelo Semer é Juiz de Direito em São Paulo. Foi presidente da Associação Juízes para a Democracia. Coordenador de "Direitos Humanos: essência do Direito do Trabalho" (LTr) e autor de "Crime Impossível" (Malheiros) e do romance "Certas Canções" (7 Letras). Responsável pelo Blog Sem Juízo. Fale com Marcelo Semer: marcelo_semer@terra.com.br ou siga@marcelo_semer no Twitter

Lanna Holder e Rosania Rocha: Mais humildade, meninas!

Lanna Holder (esquerda) e Rosania Rocha


Três semanas depois de inaugurar uma igreja inclusiva e voltada para acolher homossexuais no Centro de São Paulo, o casal de pastoras Lanna Holder e Rosania Rocha pretende participar da Parada Gay de São Paulo, em 26 de junho, para “evangelizar” os participantes. Estudantes de assuntos ligados à teologia e a questões sexuais, as mulheres encaram a Parada Gay como um movimento que deixou de lado o propósito de sua origem: o de lutar pelos direitos dos homossexuais.

“A história da Parada Gay é muito bonita, mas perdeu seu motivo original”, diz Lanna Holder. Para a pastora, há no movimento promiscuidade e uso excessivo de drogas. “A maior concepção dos homossexuais que estão fora da igreja é que, se Deus não me aceita, já estou no inferno e vou acabar com minha vida. Então ele cheira, se prostitui, se droga porque já se sente perdido. A gente quer mostrar o contrário, que eles têm algo maravilhoso para fazer da vida deles. Ser gay não é ser promíscuo.”

As duas pastoras vão se juntar a fiéis da igreja e a integrantes de outras instituições religiosas para conversar com os participantes da parada e falar sobre a união da religião e da homossexualidade. Mas Lanna diz que a evangelização só deve ocorrer no início do evento. “Durante [a parada] e no final, por causa das bebidas e drogas, as pessoas não têm condição de serem evangelizadas, então temos o intuito de evangelizar no início para que essas pessoas sejam alcançadas”, diz.Continua AQUI: https://noticias.gospelmais.com/missionaria-lana-houder-pastora-pregarao-parada-gay-20976.html


-----------------------------------------
COMENTÁRIO DESTE BLOGUEIRO
(já postado no site que originou a matéria)


Às missionárias em questão, quero deixar duas colocações:

1. Que bom que saíram daquele meio homofóbico. Não é fácil. Aguentem firmes os ataques que já estão sendo feitos pelos fanáticos.

2. Cheguem com humildade aos ambientes de militância gay.

Vocês ficaram a vida inteira difamando quem lutava pela liberdade e reconhecimento que vocês antes desprezavam. Agora, não venham querendo dar lição de moral ou questionar o caráter político e legítimo das paradas gays. Vocês não têm autoridade para se pronunciarem a esse respeito, levando em conta seu passado recente.

Querem abrir igreja, são livres para isso. Agora, se quiserem manter a neurose das outras igrejas com a única diferença de que passaram a aceitar os gays no seu ambiente de culto, isso é pouco demais para fazer realmente uma diferença relevante.

Eu, particularmente, desconfio de qualquer comunidade religiosa que pretenda patrulhar a vida alheia. E vocês demonstraram nessa matéria mais uma vez o tom de patrulhamento que nunca deixaram para trás de fato.

Humildade... cheguem junto para aprenderem antes de ensinarem... ouçam antes de falar... e de preferência nem falem se não for para fortalecer um movimento que já têm inimigos suficientes.

É só isso por enquanto,

Sergio Viula

Visite o blog Fora do Armário (veja no google associado ao nome Sergio Viula)

"Fé cega, faca amolada" - Carta Capital: Entrevista com Jean Wyllys

Atualização em 07/03/2025: Imagem criada por A.I.



Fé cega, faca amolada

Jean Wyllys
21 de junho de 2011 


O episódio envolvendo o projeto Escola Sem Homofobia do MEC e a marcha cristã contra o PLC 122 (que revê punições para quem viola a dignidade e os direitos de minorias vulneráveis, como idosos, pessoas com deficiências e LGBTs) me suscitaram uma questão que está ligada ao crescimento do fundamentalismo religioso e aos esforços deste para converter seus dogmas em leis para todos. A questão nos leva a crer que o Estado laico e de direito, as liberdades civis e o humanismo estão ameaçados pelo fundamentalismo cristão (católico e, sobretudo, evangélico neopentecostal).

O Estado é laico. É por ele que os congressistas devem lutar.

Em primeiro lugar, quero ressaltar que não estou me referindo à totalidade dos crentes cristãos, mas apenas aos fundamentalistas. Conheço muitos crentes católicos e evangélicos que comungam do respeito (e até se sacrificam) pelas liberdades, pela justiça e pela humanidade. Eu mesmo fui educado no cristianismo católico e herdei, do catecismo e das comunidades eclesiais de base, o humanismo e o amor pelo outro que hoje defendo, embora não seja mais católico. Há muitos outros crentes que defendem o mesmo. Mas não é o caso dos fundamentalistas.

Cristãos fundamentalistas são aqueles que crêem na Bíblia sem interpretá-la. Acreditam nos fundamentos de sua religião como verdades absolutas e inquestionáveis – e a Bíblia, como um texto literário escrito em contexto histórico e social bastante diferente do nosso, na maioria de suas passagens não deve ser tomada ao pé da letra. O fundamentalismo religioso tem, então, total identidade com o fanatismo e com o obscurantismo.

As idéias de cristãos fundamentalistas acerca da homossexualidade – de que esta é uma doença ou um “pecado mortal” e que os homossexuais vivem em pecado e que, portanto, “não herdarão o reino dos céus” – são obscurantistas e fanáticas e abrem mão da razão. Esses “cristãos” – muitos deles ocupando espaços na tevê, nas Assembléias Legislativas, Câmaras de Vereadores e no Congresso Nacional – querem que mulheres e homens vivam segundo leis e valores descritos em um livro (a Bíblia) escrito há dezenas de séculos antes de nós. Querem que joguemos fora todas as descobertas científicas e argumentos filosóficos acumulados nos últimos dois mil anos de discurso humano para vivermos conforme vivem os personagens da Bíblia. Não! Mulheres e homens precisam desenvolver suas virtudes e possibilidades humanas, precisam ser humanistas e lutar pelas liberdades civis.

Não se calar diante da tagarelice desses parlamentares e de outros fundamentalistas é, portanto, lutar pela respeito mútuo entre os diferentes, pela solidariedade entre os seres humanos, pela liberdade de crença e de descrença (sim, ateus e agnósticos têm o direito de não crer e nem por isso devem ser considerados pessoas sem ética) e pela laicidade. Em seu Artigo 19, a Constituição afirma que o estado brasileiro é laico e que, como tal, não deve nem pode estabelecer preferências entre as religiões. O texto constitucional dá à pessoa humana o direito de acreditar ou não em um ser divino, mas, afirma que o estado não tem sentimento religioso.

A história nos mostra que o fundamentalismo em qualquer religião só leva as pessoas ao autoritarismo, à escravidão e à violência. Fundamentalistas não têm compromisso com a ética que assegura a vida nem com o bem-estar de todos. Essa gente quer estabelecer a paz dos cemitérios. Como diz a letra da canção, “fé cega, faca amolada”.





Jean Wyllys
Jornalista e linguista, é deputado federal pelo PSOL-RJ e integrante da frente parlamentar em defesa dos direitos LGBT.

Destaque da Marcha para Jesus é uma aposentada: Jovelina das Cruzes

Foto Pinterest (alterada para essa postagem)



'A serviço de satanás'


Entre os milhares de pessoas que participaram da marcha, os temas polêmicos também foram os assuntos principais. A reportagem do iG abordou um grupo de oito jovens que veio de Cidade Adhemar para a marcha e perguntou quais as opiniões deles sobre direitos homossexuais, homofobia, aborto e legalização da maconha. Com visual moderno, estilo emo, todos disseram ser contra a união civil de pessoas do mesmo sexo, aborto e legalização das drogas e defenderam os pastores que consideram o homossexualismo uma prática pecaminosa.

"Quem defende o homossexualismo e a maconha está aqui a serviço de Satanás", disse o auxiliar de informática Natanael da Silva Santos, de 19 anos, que foi à marcha usando calça apertada, cinto de taxinhas e a tradicional franja emo. Enquanto a reportagem entrevistava os jovens, a aposentada Jovelina das Cruzes, de 68 anos, ouviu a conversa e fez uma intervenção. "Vocês estão falando sobre o que não conhecem. Meu sobrinho é gay e é um rapaz maravilhoso. Ótimo filho, muito educado, muito honesto e estudioso. Já o meu filho é machão e vive batendo na esposa, não respeita ninguém, não para no emprego."

Quando Jovelina virava as costas para continuar a marcha Natanael, que não se deu por vencido, fez uma observação. "Cuidado, tia. Se o pastor escuta a senhora falando uma coisa dessas ele não deixa mais a senhora entrar na igreja". E Jovelina respondeu. "Igreja é o que não falta por aí. Se me impedirem de ir em uma, vou em outra. Não tem problema."


Fonte: IG

A CARTA DO ASSASSINO: O massacre de Realengo foi motivado por fé e loucura.



Cuidado com religião. Cuidado com a privação dos prazeres. Cuidado com a falta de afetividade, seja, com um parceiro(a) sexual, seja com amigos, familiares, etc. E suspeite, sim, de qualquer pessoa que viva dessa maneira, pessoas fanáticas, que considerem tudo o que é humano como impuro, que não tenham amigos ou amantes.

Sem prazer, o ser humano enlouquece ou desenvolve doenças psicossomáticas dos mais variados tipos. Abomine qualquer ideia ou crença que satanize o prazer, o amor (homo, hetero ou bi), as coisas mais básicas do dia-a-dia, e que projetam a felicidade para pós-mundos, mundos vindouros.

O assassino acreditava na imortalidade da alma e na volta de Jesus. Ele acreditava na ressurreição dos mortos e esperava ser ressuscitado. Nenhuma doutrina causou mais desgraças ao mundo do que essas.

Postagens mais visitadas