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Rio capacita 7,2 mil policiais para atender comunidade LGBT




Rio capacita 7,2 mil policiais para atender comunidade LGBT até o fim do ano
 
Projeto é realizado pelo Programa Estadual Rio Sem Homofobia e pela Secretaria de Estado de Segurança


por Portal Brasil
Publicado: 06/04/2014 17:54
Última modificação: 06/04/2014 17:54


A Segunda Jornada Formativa de Segurança Pública e Cidadania LGBT formou, no período de junho de 2013 a março de 2014, 3,2 mil policiais militares e civis e peritos do Rio de Janeiro. Até o fim do ano, o número deve subir para 7,2 mil profissionais da área de Segurança do estado capacitados para o atendimento adequado e respeitoso a lésbicas,gays, bissexuais, travestis e transgêneros. O projeto é realizado pelo Programa Estadual Rio Sem Homofobia e pela Secretaria de Estado de Segurança.

O coordenador do programa, Cláudio Nascimento, informou que na Primeira Jornada - realizada entre 2009 e 2011, 4 mil policiais militares e civis passaram pela formação. Ele disse que relatos da comunidade LGBT indicam que já é possível notar diferença no comportamento dos profissionais de segurança, mas revelou que os resultados mais expressivos serão notados em poucos anos. A participação nas aulas também mudou. “Hoje os policiais perguntam mais se colocam mais, trazem exemplos da sua atuação profissional. Questionam aspectos do que a gente apresenta, no sentido da ligação desses conceitos com a abordagem policial. Ou seja, aumentou a participação na sala de aula para interagir com o conteúdo proposto”, disse Nascimento em entrevista à Agência Brasil.

Ele destacou que, na Segunda Jornada, o projeto evoluiu e ampliou o público com participação de profissionais recém-ingressados nas corporações, enquanto na primeira fase de formação havia apenas policiais que já estavam na ativa. Na quarta-feira (2), começaram as aulas sobre homofobia, cidadania LGBT e práticas policiais cidadãs para 450 novos inspetores e 100 peritos do estado, ministradas por coordenadores dos Centros de Cidadania LGBT do Rio Sem Homofobia. Serão nove encontros na Academia de Polícia (Acadepol), no centro do Rio, que terminarão no dia 17 de maio, Dia Mundial de Combate à Homofobia.
Para o coordenador, a escolha da data foi proposital. “A gente quer demarcar uma mudança significativa do reconhecimento que existe uma lacuna e que precisa haver uma resposta do Estado. A gente reconhece que o Estado - seja municipal, estadual ou federal, ao longo da história do país foi e continua sendo um dos grandes violadores dos Direitos Humanos. Nosso papel como gestor público é atuar para diminuir esse prejuízo para a população”, disse.

Outro avanço apontado por Cláudio Nascimento é que 500 policiais que trabalham nas delegacias e nos núcleos de atendimento à mulher passarão pelo treinamento para atender lésbicas e bissexuais. O número, segundo ele, representa 100% do efetivo nestas delegacias e o treinamento será feito de abril a agosto deste ano. “É uma abordagem específica sobre as demandas dessas mulheres”, completou.

A inclusão de peritos na formação também é avaliada pelo coordenador como um avanço. Para ele, isso é um diferencial, porque estas pessoas trabalham na cena do crime e por isso podem atuar para a preservação do local e facilitar as investigações. “Para preservar a cena, garantir uma atuação ética na entrada da casa do indivíduo, tentar entender a dinâmica e apurar as infirmações. É fundamental que a gente passe as informações para este profissional para ele compreender também as dimensões ligadas à nossa comunidade, porque às vezes acontece de um crime acabar não tendo uma elucidação, por não ter informações mais amplas, que permitissem ao perito ter uma visão mais apurada”, explicou.

Além do Rio, a jornada já passou por Niterói, Mesquita, São Gonçalo, Duque de Caxias, Volta Redonda, Queimados, São João de Meriti, Nova Friburgo, Petrópolis e até o fim do ano vai atingir todas as regiões do estado. As próximas etapas da Jornada serão realizadas em Macaé, na terça-feira (8) e Angra dos Reis, no sábado (15).

No município do Rio, as palestras foram realizadas em batalhões e delegacias de Botafogo, do Méier, de São Cristóvão, da Tijuca, do Leblon, de Copacabana, da Ilha do Governador, de Jacarepaguá, de Bonsucesso e Santa Cruz.

Fonte:
Agência Brasil


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COMENTÁRIO DESTE BLOGUEIRO

Parabéns ao Governo do Estado do Rio de Janeiro, ao Cláudio Nascimento e toda sua equipe do Rio sem Homofobia.

Vocês estão colaborando para transformar um aparato estatal que já serviu à ditadura e à repressão para servir de fato à democracia e a pluralidade que caracteriza nosso povo.
Continuem fazendo e ampliando esse bom trabalho.

ONU lança guia com obrigações dos Estados para proteção de direitos LGBT

ONU lança guia com obrigações dos Estados para proteção de direitos LGBT






17 de setembro de 2012 · Notícias

O Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) lançou na sexta-feira (14) um relatório com as principais obrigações legais que Estados devem aplicar para a proteção de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT). O documento, intitulado Nascido Livre e Igual (em inglês Born Free And Equal), busca explicar para gestores públicos, ativistas e defensores dos direitos humanos as responsabilidades do Estado com essa minoria e os passos necessários para alcançá-las.

“O objetivo de estender para pessoas LGBT as condições de todos os outros não é nem radical e nem complicado. Basea-se em dois princípios fundamentais que sustentam a lei internacional dos direitos humanos: igualdade e não discriminação”, disse a Alta Comissária para os Direitos Humanos, Navi Pillay, no prefácio do relatório.

O documento foca em cinco obrigações nas quais a ação nacional é mais necessária: proteção contra a violência homofóbica, prevenção da tortura, a descriminalização da homossexualidade, a proibição da discriminação e o respeito com a liberdade de expressão e com a reunião de todas as pessoas LGBT.

Por quase duas décadas, os órgãos de direitos humanos e relatores especiais têm documentado violações generalizadas em relação à população LGBT, nas quais estão incluídas atos de assassinatos, estupros e ataques físicos. Nascido Livre e Igual apresenta alguns exemplos dessas violações, como o caso de um casal lésbico que relata ter sido espancado em uma delegacia no Brasil e forçado a praticar sexo oral.

Relatório aqui: 
https://www.ohchr.org/sites/default/files/Documents/Publications/BornFreeAndEqualLowRes.pdf

ESTATUTO DA DIVERSIDADE SEXUAL - VÍDEO E CAMPANHA



Estatuto da Diversidade Sexual


Depois do julgamento do STF, que reconheceu as uniões homoafetivas como entidade familiar, é chegada a hora de assegurar direitos à população LGBT e criminalizar a homofobia. Apresentar ao Congresso Nacional este projeto de lei por iniciativa popular é a forma de a sociedade reivindicar tratamento igualitário a todos os cidadãos, independente de sua orientação sexual ou identidade de gênero. O respeito à diferença é a essência da democracia.

Já aderiu a Campanha?
Acesse a petição pública e assine:
http://bit.ly/IYDpuG

Republicanos criam associação para defender casamento gay nos EUA

Acredite se quiser: Republicanos criam associação para defender casamento gay nos EUA


Por João Marinho em 26/07/2012 às 18h01




Quando se pensa no Partido Republicano, dos Estados Unidos, a primeira imagem que vêm à mente é de políticos e eleitores conservadores, de tendência cristã, que se posicionam contra pautas mais progressistas, especialmente o casamento gay. Afinal, o próprio candidato do partido à presidência, Mitt Romney, confere com esse perfil.

No entanto, um grupo de republicanos parece estar engajado em mudar essa imagem, ou, pelo menos, em se posicionar contra as tendências homofóbicas que parecem reger a maior parte dos membros do partido.

Os Republicans United for Marriage (Republicanos Unidos para o Matrimônio) foi fundado nesta segunda-feira (23), no estado americano do Maine para - vejam só! - apoiar o casamento gay.

O anúncio da criação do grupo foi feito em uma coletiva de imprensa convocada pelas organizações Mainers United for Marriage e American Civil Liberties Union, que defendem o casamento igualitário no estado.

Os Republicans United nasceram pequenos, com cerca de 20 membros, mas sonham grande - e prometem ajudar na aprovação do casamento gay no Maine, bem como pressionar os demais republicanos "de dentro", para que mudem sua opinião quanto ao matrimônio entre pessoas de mesmo sexo.

"Votei contra o casamento entre pessoas de mesmo sexo no ano de 2009, mas mudei de opinião. Conheço alguns gays, conversei com eles e com minha família e tenho pensado muito sobre isso. Como marido e pai, concluí que duas pessoas que se amam deveriam ter a liberdade de se casar", disse Stacey Fitts, um dos membros do Partido Republicano que criaram a nova organização.

Em novembro, durante as eleições presidenciais americanas, os eleitores do Maine também votarão se o casamento gay deve ser liberado ou não no estado. Em 2009, o "não" venceu.

Eleitores de outros três estados farão o mesmo. Em Maryland e Washington, eles dirão se revogam as leis de casamento igualitário aprovadas por deputados e senadores. Pesquisas realizadas entre maio e junho em ambos os estados mostram que a maioria da população é a favor do casamento gay: 51% a 42% em Washington e 57% a 37% em Maryland, onde os negros puxaram o "sim" após o apoio público do presidente Barack Obama.

Em Minnesota, a pergunta é se a constituição estadual deve receber uma emenda que bane o casamento gay. Em pesquisa realizada em junho, 49% da população acha que não, contra 43% que acredita que ela seja necessária.

Já no Maine, uma pesquisa encomendada pelo Portland Press Heralde divulgada este mês mostrou que a população tem mudado de opinião, com 57% a favor do casamento gay contra 35% que se opõe. O estado é o único em que a iniciativa de levar a pergunta ao crivo das urnas partiu dos apoiadores do casamento igualitário.

Cidadania e Direitos Humanos – LGBT



Cidadania e Direitos Humanos – LGBT


"Toda maneira de amor vale a pena. Toda maneira de amor vale amar".
 
Milton Nascimento
 
1. Introdução
 
Tendo em vista a história de séculos de perseguição, discriminação, assassinatos e muitas outras atrocidades cometidas contra pessoas lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais ou até mesmo aquelas que têm seu comportamento associada a tal, é chegada a hora da mudança.
 
Em 2012 os pleitos são a oportunidade de elegermos candidatos(as) realmente dispostos(as) com as causas LGBT e de Direitos Humanos. Os(as) mesmos(as) devem ser seguros(as) de suas posições estando emparelhados(as) com os movimentos sociais e comunitários que compartilham a vontade de tornar esse país mais igualitário, justo, laico, sem discriminação, sem machismo e livre de qualquer tipo de violência.
 
2. Homofobia e o papel das pré-candidaturas em 2012

A homofobia é um dos principais problemas do Brasil. Milhões de pessoas sofrem cotidianamente violência verbal, violência física, discriminação de todos os tipos, agressões e até mesmo são assassinadas em virtude de sua orientação sexual e/ou identidade de gênero.
 
A homofobia está presente nas escolas, nas famílias, nos locais de trabalho. Da piada à violência letal, as diversas e reiteradas manifestações homofóbicas fazem parte da vida da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.
 
O movimento LGBT no Brasil (que se organiza a partir de 1979) tem hoje uma importante força política e visibilidade social. São centenas de grupos que atuam na promoção dos direitos humanos. São cerca de 200 Paradas e manifestações do Orgulho LGBT em todo o Brasil.

É muito importante que as pré-candidatas e os pré-candidatos às prefeituras e às Câmaras Municipais incorporem nas campanhas e nos programas a pauta da cidadania LGBT, a pauta da defesa dos direitos humanos LGBT, a agenda do combate à homofobia. 

Nossas cidades são plurais, nossas sociedades são heterogêneas. Lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais constituem uma população importante, presente em todo o território nacional. Um setor historicamente discriminado o qual devemos incorporar nas campanhas, que demanda políticas públicas e ações legislativas.
 
Os militantes LGBT não tem medo do bom debate, de defender as boas causas. Somos um movimento que nasce vinculado às lutas sociais, comprometido desde nossas raízes com o combate à exploração, à opressão, ao machismo, ao racismo e também à homofobia. Defender a universalidade e a integralidade dos direitos humanos, bem como a igualdade entre todas as pessoas deve ser a plataforma de todos os Partidos e de suas candidaturas em todos os níveis.
 
3. Estado laico e direitos LGBT

Ao se colocar claramente na defesa da igualdade, contra a homofobia, pela promoção da cidadania LGBT as pré-candidatas e pré-candidatos vão se deparar com reações adversas, com um discurso conservador, moralista, preconceituoso. Provavelmente de cunho fundamentalista religioso.
 
Por isso, é muito importante ressaltar que o Estado brasileiro é laico. Ou seja, não se pauta por nenhuma religião, não interfere em nenhuma religião, não discrimina nenhuma crença, nem os que não creem. A base da democracia brasileira é a Constituição que garante a liberdade religiosa, mas garante também a igualdade e a não discriminação por qualquer motivo.
 
Convivemos desde o início com militantes de todas as religiões, assim como ateus e agnósticos. Essa base laica é que nos permite separar as convicções pessoais religiosas (que são da esfera do privado) das posições políticas (que são da esfera social).
 
Apoiar os direitos dos homossexuais e lutar contra a homofobia deve ser parte do compromisso de todas nossas campanhas, independente da crença de cada pré-candidato(a).

A atual conjuntura tem sido marcada por um acirramento de posições e um avanço do conservadorismo e do fundamentalismo religioso. Os militantes estão do outro lado da trincheira, do lado progressista: defendemos a liberdade religiosa e ao mesmo tempo os direitos humanos em sua plenitude. Combatemos o preconceito e a discriminação contra LGBT.

Reafirmar a laicidade do Estado e a igualdade entre todas as pessoas é parte importante da consolidação da democracia brasileira. Esse é um tema que tende a aparecer com destaque nas eleições de 2012.
 
4. Políticas Públicas LGBT

Em 2004, foi lançado o programa Brasil sem Homofobia, inédito em todo o mundo. Composto por 53 diretrizes, em diversos Ministérios esse programa lançou as bases para a incorporação definitiva das políticas afirmativas LGBT na agenda do Executivo – em todos os níveis.

Avanços aconteceram a partir daí. Em 2008, houve a primeira Conferência Nacional LGBT. Em 2009, foi lançado o Plano Nacional de Direitos Humanos e Políticas Públicas LGBT. Em 2010 foram criada a coordenadoria LGBT na Secretaria de Direitos Humanos, bem como o Conselho Nacional LGBT, que começou a funcionar em 2011. Nesse mesmo ano, aconteceu a II Conferência Nacional LGBT.
 
A partir dessas ações do governo federal foram implementadas políticas públicas LGBT em muitos Estados e prefeituras. Mas, ainda há muito que fazer, pois não chegamos ao menos a uma centena de prefeituras que possuem algum tipo de política ou estrutura específica, que reconheça os direitos LGBT.
 
O tripé da Cidadania LGBT

De forma geral, nos últimos anos o movimento LGBT de todos os cantos do Brasil tem trabalhado com a formulação de que para melhorar a vida de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, o caminho a ser seguido é o da implementação de iniciativas em três esferas:

1. Em primeiro lugar, é necessário que a administração municipal designe dentro de sua estrutura um espaço específico para lidar com estas questões. Não importa o nome que venha a receber – Coordenadoria, Núcleo, Divisão, Superintendência, as demandas LGBT só poderão ser contempladas se houver pessoas destacadas para cuidar delas, com recursos humanos e materiais suficientes. Como, por exemplo, a Divisão de Políticas LGBT de São Carlos-SP, município que hoje pode ser considerado uma "vitrine" de boas práticas com relação a esta temática. 

2. Para que as políticas públicas de fato contemplem um olhar para as necessidades reais da população LGBT é preciso que esta, através de seus representantes eleitos, fiscalize a ação da Prefeitura. Para tal, é necessário criar um Conselho Municipal de Cidadania LGBT, com paridade em relação ao poder público, que possa se constituir em espaço de diálogo, de crítica, de formulação de propostas, de controle social. É o espaço da participação popular, da participação cidadã. Uma forma da prefeitura elaborar políticas de maneira mais democrática e dialogar com a sociedade civil, conhecendo melhor a realidade, as demandas, as prioridades.

3. A elaboração de um Plano Municipal de Combate à Homofobia é elemento fundamental a dar sustentação ao tripé, pois de nada adianta haver um órgão na administração e um Conselho LGBT se não se tem clareza dos reais problemas enfrentados por esta população em termos de preconceito, invisibilidade (é como se não existissem perante as políticas públicas) discriminação (inclusive institucional pelos próprios serviços da Prefeitura), violação de direitos e, sobretudo, violência física. O Plano tem o caráter de orientar as políticas, que devem ser transversais. É importante que o Plano Municipal traga metas, prazos, responsáveis, e, principalmente, que tenha dotação orçamentária para implementar as políticas previstas.

Áreas que exigem maior atenção em políticas públicas
 
Embora a marginalização e exclusão social afetem todos os aspectos da vida de uma pessoa LGBT, existem áreas críticas em que as ações são mais urgentes:

a) Saúde – diversas pesquisas têm demonstrado que LGBT recebem tratamento diferenciado, isto é, mais rápido e menos acolhedor quando não ostensivamente hostis, implicando em condições mais precárias de vida a estas pessoas. É preciso humanizar o atendimento, respeitar a integralidade do usuário em suas características próprias de identidade de gênero e orientação sexual. O primeiro passo é capacitar os profissionais de saúde para que deixem de invisibilizar esta população e passem a tratá-la com o devido respeito.

b) Educação – são já bastante conhecidos os episódios de violência sofridos pelos LGBT nas escolas, fenômeno conhecido como bullying homofóbico. A rede de ensino municipal não pode fechar os olhos a esta situação, devendo agir no sentido de conscientizar tanto os profissionais de educação quanto os demais estudantes e suas famílias para que aprendam a conviver com formas diferentes de amar e vivenciar a sexualidade. Políticas específicas de combate à homofobia nas escolas devem estar no centro do programa das pré-candidaturas.

c) Segurança – são muitos os relatos de agressões que acontecem nas ruas, inclusive muitos deles envolvendo abuso por parte de policiais e de guardas municipais os quais, ao invés de proteger todos os membros da comunidade, agem no sentido de aumentar a discriminação. Chama a atenção particularmente a violência que é perpetrada contra travestis que são profissionais do sexo (sendo que a grande maioria delas se viu obrigada a sair da escola dada a hostilidade que enfrentaram quando eram alunas). É preciso treinar as forças de segurança para mudar esta triste realidade.

d) Cultura – para que um grupo social realmente se sinta participante de uma determinada coletividade, é fundamental que a imagem que tenham de si próprios e a maneira como são vistos pelo restante da sociedade seja positiva, destaque a contribuição que exercem para a diversidade, integração e harmonia entre todas e todos. Por isso, é importante que a comunidade LGBT possa se expressar através dos equipamentos culturais como mostras de arte, exibições de cinema, apresentações teatrais, musicais e de dança, entre outros. Além disso, sabemos que combater à homofobia exige um trabalho de longo prazo, que mude as bases da atual cultura dominante. Portanto, campanhas de combate à homofobia devem ser realizadas periodicamente pelos governos municipais.

e) Nome social: reconhecimento público e respeito – Nos últimos anos, um grande número de Prefeituras e Governos Estaduais baixou decretos e outras normativas, tornando obrigatório o uso do nome social de travestis e transexuais por parte dos serviços públicos que as atendem cotidianamente.

O nome social é aquele com o qual a pessoa se identifica independente do que consta na sua certidão de nascimento ou carteira de identidade. Significa entender que embora aquela pessoa tenha nascido com um determinado sexo biológico, ela se enxerga como pertencendo a outro gênero e quer ser tratada daquela forma. 

Por isso, implantar este tipo de regulamentação é fundamental, mas em si só não basta, pois de nada adianta chamar uma travesti pelo seu nome feminino, mas continuar no fundo considerando-a como um "homem de peito", como um cidadão de segunda categoria, como uma aberração. Levando em conta que este segmento é o mais vulnerável socialmente (vive em condições mais precárias, tem acesso bem mais restrito à saúde, apresenta maior taxa de infecção frente ao HIV, tem baixa escolaridade e tende a ter seu "ganha-pão" a partir da comercialização do sexo), torna-se absoluta prioridade constituir uma rede de proteção e atendimento diferenciado para superar esta dura situação que se repente em praticamente todas as cidades brasileiras.

f) Centros de Referência – Um importante passo que pode ser dado no sentido de minimizar o estado de desatenção e até de abandono da população LGBT (e dentro dela, jovens que são expulsos de casa por rejeição da família ou que não conseguem prosseguir com os estudos, os desempregados que não contam com a seguridade social e que não tem fonte de renda alternativa, os que moram em áreas de extrema carência, os idosos) é a criação de um Centro de Referência. Este equipamento social que uma Prefeitura pode implementar deve contar com: 1. Advogados/as que possam lidar com as situações de discriminação e violação de direitos; 2. Psicólogos/as com habilidade para ajudar as vítimas do preconceito que muitas vezes legitimam a violência que sofrem devido a terem internalizado a homofobia; 3. Assistentes Sociais que possam orientar e encaminhar aqueles e aquelas que estejam em situação de vulnerabilidade social para que possam ter um teto, alimentação, higiene ou que consigam se reerguer para conseguir um trabalho e organizar sua vida com dignidade e respeito.

5. A agenda Legislativa da cidadania LGBT
 
É de fundamental relevância a atuação de nossos parlamentares na defesa da população LGBT nas Câmaras de Vereadores. Em primeiro lugar, porque exercem função de fiscalização da Prefeitura e podem convocar Secretários Municipais e demais gestores para responderem sobre as ações e omissões relativas a estes temas. Em segundo, podem propor leis que, ainda que com abrangência apenas local, impactem positivamente a vida daqueles e daquelas que sofrem a homofobia cotidiana.

O projeto de lei mais importante a ser apresentado é o de proibir a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, algo que já foi implementado em diversas cidades brasileiras e em alguns Estados. Não se trata de criminalizar a homofobia (pois esta é uma prerrogativa do poder público federal), mas tal lei (de caráter administrativo) pode criar constrangimentos a pessoas físicas e jurídicas que através de advertências, multas e até do fechamento de estabelecimentos comerciais que insistam em discriminar LGBT.

Há também projetos de leis que contribuem significativamente para a visibilidade positiva desta população, entre eles o de reconhecimento de 17 de Maio como Dia Municipal de Combate à Homofobia, 29 de janeiro como o Dia Municipal da Visibilidade de Travestis e Transexuais, o Dia 29 de Agosto com Dia Municipal da Visibilidade Lésbica, o dia 28 de Junho como Dia do Orgulho de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais.

Tais leis podem prever que o poder público comemorará tais datas e abrem a oportunidade para uma série de ações de visibilidade (palestras, seminários, audiências públicas, debates, campanhas, etc).

Para além dessas ações de caráter estritamente legislativo, as pré-candidatas e pré-candidatos à Câmara podem se comprometer em colocar os seus mandatos à disposição da luta contra a homofobia, transformando-os em uma caixa de ressonância do movimento social LGBT, em uma referência permanente que acolhe denúncias e combate as violações dos direitos humanos dessa população.

Os parlamentares com certeza são pontos de apoio na construção de cidades mais coloridas, mais inclusivas, mais plurais, que respeitam a diversidade sexual.
 
Movimento LGBT do Estado de Santa Catarina com contribuições do Movimento LGBT Nacional

O bonde da história - Marta Suplicy

O bonde da história
  
 
Postado em 09/06/2012 pela Equipe Marta da Marta Suplicy

Artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo do dia 9/6/2012








A Parada Gay de São Paulo é um marco na luta pelos direitos dos homossexuais no Brasil. O aumento estrondoso no número de participantes a cada ano mostra a evolução do evento. Em sua primeira edição, há 16 anos, cerca de 300 pessoas -em sua maioria homossexuais- reuniram-se para reivindicar a garantia de seus direitos. Eu estava lá.

O evento cresceu enormemente, manteve as reivindicações e transformou-se em motivo de encontro e celebração de diferentes tribos. As famílias foram para a rua declarar sua tolerância e a parada se tornou a maior manifestação gay do mundo. No ano passado, 4 milhões de pessoas lotaram a avenida Paulista e o evento gerou mais de R$ 200 milhões para os cofres da cidade.

Se aos poucos a cobrança de direitos foi ficando diluída, é indiscutível que a parada possibilitou o surgimento de vários outros eventos culturais voltados para o público LGBT e deu enorme visibilidade para as reivindicações da comunidade. Além de outras paradas que criam espaços na mídia e celebram o orgulho da diversidade sexual por todo o país.

Nestes últimos anos tivemos alguns avanços do lado do Executivo (declaração de Imposto de Renda conjunta e INSS) conquistados no governo Lula. Nada do Congresso. O projeto que criminaliza a homofobia encontra-se há anos no Senado ainda com dificuldades de aprovação.

Há um ano o STF concedeu aos casais homossexuais os mesmos direitos e deveres que a legislação brasileira já estabelece para os casais heterossexuais. Durante a votação, o então presidente do STF, o ministro Cezar Peluso, cobrou do Congresso que "assumisse a tarefa que até agora não se sentiu propenso a fazer" e transformasse a conversão em lei. Começamos.

Há poucas semanas a Comissão de Direitos Humanos do Senado aprovou projeto, de minha autoria, que altera artigos do Código Civil para reconhecer como entidade familiar a união estável entre pessoas do mesmo sexo. A proposta dá um passo adiante na decisão do STF permitindo a conversão da união homoafetiva em casamento.

O projeto seguiu para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde será relatado pelo senador Roberto Requião. Aprovado, irá à Câmara dos Deputados.

É uma oportunidade concreta para os parlamentares tomarem o bonde da história, como fizeram recentemente na CCJ aprovando a lei das cotas nas universidades para os mais carentes e os negros. Esse caminho, do cumprimento da Constituição e de ações afirmativas voltadas à garantia dos direitos humanos, está traçado. Pode demorar mais, ou menos, mas é inexorável.

Agora é a vez do Congresso. O Brasil espera e a parada de amanhã exigirá.
Nota deste blogueiro: A foto na matéria postada na Folha de São Paulo é outra.

SP combatendo a homofobia: boletim de ocorrência eletrônico



Carlos Tufvesson compartilhou essa boa notícia no Facebook:



Esta é uma das ações do Governo do Estado de São Paulo por meio da Secretaria de Segurança Pública (Polícia Civil) e Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania (Coordenação de Políticas para a Diversidade Sexual) para o dia 17 de maio que, além de ser Dia Internacional de Combate a Homofobia, já é uma data oficial no calendário do Estado. Portanto, agora é possível em casos de agressão verbal (injúria, calúnia, difamação, ameaça) com motivação homofóbica fazer um boletim de ocorrência eletrônico, via internet, sem necessidade de ir à delegacia para registrar o boletim. Nos próximos dias, a Coordenação de Políticas para a Diversidade Sexual estará divulgando maiores detalhes dessa importante ferramenta para o combate a homofobia no nosso estado.

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/1084530-distrito-eletronico.shtml

Homossexualidade e movimento LGBT: estigma, diversidade, cidadania

Homossexualidade e movimento LGBT: estigma, diversidade, cidadania

18 julho 2011, 6:12 pm
ensaios



Por Júlio Assis Simões
[Ensaio retirado da coletânea Agenda brasileira: temas de uma sociedade em mudança, lançada esta mês]

Enviado para este blogueiro (Sergio Viula) por: @wrighini




Acostumamo-nos a ver, em várias cidades brasileiras, multidões de pessoas reunidas em manifestações organizadas para celebrar o “Orgulho LGBT”, sigla que se refere a lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros. No Brasil, assim como em vários outros países, os modernos movimentos LGBT representam um desafio às formas de condenação e perseguição social contra desejos e comportamentos sexuais anticonvencionais associados à vergonha, imoralidade, pecado, degeneração, doença. Falar do movimento LGBT implica, portanto, chamar a atenção para a sexualidade como questão social e política, seja como fonte de estigmas, intolerância e opressão, seja como meio para expressar identidades e estilos de vida.

A sexualidade é uma referência privilegiada em muitas interpretações clássicas do Brasil. Sensualidade e luxúria, manifestadas como uma espécie de propensão coletiva à precocidade sexual e ao desregramento erótico, foram apontadas como traços importantes (ou mesmo definidores) da brasilidade, por autores tão diversos em contextos distintos como Nina Rodrigues (1862-1906), Paulo Prado (1869-1943) e Gilberto Freyre (1900-1987). Deve-se observar que a visão do Brasil como terra do excesso sexual provinha já dos primeiros tempos da colonização, como sugerem os relatos de viajantes sobre práticas do “pecado nefando” entre os ameríndios e documentos sobre confissões e denúncias de sodomia durante a visitação do Santo Ofício, na Bahia e em Pernambuco, no final do século XVI e começo do século XVII. Nas interpretações da formação social brasileira que se desenvolveram desde o final do século XIX até meados do século XX, causas variadas foram propostas para explicar aquele pendor: a influência do calor tropical; a natureza supostamente mais excitável, ardente e descontrolada de africanos, ameríndios e portugueses; as condições sociais de desigualdade, violência e degradação moral forjadas na escravidão; ou, ainda, uma combinação de tudo isso. Diferenças de ênfase à parte, essas interpretações corroboraram a visão de um Brasil marcado por uma sexualidade excessiva, com sua busca de prazeres “perversos” de toda sorte, entre os quais se destacavam as relações entre pessoas do mesmo sexo.

Apesar da importância que vários autores clássicos do pensamento social brasileiro atribuíram à sexualidade, somente a partir dos anos 1970 o tema deixou de ser incidental e se tornou foco de pesquisa sistemática nas nossas ciências sociais. Isso se ligou, em boa parte, ao contexto de intensificação dos movimentos em defesa da liberdade sexual nos Estados Unidos e na Europa durante a chamada “contracultura” dos anos 1960, culminando com a famosa rebelião dos frequentadores homossexuais do clube Stonewall contra a polícia de Nova York, no começo do verão de 1969. Na cena norte-americana, palavras de ordem como “assumir-se” e “sair do armário” simbolizavam o anseio de tornar visível e fonte de orgulho o que até então era motivo de vergonha e vivido na clandestinidade.

No Brasil dos anos 1970, sob a ditadura militar, formas locais de desbunde e contestação cultural abriram brechas na repressão política. A androginia adquiria então um potencial subversivo. Em seu primeiro espetáculo no Brasil depois da volta do exílio na Inglaterra, em 1972, o cantor e compositor Caetano Veloso surpreendia o público ao usar batom e encenar maneirismos à moda de Carmem Miranda. Ao mesmo tempo, surgia o grupo teatral Dzi Croquettes, cujos componentes misturavam barbas, cílios postiços, peitos peludos, sutiãs, meiões de futebol e saltos altos em espetáculos de humor, canto e dança que percorriam o país com grande impacto. Os Dzi Croquettes buscavam vivenciar no cotidiano o que representavam no palco, mobilizando fãs ou “tietes” com quem formavam uma comunidade com múltiplas relações eróticas e afetivas. Essas intervenções artísticas e existenciais foram, em boa medida, precursoras e coprodutoras da “saída do armário” no Brasil. No final da década de 1970, em meio a um movimento crescente de oposição ao regime militar, emergiria um movimento homossexual no país, cujos marcos foram a criação do jornal Lampião e a fundação do grupo Somos de Afirmação Homossexual, ambas em 1978.

Também nesse momento os trabalhos do filósofo e historiador francês Michel Foucault (1926-1984) sobre a produção histórica e social da loucura, do crime e da sexualidade foram introduzidos nos cursos de ciências humanas no Brasil. Em sua História da sexualidade: a vontade de saber (publicado na França em 1976 e traduzido no Brasil já no ano seguinte), Foucault argumentou que os especialistas médicos, desde a segunda metade do século XIX, em seus esforços de conhecer e prevenir tudo aquilo que poderia ameaçar a saúde do indivíduo e da nação, contribuíram decisivamente para estabelecer uma série de classificações de tipos humanos que deram corpo às sexualidades “marginais” ou “perversas”. Dessa forma, os médicos ajudaram a promover uma nova forma de controle social, tendo a sexualidade como alvo, ao mesmo tempo que moldaram novos personagens sociais. Um exemplo seria a figura do “homossexual”, que substituiu a figura do “sodomita” na linguagem da medicina e do direito. Na visão influenciada pela religião, o sodomita era um praticante eventual ou reincidente de relações sexuais ilícitas. Na visão dos especialistas médicos, o “homossexual” passava a ser um tipo de natureza física e psíquica singular, situada entre o masculino e o feminino, que se manifestaria em seu corpo, seu temperamento e sua conduta.

No âmbito do debate brasileiro dos anos 1970, cabe destacar o trabalho do antropólogo Peter Fry, por sua relevância para a configuração de uma área de estudos voltada às conexões entre homossexualidade, cultura e política, que também desenvolvia uma abordagem da sexualidade como produto histórico e social. Fry argumentou que no Brasil, na passagem do século XIX para o século XX, também se elaborou uma compreensão do “homossexual” como um ser dotado de uma natureza singular. Nossos especialistas médicos não apenas codificaram e descreveram “anormalidades” sexuais, mas procuraram associá-las a explicações para degeneração, delinquência e loucura fundamentadas em diferentes versões do determinismo biológico e das teorias raciais em voga.

A visão médica da homossexualidade viria se contrapor a um modelo mais antigo e persistente de classificação de tipos sexuais, que Fry denominou de “hierárquico-popular”. Nele, as categorias referidas às práticas homossexuais estão englobadas por uma hierarquia de gênero, distinguindo as figuras do “homem” e da “bicha” (ou “viado”, “boiola”, “xibungo” etc.), em termos de seu papel no ato sexual. Na lógica do modelo hierárquico-popular, os atos de penetrar e de ser penetrado adquirem os sentidos respectivos de dominação e submissão por meio das categorias de “ativo” e “passivo” (e várias outras expressões populares correspondentes, como “comer” e “dar”, “ficar por cima” e “ficar por baixo”, “meter” e “abrir as pernas” etc.). O parceiro ativo dominador conservaria sua masculinidade, enquanto o feminino é quem se entregaria de forma subalterna e servil. Seria possível conceber também uma versão desse modelo para as relações homossexuais femininas, com a figura do “sapatão” (ou “paraíba”, “fancha”, “mulher-macho” etc.), que desempenharia o papel “ativo” ao se relacionar com “mulheres”.

Fry sugeriu que o modelo hierárquico-popular teria raízes históricas profundas, mas não seria uma peculiaridade brasileira. Distinções similares de “ativo” e “passivo” já constavam em cancioneiros medievais que mencionavam praticantes do coito anal. Recuando ainda mais no tempo, podemos encontrá-las na Roma antiga, onde o cidadão adulto que se deixasse penetrar em relações homossexuais era vilipendiado em sua honra viril, enquanto a passividade era adequada aos jovens escravos. Cabe lembrar que Gilberto Freyre, em Casa-grande & senzala (1933), já havia equiparado o papel do moleque, como paciente do senhor moço entre as grandes famílias escravocratas do Brasil, ao do escravo púbere escolhido para companheiro do rapaz aristocrata no Império Romano, observando que, “através da submissão do moleque, seu companheiro de brinquedos e expressivamente chamado de “leva pancadas”, iniciou-se muitas vezes o menino branco no amor físico”.

Enquanto o modelo hierárquico-popular diz quem é masculino e quem é feminina, o modelo médico-psicológico insiste na distinção entre homossexualidade e heterossexualidade. Em um primeiro momento, os médicos incorporaram em suas classificações os princípios da hierarquia de gênero, dividindo os homossexuais em “ativos” e “passivos”, parcialmente correspondendo a suas concepções de homossexualidade “adquirida” e “congênita”. O modelo médico-psicológico se encaminharia depois para uma representação mais homogênea dos diferentes tipos, baseada em uma noção de orientação do desejo sexual. Assim, os homens que mantivessem relações sexuais com outros homens seriam considerados “homossexuais”, não importando mais se é “ativo” ou “passivo”.

Essa passagem é importante, pois permite a Fry argumentar que um modelo “igualitário-moderno” teria surgido como uma derivação do modelo médico-psicológico, mudando-se o valor social atribuído aos termos. Se “homossexual” apresenta conotações de patologia, perturbação e crime, termos como “gay” vêm substituí-lo para expressar literalmente uma pessoa “alegre” e “feliz”. O modelo igualitário-moderno alargaria a visão de que a orientação do desejo sexual é o que importa para identificar os parceiros de uma relação homossexual, ao mesmo tempo que buscaria separar a homossexualidade da inversão de gênero. Se “bicha” ou “travesti” trazem as conotações de afeminação e espalhafato, termos como “entendido” ou “gay” vêm substituí-los para referir-se a rapazes que, mesmo “alegres”, são discretos e viris.

É nesse terreno de convivência e disputa entre modelos concorrentes — com ênfase na igualdade de orientação sexual em contraposição à hierarquia de gênero — que Fry e outros pesquisadores situaram a emergência do movimento político em defesa dos direitos homossexuais no Brasil, no final dos anos 1970. Desde então, o movimento homossexual colaboraria de forma decisiva para a expansão do modelo igualitário-moderno, que se daria principalmente entre as classes médias urbanas, como também dependeria dessa expansão. As diferenças de valor entre “igualdade” e “hierarquia” nas relações homossexuais ajudariam a produzir uma hierarquia entre os próprios modelos, tornando-se assim um meio privilegiado de expressar e constituir distinções de classe. O emergente movimento político homossexual tenderia a incorporar a crítica aos papéis de gênero convencionais, formulada pelo feminismo. Desse modo, entraria em tensão crescente com os valores e comportamentos que prevaleceriam no universo “tradicional” e “atrasado” das “bichas”, “sapatões” e travestis.
Algumas qualificações podem ser feitas acerca dessa influente leitura da estruturação da homossexualidade e do movimento homossexual no Brasil. Em primeiro lugar, ela sugere uma tendência geral de transição do modelo hierárquico para o igualitário, através da mediação do modelo médico, cuja realização histórica não pode nem deve ser entendida de forma linear. O historiador James Green mostrou evidências de identidades homossexuais masculinas que extrapolavam o binário ativo/passivo na cena urbana brasileira desde a virada do século XIX ao século XX — contemporâneas, portanto, dos primeiros momentos de produção da visão médico-psicológica do “homossexual”; e bem anteriores ao surgimento e popularização das categorias de “entendidos” e “gays”.

Em segundo lugar, a insistência no termo “modelo” é crucial para definir com mais clareza o plano em que essa leitura se situa: isto é, das ideias, valores e suas conexões lógicas, por meio das quais comportamentos e identidades ganham inteligibilidade social, demarcam regras e contravenções. Em contrapartida estão os processos através dos quais indivíduos tornam-se sujeitos e agentes sociais, incorporando-se e reconhecendo-se em determinadas categorias; o que abre espaço para variações, deslocamentos e transformações nos próprios modelos. Assim, podemos encontrar rapazes que fazem sexo com outros homens por dinheiro ou alguma outra forma de recompensa, e que podem até desempenhar o papel “passivo” no ato sexual, mas que não deixam de se considerar e de ser considerados como “homens”. Temos ainda as travestis, que adotam nomes e modos de tratamento no feminino, submetem-se a modificações corporais irreversíveis para adquirir vistosas formas femininas, mas não se acham necessariamente “mulheres” e, muitas vezes, desempenham o papel “ativo” no ato sexual. Além disso, podemos encontrar homens e mulheres que se dispõem à experimentação erótica com pessoas do mesmo sexo ou do sexo oposto, sem recorrer a identidades fixas de orientação sexual.

Essa dinâmica não deixou de repercutir na própria trajetória do movimento LGBT no Brasil. O antropólogo Edward MacRae, em seu trabalho sobre o Somos, de São Paulo, um dos primeiros grupos homossexuais formados no final dos anos 1970, mostra que já naquele momento os militantes se dividiam quanto a se constituir ou não em torno de uma identidade homossexual. Havia então uma grande inquietação quanto aos riscos de se cristalizar (ou “reificar”, para usar uma expressão mais comum à época) a oposição entre hetero e homossexualidade, e daí promover novos rótulos e estigmas. MacRae registrou sua própria angústia de trabalhar com pressupostos analíticos (baseados na visão da homossexualidade como um papel social e historicamente construído) que se contrapunham a um princípio importante para a solidariedade do grupo, de que a homossexualidade seria uma característica interna e inescapável de cada pessoa.

Nos anos 1980 o cenário mudou. A eclosão da epidemia HIV-aids trouxe de volta velhas associações entre homossexualidade e doença, enquanto a democratização acenava com a abertura de canais de comunicação com o Estado, especialmente com as autoridades de saúde envolvidas nas respostas sociais à aids e com os novos partidos políticos. A partir de então, é possível observar também o desenvolvimento de um estilo de atuação política diferente, mais preocupado com aspectos formais de organização institucional e que buscava se organizar em torno de campanhas específicas, como a mobilização para incluir a proibição de discriminação por “orientação sexual” durante a Assembleia Constituinte. Embora não tenha atingido seu objetivo, essa campanha envolveu um significativo esforço pela produção de um consenso em torno da ideia de “orientação sexual”. A pesquisa da antropóloga Cristina Câmara sobre o grupo Triângulo Rosa, do Rio de Janeiro, no final dos anos 1980, mostra como essa campanha mobilizou vários cientistas sociais brasileiros, que proferiram pareceres ressaltando vantagens da expressão “orientação sexual” como instrumento capaz de promover o direito individual à liberdade sexual e propiciar ao movimento maiores possibilidades de diálogo com a sociedade civil e com as diferenças.

Ao longo dos anos 1990, as parcerias com o Estado em torno do combate à aids consolidaram-se e deram impulso à multiplicação de grupos ativistas, inclusive de lésbicas e de travestis, promovendo a diversificação e a incorporação dos vários sujeitos do movimento homossexual na atual sigla LGBT. Parte considerável das entidades de base do movimento aderiu ao formato de organizações não governamentais (ONGs), estabelecendo estruturas mais formais de organização interna, conduzindo uma rotina de elaboração de projetos e relatórios, preocupando-se com a “capacitação de quadros” para estabelecer relações duráveis com técnicos de agências governamentais e organismos internacionais. A pesquisa da antropóloga Regina Facchini mostra como esse processo se deu em um pequeno grupo de ativistas de São Paulo, na segunda metade dos anos 1990.

Nesse período mais recente, o movimento LGBT lança campanhas pelo reconhecimento legal dos relacionamentos homossexuais e pelo combate à discriminação e à violência contra homossexuais, que contribui para popularizar o termo “homofobia”. É também o momento de emergência e consagração das Paradas do Orgulho LGBT, paralelamente ao crescimento de um mercado segmentado e à proliferação de diversos estilos de vida associados à homossexualidade, que acaba por refratar em múltiplas categorias e identidades.

Grande parte da visibilidade social e política alcançada pelo movimento LGBT deveu-se ao seu processo recente de institucionalização e estabelecimento de parcerias com o Estado. Nesse campo de relações, há vantagens, mas também riscos. Abrem-se novos canais para pressões vindas “de baixo” que, entretanto, podem também favorecer novas redes de clientela que amorteçam o potencial crítico do movimento. Sob esse aspecto, a trajetória do movimento LGBT recoloca de forma eloquente um fenômeno bastante conhecido e atual: a interpenetração e porosidade entre Estado e sociedade civil no Brasil. Poderia ser diferente? Afinal, o movimento LGBT leva consigo as tramas e tensões da sociedade em que está enredado.

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Júlio Assis Simões é professor do Departamento de Antropologia da USP e pesquisador colaborador do Pagu – Núcleo de Estudos de Gênero da Unicamp. Tem pesquisas sobre movimentos sociais, participação política, envelhecimento, gênero e sexualidade. Publicou, entre outros, O dilema da participação popular (Marco Zero/Anpocs, 1992) e Na trilha do arco-íris: do movimento homossexual ao LGBT, em parceria com Regina Facchini (Fundação Perseu Abramo, 2009).
Este ensaio faz parte da coletânea Agenda brasileira: https://www.companhiadasletras.com.br/livro/9788535918748/agenda-brasileira


Agenda brasileira: temas de uma sociedade em mudança (Organização de André Botelho e Lilia Moritz Schwarcz)

https://www.companhiadasletras.com.br/livro/9788535918748/agenda-brasileira


Dando continuidade ao projeto iniciado com Um enigma chamado Brasil (prêmio Jabuti 2010), que reuniu ensaios de importantes intérpretes do país, os organizadores Lilia Moritz Schwarcz e André Botelho, professores e pesquisadores da USP e da UFRJ, respectivamente, convidaram para esta Agenda brasileira cinquenta profissionais de diversas áreas para contribuir com o debate sobre as principais questões nacionais.
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Autores de interesses tão diferentes como o ex-jogador de futebol Tostão e o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira, o cientista político Bolivar Lamounier, o crítico de teatro J. Guinsburg, o poeta Eucanaã Ferraz, a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha e tantos outros, todos profundos conhecedores em suas áreas, integram a lista dos que aceitaram o desafio de pensar o país a partir de ângulos distintos. A questão dos índios, da periferia, do racismo, da segurança pública e do meio ambiente, entre outros temas, estão na pauta do dia e apresentam, cada um à sua maneira, diversos graus de complexidade. Os artigos foram organizados de modo a serem lidos separadamente, à escolha do leitor. Mas, ao ler o conjunto dos textos, as interpretações ganham outra dimensão, à medida que os temas se conectam e iluminam uns aos outros.

Das consequências nefastas da escravidão e do latifúndio sobre a distribuição de renda da população às mais sofisticadas realizações estéticas das artes plásticas e da literatura, este livro percorre questões relacionadas à natureza multifacetada do que se convencionou chamar de “o povo brasileiro”. Além de um núcleo especialmente dedicado às questões étnicas, os organizadores agruparam as atuais vertentes do pensamento social em grupos temáticos: sociedade brasileira, relações internacionais, cidadania, trabalho, ecologia e minorias, Estado brasileiro, culturas políticas e sociabilidade, incluindo subtemas como futebol e carnaval e, finalmente, movimentos culturais e cultura contemporânea.

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