MATRIA: quando a “defesa das mulheres” vira plataforma contra pessoas trans
Nos últimos anos, uma organização com sede no Sul do Brasil vem ganhando espaço nas redes e na política sob o nome de MATRIA – Associação de Mulheres, Mães e Trabalhadoras do Brasil. Em seus próprios termos, a entidade afirma atuar pela proteção dos direitos de mulheres e crianças “com base no sexo biológico”, posicionando-se como “independente e suprapartidária”.
À primeira vista, o discurso parece inofensivo — afinal, quem seria contra defender mulheres e crianças? Mas basta olhar mais de perto para perceber que boa parte das ações e campanhas da Matria tem um alvo específico: as pessoas trans.
Entre o discurso e a prática
Em seu site e nas redes, a Matria declara-se comprometida com a “realidade material do sexo” e com políticas públicas que considerem o “sexo biológico” como critério central. Na prática, isso tem significado oposição a políticas que reconhecem a identidade de gênero, como cotas para pessoas trans em universidades e concursos públicos, uso de banheiros conforme a identidade de gênero e dados oficiais sobre violência contra a população trans.
Em 2024, a entidade chegou a enviar um ofício ao Ministério dos Direitos Humanos contestando as estatísticas que apontam o Brasil como o país que mais mata pessoas trans no mundo. Também entrou com ação civil pública contra a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) por manter cotas específicas para pessoas trans.
A Matria também costuma promover pesquisas e campanhas que tentam associar o reconhecimento de direitos trans à “ameaça” aos direitos das mulheres cis. Um exemplo foi a divulgação de uma pesquisa que apontava rejeição popular ao uso de banheiros femininos por mulheres trans — pesquisa amplamente criticada por reforçar estereótipos transfóbicos e basear-se em premissas duvidosas.
O discurso da exclusão disfarçado de proteção
Grupos de direitos humanos, como a ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), classificam a Matria como parte do movimento antitrans, responsável por disseminar desinformação e influenciar políticas públicas excludentes.
De acordo com a ANTRA, a retórica da Matria é semelhante à de movimentos conhecidos como “feminismo radical trans-excludente” (TERF), que defendem um feminismo centrado apenas em mulheres cisgênero e negam a legitimidade das identidades trans.
Em vez de somar forças na luta contra o patriarcado e a violência estrutural, essas correntes acabam dividindo o movimento feminista e alimentando o preconceito que já oprime tantas pessoas.
Por que isso importa
O discurso da Matria reflete uma tendência global: usar a linguagem dos direitos humanos para restringir direitos humanos.
Ao reivindicar o “direito das mulheres” como justificativa para barrar avanços das pessoas trans, essas organizações tentam redefinir o que é feminismo e quem merece proteção.
Mas a verdade é simples: nenhum direito das mulheres cis depende da exclusão das mulheres trans.
A luta por igualdade de gênero só faz sentido se incluir todas as identidades que enfrentam o machismo, a misoginia e o patriarcado. Dividir para conquistar é a estratégia mais antiga do opressor — e nós não podemos cair nessa armadilha.
O que o Fora do Armário reafirma
O Blog Fora do Armário reafirma que mulheres trans são mulheres.
Que homens trans e pessoas não binárias merecem o mesmo respeito e proteção que qualquer cidadão.
E que nenhuma organização pode se apropriar da linguagem dos direitos humanos para justificar a exclusão de quem mais precisa deles.
A defesa da dignidade humana não pode ter asteriscos.
Acesse o DOSSIÊ MATRIA produzido pela ANTRA em parceria com pesquisadores aqui:
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