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Cotas para LGBT em universidades: algumas impressões




Por Sergio Viula


No último mês de janeiro, o Correio Braziliense publicou matéria a respeito do número de negros graduados pela Universidade Federal de Brasília (UnB) desde o início da política de cotas: 

"Dez anos depois, política de cotas permite maior ingresso de negros na UnB (Universidade Federal de Brasília). Sistema de reserva de vagas será reavaliado pelo Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão em março. Na última década, 18,5% dos formados são negros. Políticas afirmativas permitiram uma mudança importante: 41% dos alunos aprovados entre 2009 e 2013 são afrodescendentes."
(Fonte: Correio Braziliense)

Sem dúvida, o sistema está funcionando bem em termos de inclusão, mesmo que possa haver necessidade de aprimoramento aqui ou ali. 

Ações afirmativas são realmente necessárias para a inclusão social de minorias. Disso, não há dúvida. Porém, nem sempre a melhor ação afirmativa é a cota. Com isto, quero dizer que não se pode concluir que basta ser uma minoria social para que se faça a inclusão de mais uma categoria no sistema de cotas. E como exemplo do que pretendo dizer, cito a minoria LGBT, uma vez que tal discussão tem sido entabulada em congressos e outros encontros focados nos direitos das minorias sexodiversas e transgêneras.  

Não vejo razão para reserva de vagas para pessoas lésbicas, gays, bissexuais ou transgêneras. E os motivos são relativamente simples. Respeito os discordantes e sei que entre estes há pessoas de peso em termos de conhecimento e atuação na defesa dos direitos humanos relacionados às pessoas LGBT. Porém, não poderia deixar de me pronunciar a respeito do assunto por uma questão de consciência. Vamos aos motivos, então:

1. Os problemas que as pessoas LGBT enfrentam para chegar ao fim do ensino médio não serão prontamente resolvidos com o estabelecimento de cotas para este segmento nas universidades. A maioria das pessoas sexodiversas e transgêneras que não chega ao ensino superior geralmente nem concluiu o ensino médio. E as razões podem ser diversas: 

a) podem ser vítimas da pobreza que acomete 18.724.000 de brasileiros. Nesse caso, ao terminarem (se conseguirem) o ensino médio, poderão fazer uso das cotas para estudantes do ensino público e - se forem afrodescendentes - das cotas raciais, dispensando a necessidade de mais uma nomenclatura que subtraia ainda mais vagas do sistema amplo de seleção que já reserva 50% das vagas para esses candidatos. 

b) Podem ter sido vítimas de bullying escolar e deixado a escola.

c) Podem ter sido expulsas de casa quando assumiram ou foram descobertas como LGBT, não conseguindo seguir com os estudos.

Em todos esses casos, as ações devem ser focadas na garantia à permanência dessas crianças e adolescentes na escola, com mecanismos que protejam sua dignidade e integridade física e emocional. Se preciso, o Estado deve prover o abrigamento dessas crianças e adolescentes, quando expulsos de casa ou maltratados pela família, preferencialmente sob a tutela de famílias cadastradas para essa finalidade, mas também em instituições de apoio quando a adoção temporária ou permanente não for possível.

Aliás, essa é outra questão séria. Os abrigos para menores têm se tornado escolas de crime. Certamente, os abrigados LGBT passam por dissabores inimagináveis nas mãos de funcionários destas casas e de colegas abrigados homofóbicos, transfóbicos e com graves distúrbios mentais. O que se pode fazer para transformar essa realidade? Crianças e adolescentes que nunca cometeram sequer um delito acabam sendo duplamente vitimadas em locais onde deveriam ser protegidas, nutridas, educadas e estimuladas a uma vida honesta, produtiva e feliz.

2. As pessoas LGBT que já tenham concluído o ensino médio e que sejam carentes financeiramente costumam vir de escolas públicas, podendo se cadastrar na reserva de vagas que já existe para esse segmento e se forem afrodescendentes, poderão ainda optar pelas cotas raciais. Isso quer dizer que já são contempladas nesse recorte.

3. Se a pessoa LGBT teve oportunidade de estudar em boas escolas (e muitas têm) e de ter uma família acolhedora, seja porque ainda não saíram do armário ou porque suas famílias realmente respeitam sua orientação sexual e/ou sua identidade de gênero, não há razão que justifique qualquer reserva de vaga aqui. Ela deverá concorrer com todas as outras pessoas sem qualquer ressalva, seja pelo vestibular ou pelo ENEM, pois está em condições semelhantes às dos demais candidatos.

Agora, falando sobre combate à homofobia e transfobia, parece-me que os ativistas LGBT do Brasil deveriam seguir o modelo americano e europeu de proteção aos estudantes LGBT nas escolas de ensino elementar, fundamental e médio, garantindo que estes consigam concluir essa fase básica para terem acesso ao mercado de trabalho, à universidade ou a ambos ao mesmo tempo. 

É preciso chamar atenção para outro ponto aqui: nem tudo se resume ao ensino superior. É bobagem achar que só quem tem ensino superior pode conquistar segurança financeira e conforto. Há técnicos que ganham mais do que muita gente graduada e até pós-graduada. O Brasil vem crescendo nas áreas de turismo, extrativismo mineral, petróleo, indústria naval, entre outras. Jovens secundaristas com boa formação técnica podem até adiar ou nem fazer graduação universitária e conquistar independência financeira em pouco tempo. O Estado deve ser cobrado em termos de oferecer cursos técnicos de qualidade no ensino médio. Esse deveria ser o enfoque prioritário. Até, porque depois disso, se o jovem não conseguir vaga em universidade pública, poderá optar pelas particulares e bancar sua própria formação, como tanta gente faz com muito ou com relativamente pouco dinheiro.

Outra coisa que devíamos aprender com o Norte (EUA/Europa) é como garantir a inserção do profissional LGBT no mercado de trabalho. Isso, sim. Porque não importa a qualificação da pessoa LGBT, se ela for entrevistada por um empregador homofóbico ou transfóbico, não será contratada, mesmo que tenha diploma de Harvard. A razão real nunca será dita. Esses empregadores não são idiotas a esse ponto. Justificarão com alguma desculpa esfarrapada e preterirão a pessoa LGBT. 

O enfoque da luta, portanto, deveria ser em legislação trabalhista que garanta que toda empresa tenha funcionários LGBT capacitados perfazendo entre 5% e 10% do seu quadro total. Isso evitará que toda pessoa transexual seja preterida tão logo se perceba que ela não é cisgênera (anatomia de nascença combinando com a identidade de gênero), mas transgênera (fez algum tipo de adequação do corpo ao gênero com o qual se identifica), a despeito de sua capacidade profissional. Discriminação semelhante é feita de modo recorrente contra gays ou lésbicas mais afetados (ele mais feminino e ela mais masculina), dependendo da empresa ou do ramo de negócio.

Quem souber ler em inglês poderá acessar esse relatório como um ponto de partida para reflexões mais profundas a esse respeito:


Network of socio-economic experts in the non-discrimination field 
VT-2008-007 

SYNTHESIS REPORT 2010 

PART I - THE SITUATION OF LGBT GROUPS 
IN THE LABOUR MARKET IN EUROPEAN MEMBER STATES 

Barbara van Balen, Ursula Barry, 
Ronald Holzhacker, Elisabeth Villagomez, Katrin Wladasch

http://ec.europa.eu/justice/discrimination/files/sen_synthesisreport2010parti_en.pdf



Concluindo: 

Sou contra o estabelecimento de cotas universitárias para pessoas LGBT por ver que estas se encontram incluídas nas cotas para afrodescendentes e/ou estudantes de escolas públicas. As pessoas LGBT que concluíram seus estudos em escolas particulares não tem razão para obter qualquer favorecimento exclusivamente por sua orientação sexual ou identidade de gênero. Entenda melhor o que quero dizer com isso, lendo Como é feita a distribuição das cotas? no final desse post.

Penso que o esforço dos ativistas LGBT, educadores, defensores dos direitos básicos, governantes, entre outros profissionais deve ser o de promover o respeito à diversidade sexual e de gênero nas escolas, averiguar denúncias de maus-tratos em casa, com o devido tratamento da família, a implantação de cursos técnicos de qualidade nas escolas de ensino médio, e políticas afirmativas bastante assertivas em relação à empregabilidade das pessoas LGBT devidamente capacitadas e injustamente preteridas por causa do preconceito da empresa ou do entrevistador.


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O presidente do STF disse ainda que muito deve ser feito para que o país tenha “pelo menos uma aceitável igualdade de oportunidades para todos os nossos concidadãos”. Para Barbosa, o Estado tem o dever de garantir a igualdade de todos, principalmente com políticas públicas para quem se encontra em situação de vulnerabilidade. Para referendar a política de cotas o presidente do STF citou Aristóteles e também Rui Barbosa: “O princípio da igualdade consiste em tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam”.

A decisão do Supremo completa um ano na sexta-feira, dia 26. Na ocasião foi votado por unanimidade que é constitucional a adoção de políticas de cotas raciais em instituições de ensino. Dos 11 ministros do tribunal, somente Dias Toffoli não participou do julgamento porque elaborou parecer a favor das cotas quando era advogado-geral da União. A ação julgada, protocolada pelo DEM, questionou o sistema de cotas raciais na UnB, com reserva de 20% das vagas do vestibular exclusivamente para negros e vagas para índios independentemente de vestibular.

Leia mais aqui: Correio Braziliense
https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/politica/2013/04/22/interna_politica,361893/presidente-do-supremo-defende-cotas-raciais-durante-homenagem-em-ouro-preto.shtml

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NO PORTAL DO MEC, as perguntas mais frequentes sobre cotas para universidades:

http://portal.mec.gov.br/cotas/perguntas-frequentes.html


Uma das perguntas mais comuns:


Como é feita a distribuição das cotas?

As vagas reservadas às cotas (50% do total de vagas da instituição) serão subdivididas — metade para estudantes de escolas públicas com renda familiar bruta igual ou inferior a um salário mínimo e meio per capita e metade para estudantes de escolas públicas com renda familiar superior a um salário mínimo e meio. Em ambos os casos, também será levado em conta percentual mínimo correspondente ao da soma de pretos, pardos e indígenas no estado, de acordo com o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).


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