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Sexo, Gênero e Identidade: Uma Perspectiva Científica

Sexo, Gênero e Identidade: Uma Perspectiva Científica

Definições de Mulher, Homem e Pessoa Não-Binária


Por Sergio Viula



Uma mulher é uma pessoa cuja identidade de gênero se alinha com as características sociais, comportamentais, culturais e/ou físicas que ela associa à feminilidade.

Semelhantemente, um homem é alguém cuja identidade de gênero se alinha com as características que ele associa à masculinidade.

Uma pessoa não-binária é aquela cuja identidade de gênero não se alinha nem com sua percepção de masculinidade, nem com sua percepção de feminilidade.

O uso de “e/ou” indica que a identidade de gênero pode se alinhar com diferentes características simultaneamente, não sendo necessário que todas se apliquem ao mesmo tempo. Assim, mesmo que uma mulher apresente comportamentos ou aparência tradicionalmente masculinos, ela continua sendo uma mulher se essa for sua identidade de gênero; e um homem, mesmo com comportamentos ou aparência tradicionalmente considerados femininos, continua sendo homem se essa for sua identidade de gênero.


Masculino e feminino não tem nada a ver com o sexo biológico ou com a orientação sexual

Em outras palavras, mulheres "masculinizadas" e homens "efeminados" não são necessariamente pessoas trans, visto que a transgeneridade refere-se à condição de uma pessoa cuja identidade de gênero difere do sexo que lhe foi atribuído no nascimento — o que não é o caso de alguém simplesmente estereotipado como "mulher masculinizada" ou "homem efeminado".


Sexo e Gênero: Distinções Fundamentais

Sexo refere-se às características biológicas e anatômicas associadas ao masculino ou feminino, incluindo cromossomos, genitália, gônadas e composição hormonal.

Gênero, por outro lado, é uma construção social que envolve papéis, comportamentos, normas culturais e identidades atribuídas a cada sexo.


Pessoas transgêneras existem e devem ser respeitadas como tais
Vale lembrar que pessoas trans são bissexuais, homossexuais, heterossexuais, etc.,
assim como qualquer pessoa não trans (ou cisgênera).


Tentar definir "homem" ou "mulher" exclusivamente com base em características biológicas ignora a complexidade da identidade de gênero e a diversidade humana. Por isso, conceitos como "macho" e "fêmea" não equivalem a "homem" e "mulher" do ponto de vista da identidade.

Em outras palavras, "homem" e "mulher" são categorias construídas socialmente, que dialogam com fatores culturais, comportamentais e psicológicos, enquanto "macho" e "fêmea" se referem ao sexo biológico, baseado em critérios fisiológicos e reprodutivos. Portanto, uma pessoa pode ter sexo biológico masculino (macho) e ainda se identificar como mulher, ou ter sexo biológico feminino (fêmea) e se identificar como homem.


Sexo Biológico: Uma Realidade Multivariada

Sexo é tipicamente categorizado como binário, mas na prática é multivariado. Nenhum marcador isolado determina o sexo de um indivíduo.


É fundamental entender que o trabalho artístico de uma drag queen (homem vestido como mulher) ou de drag king (mulher vestida como homem) não tem nada a ver com transgeneridade.


É possível falar de diferentes dimensões do sexo biológico:

  1. Dimensão cromossômica: XX, XY ou variações como XXY, X0
  2. Dimensão genética: Genes que influenciam o desenvolvimento sexual
  3. Dimensão gonadal: Ovários, testículos, gônadas ovotestes (órgãos que apresentam tanto tecido ovariano [produtor de óvulos] quanto tecido testicular [produtor de esperma], reforçando que o sexo não é realmente binário)
  4. Dimensão fenotípica: Genitália, seios, pênis, vulva
  5. Dimensão hormonal: Níveis de testosterona, estrogênio, progesterona

Nenhum desses marcadores isoladamente equivale a “homem” ou “mulher”.


Pessoas Intersexo: Uma Realidade Comum e Invisibilizada

Pessoas intersexo possuem características sexuais que não se encaixam claramente nos padrões médicos e sociais para corpos femininos ou masculinos.

Segundo a ONU, entre 0,05% e 1,7% da população mundial é intersexo, o que equivale a cerca de 136 milhões de pessoas — aproximadamente a população da Rússia. Muitas são classificadas como homens ou mulheres por conveniência. Geralmente, não desejam ser categorizadas como “terceiro sexo”, mas buscam reconhecimento, representação e respeito por sua identidade. No Brasil, existe uma associação que trabalha pelos direitos das pessoas intersexo. Ela se chama ABRAI (Associação Brasileira Intersexo). Conheça o trabalho deles: https://abrai.org.br/


O Caso dos Guevedoces

A palavra guevedoce, etimologicamente, significa "ovos aos doze". Isso alude ao fato de que essas crianças identificadas como fêmeas desenvolvem um pênis a partir dos doze anos e passam a agir como homens, ao contrário do que se pensava até então.


Um exemplo emblemático são os guevedoces, uma população na República Dominicana. Esses indivíduos nascem com genitália externa feminina devido a uma deficiência na enzima 5-alfa-redutase, que impede a conversão adequada de testosterona durante o desenvolvimento fetal. Ao nascer, muitas dessas pessoas são identificadas por médicos e familiares como meninas, mas, durante a puberdade, experimentam um aumento considerável nos níveis de testosterona, o que leva ao desenvolvimento de testículos e pênis. A partir desse momento, muitos guevedoces passam a viver como homens. Este caso evidencia que sexo biológico e identidade de gênero nem sempre estão alinhados e que categorias rígidas, baseadas apenas em genitália ou cromossomos, são insuficientes.


Síndrome de Swyer

Outra condição que ilustra a diversidade biológica é a síndrome de Swyer, na qual indivíduos com cromossomos XY apresentam fenótipo feminino. Pessoas com essa síndrome podem ter genitália externa feminina e gônadas subdesenvolvidas, geralmente denominadas gônadas estéreis, que não produzem óvulos nem espermatozoides. Apesar disso, algumas mulheres com síndrome de Swyer conseguiram engravidar utilizando óvulos doados e técnicas de reprodução assistida, como a fertilização in vitro, já que possuem útero funcional.

Essa condição demonstra que o sexo cromossômico (XY) não determina de forma absoluta o fenótipo ou a capacidade reprodutiva, reforçando que sexo biológico e identidade de gênero são conceitos distintos. De forma análoga, embora menos comum, existem situações em que pessoas com cromossomos XX podem desenvolver características típicas masculinas ou, em casos intersexo, homens podem ter útero ou outros tecidos reprodutivos femininos. Esses exemplos mostram que categorias rígidas baseadas apenas em cromossomos ou órgãos sexuais não capturam toda a complexidade da biologia humana e da identidade de gênero.


Sexo e Gênero Não São Sinônimos

O consenso científico, aceito por grandes associações médicas, como a American Medical Association (AMA) e a American Psychiatric Association (APA), por sociedades de endocrinologia, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e por diversos sociólogos e antropólogos, é que sexo e gênero são conceitos distintos e nem sempre congruentes. Sexo refere-se às características biológicas e fisiológicas, incluindo cromossomos, gônadas, genitália e composição hormonal, enquanto gênero envolve papéis sociais, comportamentos, normas culturais e identidades subjetivas. Negar essa distinção é comparável a negar fatos amplamente comprovados, como a eficácia de vacinas, a teoria da evolução ou a forma esférica da Terra, pois ignora evidências científicas consolidadas.

Identidade de gênero é uma construção social que depende da autoidentificação do indivíduo, assim como acontece com identidades políticas ou religiosas. É uma forma de expressão e reconhecimento pessoal que não se reduz ao sexo atribuído ao nascimento, nem a características físicas observáveis. Essa perspectiva permite compreender a diversidade humana de maneira mais ampla, incluindo pessoas transgênero, não-binárias e intersexo, cujas experiências demonstram que identidade de gênero e sexo biológico não são necessariamente alinhados, mas igualmente válidos e respeitáveis.

Vale ressaltar que aquilo que se costuma denominar como "disforia de gênero", ou o desconforto significativo que uma pessoa sente em relação ao gênero atribuído ao nascer, tem bases biológicas reconhecidas pela ciência. Pesquisas indicam que fatores genéticos, hormonais pré-natais e neurobiológicos podem influenciar a identidade de gênero. Estudos com gêmeos sugerem uma componente hereditária, enquanto alterações na exposição a hormônios sexuais durante o desenvolvimento fetal podem afetar estruturas cerebrais ligadas à percepção de gênero. Neuroimagem mostra que regiões do cérebro de pessoas trans podem se assemelhar mais ao gênero com o qual se identificam do que ao sexo atribuído ao nascimento. Condições intersexuais, como guevedoces ou síndrome de Swyer, evidenciam que sexo biológico não é estritamente binário e contribuem para a diversidade de experiências de gênero. Embora fatores culturais e psicossociais influenciem a expressão de gênero, eles não “causam” disforia. Assim, a identidade de gênero é intrínseca, legítima e deve ser respeitada para garantir saúde mental e bem-estar.


A Complexidade do Critério Biológico

Alguns argumentos populares tentam definir “homem” ou “mulher” com base na capacidade reprodutiva ou em características anatômicas rígidas. No entanto, reproduzir não é um critério válido para determinar gênero: muitas pessoas cisgênero não podem ou não desejam se reproduzir, mas isso não as torna menos homens ou mulheres. De forma semelhante, embora mulheres sejam tipicamente anatômica e cromossomicamente fêmeas, nem sempre é o caso; homens são tipicamente XY, mas podem apresentar variações genéticas como XXY ou X0.

A ciência moderna demonstra que o sexo biológico deve ser entendido como um espectro de características, incluindo cromossomos, gônadas, genitália e hormônios, e que o modelo binário “homem-mulher” é apenas uma convenção prática, não uma regra absoluta da natureza. Essa perspectiva permite incluir pessoas intersexo, assim como casos específicos como os guevedoces da República Dominicana — que nascem com genitália feminina e desenvolvem órgãos sexuais masculinos na puberdade — e a síndrome de Swyer, em que indivíduos XY podem desenvolver fenótipo feminino e até gerar filhos com óvulos doados. Tais evidências reforçam que categorias rígidas de “homem” e “mulher” não capturam a complexidade do sexo biológico nem a diversidade das identidades de gênero.


Conclusão: Inclusão e Reconhecimento

Negar a diversidade de sexo e gênero não é apenas ignorar evidências científicas consolidadas, mas também desconsiderar experiências reais de milhões de pessoas. Respeitar a identidade de gênero, baseada na autoidentificação, é fundamental para garantir inclusão, dignidade e direitos humanos, prevenindo discriminação, violência e marginalização. Quando a transgeneridade é demonizada, criminalizada ou desconsiderada socialmente, os indivíduos enfrentam consequências graves: maiores índices de depressão, ansiedade, suicídio, abuso físico e psicológico, exclusão escolar e profissional, além de barreiras ao acesso a serviços de saúde adequados.

Pessoas trans e intersexo existem e merecem respeito

No Brasil, em 2024, foram registrados 122 assassinatos de pessoas trans e travestis, evidenciando que o país continua sendo o mais letal para essa população no mundo. Além disso, o Disque 100 registrou 4.482 violações de direitos humanos contra pessoas trans em 2023, incluindo agressões físicas, psicológicas, discriminação e ameaças. Estudos também indicam que pessoas trans têm até 16 vezes mais chances de sofrer de depressão e 11 vezes mais de ansiedade em comparação com a população geral, devido à transfobia estrutural e barreiras no acesso à saúde. 

A sociedade como um todo também sofre prejuízos quando se nega ou se deslegitima a identidade de gênero. Políticas públicas que não reconhecem pessoas trans contribuem para desigualdades estruturais, aumento da violência social e desperdício de potencial humano. Por outro lado, o reconhecimento e o respeito à autoidentificação promovem coesão social, inclusão e bem-estar coletivo.

Compreender o gênero como construção social e o sexo como um sistema biológico multivariado permite perceber a complexidade da experiência humana, sem reduzir indivíduos a estereótipos, simplificações ou casos isolados. Excluir ou ignorar essa realidade significa perpetuar injustiças, reforçar preconceitos e negar direitos fundamentais a pessoas trans e intersexo, enquanto aceitar e validar essas identidades contribui para sociedades mais justas, inclusivas e saudáveis.


Assista a esse vídeo para mais alguns pensamentos: Autodeterminação e gênero

Eu não sei ser hétero - por Rafael Amorim

Eu não sei ser hétero

Por Rafael Amorim: http://www.facebook.com/fael.boring
Visite o Caneta Esferográfica: http://canetaesfereografica.blogspot.com.br




Eu não sei ser hétero, não sei mesmo. Sei lá, não consigo me adaptar. Queria ser, talvez fosse uma vida legal, normal, ausente de qualquer preocupação mental e física. Seria o máximo sair com meninas, beijá-las, e até ficar excitado. Mas isso tudo não se resume ao sexo, não é? Que ideia louca de pregar a heterossexualidade como ato de procriação e perpetuação da espécie. Seria nos tratar como animais, como cobaias para superlotar um planeta já superlotado.

Diante de algumas citações que incitam o ódio que li durante a semana, fiquei realmente pensando se não seria melhor eu fazer um pouco mais de esforço e virar um heterossexual. Li sobre um pastor que diz que é pecado ser gay, sem contar no insulto que ele propagou sobre negros e católicos. Confesso, fiquei com muito medo. Me senti coagido com tal discurso. Será mesmo que Deus condena a prática do amor entre dois homens? Talvez não precise se tratar de amor, mas de dois homens estarem juntos. Ir contra isso é uma visão que me assusta e me deixa com medo de sair na rua. Ora, eu não quero ser chamado de demônio ou coisa pior na rua. Convenhamos que ninguém quer.

Eu quero levar uma vida normal, quase como uma vida de hétero. Eu não sou tão ruim assim. Tive boas notas no colégio, sempre ajudo a quem precisa, sou um filho direito, não me drogo, não dou dor de cabeça para os meus pais... Mas tenho esse defeito de fábrica. Fui produzido com algo diferente que me destacou. Nasci gay. Gosto de pensar dessa forma, é uma boa maneira de amenizar uma possível culpa por ser como sou. Meus genes devem ser iguais aos seus ou de qualquer hétero que passe por mim na rua, mas no fundo em devo ter algo de diferente dentro de mim. Cientifica, mental ou até espiritualmente.

Eu não penso em casar ou ter filhos, mas posso começar a partir de hoje se me prometerem que heterossexualidade é sinônimo de felicidade. Ai eu posso ficar mais tranquilo se me derem o atestado da felicidade de uma vida hétero. Posso passar a pensar em ter uma família, uma esposa, um filho... Mas se eu virar hétero e tiver tudo isso, ensinarei a eles que não se deve discriminar ninguém pelo seu defeito de fábrica. Não só por isso, mas pela sua cor, sexo, visão política, religiosa, filosófica e social. Quero ser um hétero do bem e ensinar ao meu filho que preconceito não leva a nada. Que se ele quiser acreditar em Deus, que acredite num Deus bom, e não no deus tirano que tentam me obrigar a conhecer. Porque será assim, meu filho vai acreditar se quiser, mas independente de qualquer crença em que ele se sinta bem, lhe ensinarei valores para com sua própria vida para que não falte com respeito a quem não pensa como ele. Será um filho que não terá medo de fazer as coisas de mulherzinha (e ele nunca ouvirá essa expressão da minha boca), que não se sentirá mal quando uma menina for melhor que ele em alguma atividade, saberá respeitar idosos e expor sua opinião de forma sábia. Contarei com minha esposa para essa missão quase impossível.


 

Eu não quero que meu filho entre numa igreja por se sentir bem e saia coagido com um discurso sobre ódio. Assim como não quero que ele se sinta bem sendo ateu mas menosprezando a cultura do candomblé, do catolicismo ou qualquer outra crença. Quero um filho são, salvo de qualquer preconceito. Um filho que caso se sinta atraído por meninos, entenda isso como orientação e não opção. Que veja como um presente e não um defeito de fábrica, como me foi imposto.

São essas as exigências que faço para uma vida hétero. E que tendo uma mulher, ela saiba me respeitar como marido, não sendo submissa, mas criando um diálogo sempre que se sentir insegura com alguma ação minha. Tendo um filho saudável e livre de falsos padrões, que não duvide que dois pais gays ou duas mães lésbicas sejam inferiores ou menos eficazes quanto eu e sua mãe na criação de uma criança. Se essa vida hétero me fizer mais feliz, eu aceito e assino onde for. Mas parte de mim não acredita tanto. Não que héteros não sejam felizes, conheço muitos que são e os admiro. Só não gosto de ver um discurso anti-homossexual das pessoas que parecem não enxergar as atrocidades que acontecem com famílias normais. Eu não quero voltar a ver casos de filha que mata os pais, ou de pais que jogam criancinhas da janela do prédio... Eu quero ligar a TV e me certificar de que o mundo está mudando. Que a vida hétero é tão feliz e construtiva quanto a gay. Sou contra crianças presenciarem brigas dos seus pais, e sou mais contra do abandono de mães que rejeitam seus filhos na lixeira mais próxima.

Quando contei para os meus pais dessa minha condição de fábrica, o mundo caiu. Minha cabeça não estava preparada para ouvir tudo o que ouvi. Foi um choque, claro que foi. Mas depois de um tempo eu ouvi meu pai dizer que tudo bem se aquela era a minha opção, contanto que eu não fosse promíscuo. Sempre fico confuso com aquilo até hoje. O que ele, com seus cinquenta e poucos anos, deve entender por promiscuidade? Seria promiscuidade se eu fosse para uma boate e pegasse pelo menos cinco meninas? Acho que não, acho que seria coisa de macho. E se eu saísse com meninos diferentes a cada final de semana, isso seria? Tudo me faz crer que sim. Mas eu não o julgo, e nem posso. Ele é meu pai, não teve o excesso de informação que nós, mais jovens, temos hoje. Talvez ele só fique mesmo preocupado, coitado.

Eu acho que não sei ser hétero mesmo. Eu não sei tentar ser algo que não sou. Não fui ensinado assim. Parece que pra ser hétero você precisa hostilizar o outro, chamando-o de bichona, bichinha, veadinho, mariquinha, mulherzinha... Eu não me acostumo com isso. Não quero ser um hétero assim. Quero ser um hétero como os que convivem comigo, não como os estereótipos ambulantes que sou obrigado a presenciar nas ruas e nas mídias. Não quero ter uma visão sexual ao ver duas mulheres, não quero ficar excitado com isso. Quero imaginar que ali existe uma relação de cumplicidade e afeto.

Pensando melhor, depois de todas essas questões, olhando por uma outra ótica, não preciso tentar me curar ou me enquadrar em um padrão estabelecido. Eu gosto do meu defeito, e tenho encarado-o como uma dádiva. Eu sou uma pessoa do bem, um cidadão que não precisa ser julgado se é gay, hétero, bissexual, transexual... Eu gosto de ser eu mesmo e gosto de acreditar que todas as pessoas precisam ser assim. Que todos ao meu redor feche os olhos do preconceito e abra os do respeito. Nós não nascemos com rótulos e de fato a única condição que nos é imposta quando viemos ao mundo é a de ser humano. A partir dai, a diferença está nos olhos de quem vê.




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COMENTÁRIO DESTE BLOGUEIRO


Parabéns pela sinceridade e honestidade com que desabafou nesse texto, Rafael Amorim. Pode crer que muita gente já tentou aprender a ser hétero, mas só perdeu tempo. Eu mesmo fiquei 18 anos nessa escola, sem contar o tempo fora de igreja evangélica, quando já tinha preconceitos enfiados na minha tenra infância pela sociedade e família. Digo a todos e t doas que não vale a pena.

Fico feliz por saber que sua 'confissão' de impotência diante do desafio de alterar sua orientação sexual não esconde uma tristeza, mas revela um certo orgulho de ser você mesmo, do jeito que você é, ou seja, entre diversas outras virtudes, você também tem essa - a de ser gay! ;) E mais: revela a igualdade de ambas as orientações em termos de naturalidade. É da natureza. Tantos os bichos não-humanos como o bicho-homem demonstram isso.

Para quem já sabe que não vale a pena se submeter a essas loucuras pregadas em nome da heteronormatividade, assim como para aqueles que ainda nutrem dúvidas, sugiro a leitura de Em Busca de Mim Mesmo. Deem uma olhada:




Leia EM BUSCA DE MIM MESMO.


Leitura refrescante em tempos de fundamentalismo religioso e embates heroicos em prol das liberdades civis. Veja como aqui:

https://www.amazon.com.br/Busca-Mim-Mesmo-Sergio-Viula-ebook/dp/B00ATT2VRM

Direito à identidade: Viva seu nome - 29 de Janeiro: Dia da Visibilidade Trans

Luisa Helena Stern




Direito à identidade: Viva seu nome


27/01/2013 - 8:19 pm - REVISTA FORUM


Mutirão de ações judiciais marcará o Dia da Visibilidade Trans em Porto Alegre



Por Luísa Helena Stern


No Brasil, 29 de janeiro é considerado o Dia Nacional da Visibilidade Trans. Em 2004, esse foi o dia de lançamento da campanha “Travesti e Respeito”, realizada pelo Ministério da Saúde em parceria com os movimentos sociais. Sendo, posteriormente a data estendida a todas as identidades trans.

Sem dúvida alguma, um dos maiores problemas enfrentados pelas pessoas trans é a falta de respeito com a sua identidade, sendo geralmente tratadas pelo nome de registro, no gênero diferente do qual vivem e se identificam, o que serve como base para que ocorram diversas outras formas de discriminação, como a evasão escolar desde cedo e a negação de oportunidades no mercado formal de trabalho.

As possibilidades de se resolver esse problema são restritas, pois a legislação brasileira só admite a alteração do prenome, em situações excepcionais e por meio de processo judicial. E muitas pessoas que necessitam não têm acesso à Justiça, por falta de informação e/ou por falta de recursos para arcarem com honorários de advogados e custas judiciais.

Para atender essa necessidade, a ideia de se realizar um mutirão de processos judiciais de retificação do registro civil foi debatida e estabelecida como proposta em vários encontros, pelo movimento social de travestis e transexuais.

Neste sentido, no final do ano passado, a Igualdade-RS e o grupo G8-Generalizando do SAJU/UFRGS estabeleceram uma parceria, criando o projeto chamado “Direito à Identidade: Viva seu Nome” para realizar esse mutirão, que ainda conta com o apoio do NUPSEX/UFRGS.

No próximo dia 29 de janeiro, será realizado um ato público para defender o Direito à Identidade das pessoas trans, e depois uma caminhada até o Foro Central de Porto Alegre para a entrega dos processos.

O ato também servirá para chamar a atenção do Supremo Tribunal Federal e do Poder Legislativo para esse problema, pois desde 2010 que a ADIn 4275 tramita no STF, sem perspectiva de julgamento próximo, e temos vários projetos de Lei tramitando no Congresso Nacional, novos e antigos, sem a perspectiva de aprovação.

Enquanto isso, o Brasil vai ficando para trás em relação a países como Espanha, Argentina e Uruguai, onde já é possível que travestis e transexuais possam alterar seus nomes diretamente em cartório, sem a necessidade de recorrer ao Judiciário.

É importante dizer ainda, que esse trabalho está recém começando, pois o G8-Generalizando, a Igualdade-RS e o NUPSEX se propõem a continuar fazendo os processos de alteração do registro civil de maneira gratuita para a população de travestis e transexuais e debatendo o assunto em outras instâncias, para marcar o nosso desejo por uma sociedade sem preconceitos, na qual cada indivíduo tenha autonomia para realizar as escolhas de como viver sua própria vida.


* As entidades participantes dessa atividade são:

- ONG Igualdade-RS: Associação de Travestis e Transexuais do Rio Grande do Sul

- G8-Generalizando: Grupo de Direitos Sexuais e de Gênero do Serviço de Assessoria Jurídica Universitária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – SAJU/UFRGS

- NUPSEX: Núcleo de Pesquisa em Sexualidade e Relações de Gênero da UFRGS.

** Luisa Helena Stern é mulher transexual, ativista dos direitos LGBT na ONG Igualdade-RS e advogada voluntária no grupo G8-Generalizando do SAJU/UFRGS


Luísa Helena Stern é advogada, militante dos direitos humanos e direitos LGBTT

Por que amar faz bem?



“O amor é a alegria acompanhada da ideia de uma causa externa” (Spinoza)


Por Sergio Viula



A alegria, segundo o filósofo moderno Spinoza, é o sentimento que fortalece a vida, enquanto a tristeza a enfraquece. Como “toda coisa, enquanto está em si, se esforça por permanecer no seu ser” (Ética III, prop. 6), é natural que os seres humanos valorizem a alegria mais que tudo. E a esse esforço por permanecer em seu ser, Spinoza chama conatus (esforço em latim).

Todavia, por alegria, Spinoza entende algo bem diferente da euforia que certas experiências ou substâncias podem criar. A alegria é um sentimento que fortalece nosso conatus e enriquece nossa capacidade potencial: alegria, tristeza e desejo, são fundamentais para a manutenção do conatus, já que é através deles que podemos acrescentar essência a nossa existência.

Deixando Spinoza por um momento, sem abandoná-lo (rs), é fato que existe alegria em coisas tão simples quanto comer quando se tem fome, beber quando se tem sede, dormir quando se tem sono, sentir-se protegido, acolhido, amado. Inversamente proporcional ao efeito da alegria sobre o fortalecimento do ser, a tristeza enfraquece, esvazia a potência de viver. No entanto, ela é útil, caso ao tentarmos evita-la, aprendamos a nos afastar daquilo que a promove.

E o amor? O amor, voltando a Spinoza, é a alegria acompanhada de uma ideia de causa externa. Ou seja, atribuímos a alegria que sentimos quando estamos na presença do objeto de nosso amor a esse objeto mesmo e, por isso, queremos mais dele; queremos passar mais tempo com ele; queremos fazer-lhe bem do mesmo modo que pensamos que ele nos faz. Por isso, o amor não faz mal ao seu objeto. Mas, até nisso é preciso que o amante faça bom uso da razão para não sufocar o amado com algum comportamtento ciúmento ou possessivo. Uma boa dose de racionalidade é proveitosa até para o amor.

Digo que amo meus filhos, porque a mera existência deles me enche de profunda alegria. Digo que amo meu marido, porque só a ideia de que ele existe e que me faz bem me enche de alegria. Por isso, amar faz tanto bem à vida – porque o amor é alegria! E que amor poderia ser mais fortalecedor do que o amor próprio? Sim, porque ele é nossa alegria encontrando sua razão de ser em nós mesmos – alegria que me alimenta produzida a partir de mim mesmo. É quase uma fotossíntese existencial, sendo o ódio ou desprezo por si mesmo o inverso disso: tristeza que enfraquece e destrói o ser.

Por que alguns homossexuais sofrem tanto? Talvez a resposta esteja aí mesmo. Falta-lhes amor – essa alegria acompanhada da ideia de uma causa externa. E não parece estranho que a palavra mais usada para homossexual no mundo hoje seja “gay”, isto é, alegre?

Mas, que não se conclua precipitadamente que os homossexuais não amam ou não experimentam a alegria da qual a palavra “gay” fala tão belamente. Eu mesmo acabei de citar quatro dos meus amores: meus dois filhos, meu parceiro e eu mesmo! Há outras pessoas que eu amo – meus pais, por exemplo. Amo até minha faceira e peralta cachorrinha – a alegria em pessoa (pessoa?) kkkk

Mas voltando ao amor próprio, eu diria que amar-se é regozijar-se em si mesmo! E isso é fundamental para a saúde física e psíquica – tudo isso igualmente corpo! E é também o melhor caminho para enxergar no outro o que ele tem de melhor e alegrar-se nisso. E se me alegro de modo tão especial em função do outro, é claro que vou querer mantê-lo próximo e tornar sua existência tão feliz quanto acredito que ele torne a minha. Quando isso acontece em via de mão dupla e em proporções semelhantes, eis aí um grande amor. E esse amor pode ser – e, de fato tem sido – experimentado por pessoas de todos os gêneros e orientações sexuais: homens e mulheres bi, hetero, homo, trans, enfim.

Todos desejamos! E só desejamos aquilo que nos parece bom. Porém, aquilo só nos parece bom, porque o desejamos. E isso diz muito a respeito de nós mesmos, mais até do que sobre os outros, sejam pessoas, coisas, animais, experiências, memórias, enfim. Achamos bom aquilo que nos dá ou aumenta a alegria que sentimos, e por isso mesmo não há quem possa desprezar o objeto de seu amor, porque o objeto de seu amor é aquilo que está associado a sua mais pura e intensa alegria. Quando amamos consideramos a pessoa amada a melhor pessoa do mundo! Mas, nós a amamos porque ela é mesmo a melhor pessoa do mundo ou ela nos parece a melhor pessoa do mundo porque a amamos?

Amor é alegria, e a alegria fortalece a potência da vida. Cultive seu amor, aumente sua alegria, e sua vida permanecerá forte e saudável enquanto for possível perseverar no seu ser. E isso, ao contrário do que muita gente pensa, não é apenas uma questão emocional. A razão está – e precisa mesmo estar – profundamente relacionada à alegria e ao desejo. E à medida que a razão se desenvolve, o nosso conhecimento aumenta e nos torna capazes de organizar nossas relações com o mundo de modo a incentivar o predomínio das paixões alegres sobre as tristes.

Vale lembrar que, conquanto o cultivo das paixões alegres seja importante, ele não é objetivo principal da vida racional e nem da ética. O que interessa mesmo é deixar de ser passivo diante das afecções e afetos e agir de modo racional. O desenvolvimento da razão, principalmente quando formamos noções comuns sobre a própria vida afetiva, é acompanhado de técnicas que permitem atenuar os efeitos da imaginação e do conhecimento sensível que regem a vida passional. Assim, pouco a pouco, todas as relações cognitivas e afetivas da vida mental vão sendo transformadas em proveito para a atividade. 
E como ninguém nasce absolutamente livre, resta-nos criar a liberdade a partir do reconhecimento do que sou e do que posso ser. Para Spinoza, a liberdade é a identidade de si consigo. E não é isso exatamente o que mais desejamos: sermos simplesmente idênticos a nós mesmos, ou seja, pensar, sentir e agir de acordo com nosso próprio ser? Não dá para ser feliz tentando ser outro que não si mesmo. Não me admira que tenha enfraquecido soterrado pela tristeza típica do “armário” e de tudo o que ele representava para mim, e que tenha me sentido intensamente vivo a partir do momento em que sintonizei a minha própria frequência existencial fora dele. Esta, porém, foi apenas uma – talvez a mais importante – mudança que eu fiz para viver essa identidade de mim comigo. E foi ela que também me proporcionou a oportunidade de viver intensa e publicamente o amor que sinto por quem, felizmente, me ama do mesmo jeito.

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